ROSANA HESSEL
O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, manteve a preocupação com os riscos fiscais na ata da 234ª reunião do colegiado realizada na semana passada, nos dias 2 e 3 deste mês, reforçando os alertas e a recomendação do comunicado da última quarta-feira pedindo paciência e serenidade com a atual política monetária. Apesar das pressões do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o início de um ciclo de redução dos juros, o BC manteve a porta aberta para uma possível alta, se for necessária sem dar sinais de quando pode iniciar o ciclo de queda.
“O Comitê avalia que a conjuntura demanda paciência e serenidade na condução da política monetária. O Copom enfatiza que, apesar de ser um cenário menos provável, não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, destacou o documento de 23 parágrafos mais curto do que o anterior, de março, de 28.
A principal missão do BC é preservar o valor da moeda e fazer a inflação voltar para o centro da meta no horizonte relevante, ou seja, 2024, de 3%, com teto de 4,50%, uma vez que a deste ano, de 3,25% com limite superior de 4,75%, está difícil de ser alcançada.
Na reunião, o Banco Central decidiu manter a taxa básica da economia (Selic) em 13,75% ao ano pela 6ª reunião consecutiva, apesar de a inflação apresentar desaceleração, pois a prévia do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de abril ter acumulado alta de 4,16%, a menor taxa para o período desde outubro de 2020, de 3,52%.
O Comitê reforçou o fato de os riscos inflacionários permanecerem em ambas as direções. A mediana das estimativas do mercado para a inflação deste ano e do próximo estão em 6,02% e 4,16%, respectivamente, conforme o boletim Focus divulgado ontem pelo BC.
O Copom voltou a alertar que o processo de desaceleração da inflação recente ainda é preocupante, porque a inflação dos núcleos ainda é resiliente, reforçando que o Copom não vai ceder às pressões do governo para antecipar o corte da taxa básica. “Com relação à inflação de serviços e aos núcleos de inflação, observa-se maior resiliência e menor velocidade da desinflação nas últimas divulgações, em linha com o processo não linear que o Comitê já antecipava”, ressaltou o documento do colegiado composto por sete diretores na reunião, incluindo o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Em relação aos riscos fiscais, o Banco Central, voltou reforçar a preocupação com a necessidade de um novo arcabouço crível para contribuir para o processo de desaceleração dos preços, mas ressaltou que não existe uma relação mecânica nesse sentido. O número de vezes em que a palavra risco foi citada foi nove uma menos do número da ata anterior, mas foi acrescentando um ponto preocupante, segundo analistas, que é o aumento da taxa de juros neutra — aquela que não afeta a produtividade da economia.
Na ata, o Comitê reconheceu que a apresentação a nova regra fiscal “reduziu a incerteza associada a cenários extremos de crescimento da dívida pública”, mas ainda é preciso aguardar a votação no Congresso para ter certeza da sua efetividade. “O Comitê seguirá acompanhando a tramitação e a implementação do arcabouço fiscal apresentado pelo governo e em apreciação no Congresso. O Copom novamente enfatizou que não há relação mecânica entre a convergência de inflação e a aprovação do arcabouço fiscal, uma vez que a trajetória de inflação segue condicional à reação das expectativas de inflação e das condições financeiras”, destacou. “A materialização de um cenário com um arcabouço fiscal sólido e crível pode levar a um processo desinflacionário mais benigno através de seu efeito no canal de expectativas, ao reduzir as expectativas de inflação, a incerteza na economia, o prêmio de risco associado aos ativos domésticos e, consequentemente, as projeções do Comitê”, acrescentou o texto.
Na avaliação da equipe de analistas liderados pelo diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, Fernando Honorato, o BC reforçou as mensagens contidas no comunicado da última reunião e avaliou que a conjuntura segue demandando paciência e serenidade, “não trazendo sinais de que poderá iniciar a flexibilização monetária no curto prazo”.
“Ainda que tenha reconhecido, diversas vezes, a redução de riscos associada à apresentação do regime fiscal, o BC reforçou que não há relação mecânica entre a aprovação do arcabouço e a convergência da inflação. Em relação à conjuntura econômica, o BC chamou atenção para a sustentação do consumo e resiliência do emprego formal, além do setor agropecuário. A avaliação sobre os preços, por sua vez, é de um processo de desinflação mais lento, possivelmente decorrente de um excesso de demanda no setor de serviços”, avaliou o relatório do Bradesco. “O colegiado manteve na comunicação o trecho onde indica que, havendo necessidade, poderá retomar o ciclo de ajuste, mas que agora avalia esse como um ‘cenário menos provável'”, acrescentou o texto. O Bradesco mantém a projeção para o início do ciclo de corte de juros em setembro, com a taxa Selic encerrando o ano em 12,25%, “a depender da evolução dos dados”.