Não se pode dizer que a passagem do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pela reunião de primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Washington, tenha sido um sucesso. Muito pelo contrário. Mas foi importante para começar o processo de reconstrução da imagem do Brasil no mercado internacional, processo que, diante do estrago cometido na economia no primeiro mandato de Dilma Rousseff, será lento, gradual, doloroso.
Nas muitas conversas que manteve com participantes do encontro do FMI, Levy pôde detalhar as boas internações do país de arrumar a casa e retomar o crescimento da economia. Foram muitos os questionamentos, sobretudo em relação ao real comprometimento do governo com o ajuste fiscal, à capacidade de reação do Produto Interno Bruto (PIB) e à crise política que mantém Dilma de joelhos. Apesar de o ministro ter se deparado com votos de confiança, não faltou ceticismo.
Reconstruir credibilidade não é um processo trivial. Levy sabe que o governo errou demais nos últimos quatro anos e destruiu pontes. Até agora, o que se vê é mais vontade da equipe econômica de entregar o que prometeu do que dados concretos que possam sacramentar, por exemplo, que o Tesouro Nacional entregará a meta fiscal de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano e de 2% em 2016 com a atividade no chão e as receitas muito aquém do esperado.
As perspectivas para a economia são muito ruins, pelo menos neste ano, admite o economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros. Ele prevê queda de 0,6% para o PIB no primeiro trimestre e tombo entre 1% e 1,5% no segundo, período que deve ser o pior para a atividade. Barros lembra que, nos últimos anos, parte relevante da resposta do governo ao baixo crescimento foi incentivar o consumo por meio da política fiscal, ou seja, cofres abertos e redução do superavit primário. Essa política, em uma economia com pleno emprego, traduziu-se em disparada da inflação e maiores deficits nas contas externas.
O economista do Bradesco ressalta que o impulso fiscal acabou se tornando negativo, porque incentivou desconfiança e questionamentos sobre a sustentabilidade da dívida pública. “Agora, vemos a reversão de boa parte dessas medidas, com juros mais elevados e política fiscal claramente contracionista. É isso que explica a previsão de queda anualizada de quase 4% do PIB no primeiro semestre do ano”, diz.
Assim como Barros, muitos dos presentes no encontro do FMI veem uma caminhada difícil para o Brasil, que terá de remar contra a maré, sobretudo a que vem dos Estados Unidos. Não por acaso, o tema dominante nos últimos dois dias em Washington foi o aumento das taxas de juros na maior economia do planeta. Esperava-se que o movimento de alta começasse em junho próximo, mas os sinais emitidos pelo Federal Reserve (Fed), o Banco Central norte-americano, acabaram indicando que o processo de mudança na política monetária será iniciado mais para o fim do ano.
Nas palavras de um interlocutor de Levy, o melhor que o Brasil tem a fazer neste momento é não arrumar problemas. O mundo está mergulhado em incertezas, os sinais de retomada da atividade são frágeis, os países emergentes estão baqueados e os bancos centrais estão em conflito tanto sobre juros quanto sobre câmbio. Será importante que o ministro detalhe bem para a presidente Dilma o que ouviu lá fora. Um pé em falso do país será o fim do voto de confiança que ainda está nos mantendo de pé.
O muso do FMI
» Ninguém fez mais sucesso no encontro de primavera do FMI do que o primeiro-ministro da Grécia, Aléxis Tsípras. O painel que ele participou registrou o maior público do evento. Foi demandado por todas as autoridades presentes, ávidas por saber até que ponto ele está disposto a evitar o calote grego.
Rombo de US$ 4,8 bi
» O país registrou rombo de US$ 4,8 bilhões em março, segundo previsões do Banco Santander. A queda em relação a fevereiro, quando o deficit atingiu US$ 6,9 bilhões, se deveu ao melhor resultado da balança comercial. No acumulado em 12 meses, porém, o buraco continuará elevado, em 4,1% do PIB.
Mudanças nas contas
» O Banco Central mudou a metodologia das contas externas. Depois de dois anos de estudos e muito debate, adequará as informações às regras definidas em 2010 pelo FMI. Os números, a serem revelados em 23 de abril, vão mostrar aumento nos investimentos estrangeiros diretos (IED).
Atletas desnudados
» O BC também passará a divulgar os volumes de recursos movimentados pelas vendas de jogadores brasileiros ao exterior. Há uma grande demanda por esse dados, sobretudo por causa das suspeitas de irregularidades nas transações.
Desafios e oportunidades
» Fabio Rua, diretor da IBM Brasil, e Marcelo Ortiz, da Embraer, apresentarão painel sobre economia global, setor privado e competitividade — desafios e oportunidades, em 23 de abril, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. O tema faz parte da programação do 20º Encontro Brasileiro de Estudantes de Relações Internacionais, organizado pela Fundação Armando Alvares Penteado.
Brasília, 00h01min