ROSANA HESSEL
O jabuti incluído em um projeto de lei que fez a Câmara dos Deputados aprovarem a mudança na Lei das Estatais está dando o que falar e gerando indignação no mercado financeiro e entre entidades que defendem o combate à corrupção. Com a alteração na regra, o prazo de para políticos assumirem cargos em empresas públicas cai de três anos para 30 dias, na contramão das normas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Em nota de repúdio, seis entidades apontam o retrocesso nessa medida que recupera o toma-la-de cargos e e alertam as autoridades contra a volta do aparelhamento político das estatais. A Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec), a Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil, (Apimec Brasil), o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE), o Instituto Não Aceito Corrupção (INAC) e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade ressaltaram que as normas introduzidas pela Lei das Estatais, aprovada em 2016, atendem a recomendações de referências nacionais e internacionais, incluindo as diretrizes de governança para empresas estatais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o chamado clube dos ricos.
“O alinhamento a esses padrões é um dos passos previstos no processo de acessão do Brasil à OCDE, que já reconheceu publicamente que os conselhos de administração das estatais federais aumentaram a independência de interferências político-partidárias em função dos impedimentos estabelecidos pela Lei das Estatais”, destacou a nota divulgada, nesta quarta-feira (14/12), em repúdio à brecha para o aparelhamento político de estatais e de agências reguladoras. Segundo o documento, “os danos decorrentes de indevidas interferências político-partidárias prejudicam os cofres públicos e a qualidade dos serviços e produtos entregues à população. Tais interferências afetam, de forma negativa, o ambiente de negócios brasileiro, comprometendo o desenvolvimento do país e a mitigação da desigualdade social existente”.
Abaixo, a íntegra da nota de repúdio das seis entidades.
Nota de repúdio — Alteração do artigo 17 da Lei das Estatais e do artigo 8-A Lei das Agências Reguladoras
Diante da aprovação pela Câmara dos Deputados do Projeto de Lei 2.896/2022, que altera os artigos 17 e 93 da Lei 13.303/2016 (Lei das Estatais) e o art. 8-A da Lei nº 9.986 (Lei das Agências Reguladoras), a Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec), a Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil, (Apimec Brasil), o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), o Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE), o Instituto Não Aceito Corrupção (INAC) e o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade ressaltam que:
1 — Repudiam o procedimento legislativo adotado para alterar os requisitos e vedações estabelecidos pelo artigo 17 da Lei 13.303/2016 e o artigo 8- A da Lei 9.986 para a investidura dos cargos de administradores das empresas estatais e diretores das agências reguladoras.
2 — A edição da Lei 13.303/2016, fruto de longo processo legislativo, com a interação da sociedade civil, representou avanço substancial na governança corporativa das empresas estatais federais, estaduais e municipais e na adoção de blindagem contra o risco de sua captura por interesses político-partidários, que ensejaram casos notórios de corrupção, de ineficiência de alocação de recursos públicos e de atendimento a objetivos eleitorais e privados, em detrimento dos objetivos para os quais as companhias foram criadas.
3 — O texto legislativo em vigor estabelece meios para que a seleção de candidatos à administração das estatais seja guiada por profissionalismo, qualificação técnica, ética e atendimento aos objetivos dessas empresas, fortalecendo, dessa forma, a sua integridade, governança, gestão e eficiência. A Lei das Agências Reguladoras, inspirada pela Lei 13.303, replicou os mesmos procedimentos do artigo 17.
4 – Os danos decorrentes de indevidas interferências político-partidárias prejudicam os cofres públicos e a qualidade dos serviços e produtos entregues à população. Tais interferências afetam, de forma negativa, o ambiente de negócios brasileiro, comprometendo o desenvolvimento do País e a mitigação da desigualdade social existente.
5 – No caso das sociedades de economia mista listadas em bolsa de valores, os impactos atingem investidores, prejudicando a atratividade do mercado brasileiro de capitais como importante fonte de financiamento das atividades econômicas.
6 — As normas introduzidas pelo texto de 2016 atendem a recomendações de referências nacionais e internacionais, incluindo as diretrizes de governança para empresas estatais da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O alinhamento a esses padrões é um dos passos previstos no processo de acessão do Brasil à OCDE, que já reconheceu publicamente que os conselhos de administração das estatais federais aumentaram a independência de interferências político-partidárias em função dos impedimentos estabelecidos pela Lei das Estatais.
7 – A OCDE recomendou ao Brasil ir além das conquistas já alcançadas e perseguir aprimoramentos como a (i) extensão dos requisitos e vedações para todos os comitês do conselho de administração e para o conselho fiscal, (ii) a concessão efetiva ao conselho de administração do poder de indicar e demitir o diretor-presidente das estatais, e (iii) o aperfeiçoamento das regras e procedimentos de indicação e nomeação de administradores dessas empresas.
Por fim, as organizações abaixo assinadas, representantes da sociedade civil, esperam e confiam que os órgãos externos de controle e o próprio Poder Judiciário cumpram, tempestivamente, com suas atribuições, fiscalizando e punindo os responsáveis por desvios das normas jurídicas e dos sistemas de governança das estatais e das agências reguladoras. É preciso que os integrantes dos Poderes Executivo e Legislativo atuem para preservar a Lei 13.303/16, combatendo qualquer tentativa de mudança indevida, que resulte em retrocessos.
- AMEC – Associação dos Investidores no Mercado de Capitais
- APIMEC BRASIL — Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil
- IBDEE – Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial
- IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa
- Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
- INAC — Instituto Não Aceito Corrupção