POR MARLLA SABINO E HENRICK MENEZES
As reclamações e processos contra instituições financeiras estão cada vez mais frequentes. Cerca de 40% das ações que tramitam na Justiça brasileira são demandas de consumidores com problemas com bancos. Em abril deste ano, o Banco Central considerou 2.931 reclamações procedentes.
O gestor financeiro Wilson Vasconcelos, 23 anos, tem uma casa financiada pela Caixa Econômica Federal no nome da sogra, Francisca da Luz, há quase dois anos, no valor de R$ 110 mil, com prestações mensais de R$ 670. No ano passado, ele começou a receber notificações sobre a falta de pagamento de quatro mensalidades que já tinham sido quitadas. “Entramos em contato com a central de atendimento, fomos ao banco portando todos os comprovantes e, mesmo assim, as cobranças continuaram chegando”, diz, lembrando que as mensalidades que constavam em aberto somavam pouco mais de R$ 5 mil, mas esse valor foi acrescido de multas e juros diários.
O problema só foi resolvido depois que Vasconcelos e a sogra entraram com um processo de indenização por danos morais contra o banco. “Eles não nos deram a devida atenção. Mesmo com o problema já solucionado, continuamos com o processo. Afinal de contas, o que era para ser algo feito de boa vontade acabou nos prejudicando e gerando uma série de transtornos”, indigna-se. Questionada, a Caixa não se posicionou.
Serviços essenciais
Todos os bancos devem oferecer serviços essenciais gratuitamente para os clientes. Isso inclui fornecimento de um cartão com função de débito, realização de até quatro saques, duas transferências de recursos entre contas na própria instituição e dois extratos de movimentação mensal, compensação e fornecimento de 10 folhas de cheque e consultas ilimitadas via internet, mas a falta de conhecimento desses direitos e a omissão de informações pelos bancos levam muitos brasileiros a fazerem escolhas inadequadas.
A coordenadora institucional da Proteste, Maria Inês Dolci, explica que é necessário que o cliente saiba qual perfil bancário se encaixa, ou seja, quais serviços quer usar e o que o banco pode oferecer, pois só assim poderá escolher. “Geralmente, as instituições financeiras não oferecem os serviços padronizados. Oferecem pacotes que, às vezes, não servem para nada. Isso gera mais custos para os consumidores, que, muitas vezes, não conhecem os direitos e pagam por coisas que nem usam”, ressalta.
O Banco Central padronizou os pacotes de serviços que devem ser oferecidos para os clientes. O chefe da unidade do Departamento de Atendimento Institucional do Banco Central, Fernando Dutra, explica que existem quatro pacotes e que os bancos são obrigados a disponibilizar os valores cobrados por tarifas bancárias, para que o consumidor possa comparar os valores e os serviços. Além disso, o BC disponibiliza, mensalmente, um ranking com as reclamações mais recebidas por instituições financeiras.
“O Banco Central está atuando próximo aos bancos para garantir que estão ofertando serviços que se encaixem no que é necessário para o cliente e que entreguem o que é contratado. Estamos notificando de forma efetiva os bancos que apresentam irregularidades e supervisionando o cumprimento da legislação estabelecida”, ressalta Dutra.
Maria Inês destaca que o consumidor deve ter um acompanhamento da vida bancária. É necessário conferir extratos e todas as cobranças que são feitas. “Para poder reclamar, a pessoa tem que saber quais os direitos e serviços contratados, só assim identificará uma cobrança indevida ou irregularidade”, alerta. Além disso, na hora da contratação de um banco, deve pesquisar os preços das tarifas em todas as instituições. “É possível escolher a opção mais barata”, garante.
Casos coletivos
Em maio, o Banco BMG foi condenado pela 4º Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (Prodecon) por práticas abusivas que contrariam o Código de Defesa do Consumidor, como descontos indevidos em contratos de financiamento e crédito de valores em empréstimos não contratados.
O promotor de Justiça Guilherme Fernandes Neto, titular da 4ª Prodecon, explica que é importante que as pessoas que sofrem com alguma irregularidade procurem o banco, formalizem todas as tentativas de resolução por e-mail e que cheguem à Promotoria com provas das cobranças indevidas. “Atuamos em casos coletivos, tentamos desestimular que essa prática seja cometida. E, assim, evitar que o banco continue com o comportamento irregular”, afirma.
O BMG deverá pagar R$ 500 mil a título de danos morais coletivos e devolver, em dobro, os valores indevidamente cobrados de todos os consumidores lesados. Procurado, o banco não deu retorno.
Crédito
O estudante Wellington Silva, 22, entrou em contato com o Banco do Brasil para fazer a liberação para uso internacional do cartão de crédito em uma viagem para Santiago do Chile. Nos primeiros dias em solo estrangeiro, o cartão passava normalmente, porém, no penúltimo dia da viagem, parou de funcionar. “Fiz diversas tentativas frustradas de compras, porém não eram autorizadas”, conta.
As transações recusadas pelo banco geraram uma série de transtornos ao estudante. A fim de evitar mais constrangimento na viagem, Silva decidiu restringir o uso do cartão e usar o pouco do dinheiro que tinha. “Não houve como entrar em contato com o banco para pedir explicações pela situação constrangedora, já que estava em outro país”, relata.
Apesar de ter limite de crédito suficiente em conta, o cartão do BB não cumpriu o prometido: funcionar corretamente no exterior. Em razão disso, o estudante entrou com uma ação de indenização por danos morais contra o banco, que ainda segue aguardando um acordo. Procurado, o BB não se manifestou.
O advogado especialista em direito do consumidor Kayo Leite explica que situações parecidas com a vivida por Wellington deixam os clientes ainda mais vulneráveis. “São ações em que os consumidores são vitimados com frequência. O Código de Defesa do Consumidor profere que a situação é mais grave quando a pessoa está em território estrangeiro”, explica.
Leite alerta ainda que, em muitos casos relacionados a cartão de crédito, o banco tenta se eximir do ônus com a justificativa de que o responsável é a administradora. Mas, pela lei do consumidor, é adotada a teoria da aparência. “Para o cliente, quem se revela aparentemente pela prestação do serviço é o banco, então, o consumidor pode reclamar com a instituição financeira”, esclarece. O advogado ressalta que a população deve se engajar nas reclamações de irregularidades para que os bancos criem disciplina e evitem cometer táticas abusivas.
Brasília, 16h01min