A presidente Dilma Rousseff tentou, espertamente, distensionar as relações com o Congresso, mas pouco conseguirá avançar nas propostas apresentadas por ela — a recriação da CPMF e a reforma da Previdência Social — como salvação para a grave crise enfrentada pelo país. Antes de contar com a aprovação da Casa do Povo, como bem definiu o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, a presidente terá que convencer o partido dela, o PT, a apoiá-la. Nenhuma outra legenda da base aliada abraçará medidas que aumentam impostos e mexem com direitos de trabalhadores.
Os investidores acompanharam, com lupa, cada palavra da mensagem de Dilma a deputados e senadores. E, como muitos parlamentares, se decepcionaram. Esperavam que a petista fosse mais enfática no compromisso de tirar o país do atoleiro. A percepção, contudo, foi a de uma presidente louca para aprovar medidas de curtíssimo prazo, como a CPMF e a Desvinculação de Receitas da União (DRU), a fim de ganhar sobrevida e se arrastar até o fim do mandato. A promessa de reforma da Previdência foi a forma encontrada para adoçar a boca do mercado e, quem sabe, obter um voto de confiança.
Mesmo assessores mais próximos de Dilma sabem que ela está em uma situação delicadíssima. A presidente enfrenta oposição dentro de casa e não conta com um articulador capaz de convencer o PT a assumir as bandeiras da CPMF e da Previdência. O ex-presidente Lula, que poderia fazer o trabalho político de unir as bases, está com a corda no pescoço diante das denúncias de que ele teria recebido benesses das empreiteiras que surrupiaram o caixa da Petrobras e foram pegas pela Operação Lava-Jato. Neste momento, talvez a própria Dilma esteja querendo manter distância de seu criador.
Deficit de credibilidade
Na avaliação do economista Alexandre Cabral, da Neo Value Consultoria, o governo enfrenta hoje deficit de credibilidade. Mesmo que a presidente demonstre boa vontade em relação a determinados temas, ninguém compra o discurso dela. Os últimos cinco anos foram ruins demais para o país. Todas as bases do crescimento foram destruídas e o futuro, hipotecado. “Não há como acreditar que, a partir de agora, tudo será diferente”, frisa.
Para reforçar seu ceticismo, Cabral se deu ao trabalho de vasculhar os arquivos do Fundo Monetário Internacional (FMI). Segundo ele, entre 2011 e 2016, o Brasil acumulará crescimento de apenas 4,42%. Com esse resultado, o país ficará na 152ª posição entre 172 nações. Só conseguirá superar países em guerra civil, como a Líbia e a Síria, e aqueles que recorreram ao populismo, como a Venezuela, acreditando que a capacidade do Estado de controlar a economia era infinita.
Cabral acredita que o quadro é de piora, pois o Congresso, insuflado pelo PT, não moverá uma palha para ajudar o governo. Não num ano de eleições. Os petistas, que já estão com a pecha de corruptos e de ladrões, não querem se associar a aumento de impostos e ao adiamento das aposentadorias. Diante disso, o economista não tem dúvidas de que a Moody’s, a única agência que ainda mantém o país como porto seguro para o investimento, vai retirar esse selo. Os técnicos da agência estão no Brasil e admitem que a situação é pior do que imaginavam.
Especulação
Dilma acredita ter um trunfo na mão para levar adiante a CPMF: o apoio dos governadores. Mas, mesmo entre eles, a divisão é grande. Não acreditam que se beneficiarão dos recursos a serem arrecadados. Outro ponto importante: não são todos os governadores que têm controle sobre suas bancadas. Mas, independentemente dos empecilhos, a determinação do Palácio do Planalto é insuflar o máximo possível o lobby dos comandantes dos estados para que o imposto saia do papel pelo menos até maio, para que a arrecadação comece em setembro e os R$ 10 bilhões previstos ajudem no cumprimento da meta fiscal de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB).
No entender dos investidores, o melhor, neste momento, é manter distância do Brasil. As únicas operações permitidas são as de carry trade, ou seja, pegar dinheiro a juros quase zero nos Estados Unidos e na Europa e negativos no Japão e trazer para o Brasil e se beneficiar da taxa Selic de 14,25% ao ano. É a mais pura especulação, incentivada pelo governo, que destruiu a credibilidade da política econômica e empurrou o país para a mais grave recessão desde o início dos anos 1930.
“Com o quase rebaixamento do Brasil pela Moody’s, haverá uma forte realocação de recursos para outros países emergentes que estejam em melhor situação”, prevê Fernando Barroso, diretor da CM Capital Markets. “Para o país, sobrarão apenas os recursos da especulação”, complementa. Nada mais natural no caso de uma nação mergulhada na recessão, com inflação acima de 10%, desemprego em disparada, contas públicas em frangalhos e aterrorizada pelo Aedes aegypti.
Brasília, 08h30min