Europeus ameaçam boicote às commodities brasileiras caso PL da grilagem seja aprovado

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ROSANA HESSEL

A possibilidade de o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), colocar na pauta da Casa o projeto de lei da grilagem, o PL 2633/2020, ainda nesta semana, provocou reações internacionais. Grandes fabricantes de alimentos e redes varejistas da Europa, como Tesco, Sainsbury e Marks & Spencer, ameaçaram boicotar as commodities agrícolas brasileiras se houver avanços nessa proposta ou na que tramita no Senado.

Em carta aberta divulgada, nesta quarta-feira (05/05), 37 entidades europeias alertaram os parlamentares brasileiros que, no caso da aprovação dos projetos de lei que prejudicam as proteções hoje existentes para a Amazônia, “devem reconsiderar o apoio e o uso de commodities agrícolas brasileiras em toda a cadeia de suprimentos”.

De acordo com a carta, os dois projetos de lei trazem ameaças “potencialmente ainda maiores para a Amazônia do que antes” e apontaram contradição no discurso do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na Cúpula do Clima.  “Essas medidas são contrárias à narrativa e retórica que vimos internacionalmente, do Brasil, recentemente, em 22 de abril de 2021, na cúpula com o presidente dos EUA, Joe Biden”, acrescentou o documento.

O presidente da Câmara pretende submeter a proposta de inclusão do PL 2644/202 na pauta da Casa à aprovação do colégio de líderes.  A reunião, normalmente, ocorre às quintas-feiras, e, portanto, ainda não há nada definido sobre o assunto, porque a sugestão precisará partir de alguma liderança para ser incluída na pauta.

No Senado, há um projeto semelhante, o PL 510/2021, que também trata da regularização fundiária em áreas da União localizadas na Amazônia Legal e que foram invadidas por grileiros.  A matéria foi retirada da pauta do último dia 28, mas continua recebendo emendas de parlamentares. Ontem, mais de 60 bispos da Amazônia enviaram uma carta ao presidente do Senado, Ricardo Pacheco, alertando sobre os impactos da do PL 510/2021 na Amazônia, afirmando que “não há urgência ou lacuna legal que justifique o retorno de um PL sobre tema tão complexo”.

Para o Greenpeace Brasil, esse movimento dos varejistas europeus contra a regularização da ocupação ilegal de terras na Amazônia Legal pelo Congresso não é surpresa. “Vemos, com indignação, mais uma vez a política antiambiental do governo brasileiro ameaçando a economia do país”, informou a entidade, em nota enviada ao Blog.

“Em um momento em que o Brasil precisa de comida e vacina para sua população, deputados e senadores ruralistas, com apoio e incentivo do Planalto, tentam, a todo custo, aprovar medidas que irão causar mais desmatamento e violência no campo, como PLs que legalizaram a grilagem e fragilizam o licenciamento ambiental. O resultado dessa política a gente já vê há dois anos: aumento do desmatamento, das queimadas, e o Brasil se tornando um pária ambiental diante de um mundo que discute o presente e o futuro do planeta e da humanidade”, destacou o documento.

Na avaliação da ONG, é vital que as empresas que operam no país também tomem ações concretas para reverter esta situação e atuem para acabar com o desmatamento agora, e não em 2030.

O presidente tem defendido a regularização fundiária e a legalização da produção de commodities em terras indígenas, em um claro movimento para atender às pressões da bancada ruralista. Ele, inclusive, tratou desse assunto na live da última quinta-feira, quando levou o presidente do Instituto Nacional do Índio (Funai), Marcelo Xavier da Silva, e aproveitou para criticar os europeus.

O especialista em relações internacionais e CEO da BMJ Consultores Associados, Wagner Parente, destacou que a aprovação do PL da grilagem só contribuirá para piorar a imagem do Brasil lá fora, uma vez que há um movimento de vários parlamentares europeus condenando as ações de Bolsonaro no combate à pandemia de forma mais contundente do que os parlamentares brasileiros que conduzem a CPI da Pandemia.

Vale lembrar que, recentemente, Bolsonaro foi chamado de genocida por vários representantes do Parlamento Europeu. “As críticas são generalizadas e não são de apenas um único país. O desgaste da imagem já existe na área ambiental e na condução da pandemia, e esses PLs contribuem ainda mais para que o acordo entre Mercosul e União Europeia continue trancado na gaveta”, alertou Parente.

Contudo, o especialista lembrou que o projeto da grilagem não é apenas de Bolsonaro, mas da bancada ruralista, “que não tem apenas apoiadores do presidente”.  “Nesse caso, o ônus da imagem não é apenas do governo”, afirmou.

Segue, abaixo, a lista das empresas europeias signatárias da carta aberta aos parlamentares:

1  Agricultural Industries Confederation (AIC)
2  Ahold Delhaize
3 ALDI Einkauf SE & Co. oHG
4 ALDI SOUTH Group
5 AP7 (Sjunde AP-fonden)
6 Asda Stores Ltd.
7 The Big Prawn Company
8 British Retail Consortium Congregation of Sisters of St. Agnes
9 Co-op Switzerland
10 The Co-operative Group
11 Cranswick plc
12 Donau Soja
13 EdenTree Investment Management
14 Greggs plc
15 Hilton Food Group
16 Iceland Foods
17 KLP Kapitalforvaltning AS
18 Legal & General Investment Management
19 Lidl Stiftung
20 Marks & Spencer
21 METRO AG
22 Migros
23 Moy Park
24 National Pig Association
25 New England Seafood International (NESI)
26 Pilgrim’s UK
27 ProTerra Foundation
28 Red Tractor Assurance
29 Retail Soy Group
30 J Sainsbury Plc
31 Skandia
32 Swedbank Robur Fonder AB
33 Tesco PLC
34 Waitrose & Partners
35 Winterbotham Darby
36 Wm Morrison Supermarkets Plc
37 Woolworths Group

Vicente Nunes