Dólar baixo infla tensão nas fábricas

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A reforma da Previdência Social é importante para o país, mas, na visão do empresariado, nada é mais primordial para a retomada da economia do que a flexibilização das leis trabalhistas e as mudanças no sistema tributário. Por terem efeito imediato na atividade, os industriais acreditam que o governo não deve abrir mão de aprová-las ainda neste ano. Sem um sistema que facilite as contratações de trabalhadores e sem uma carga de impostos menos danosa, a recuperação do Brasil se dará em um ritmo muito lento, em que a criação de empregos ficará aquém do necessário. Pelos cálculos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 24,3 milhões de pessoas estão desocupadas ou trabalham menos do que gostariam.

A pressão do empresariado sobre o governo e o Congresso será grande daqui por diante, avisa Edson Campagnolo, vice-presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e presidente da Federação das Indústrias do Paraná. Nos últimos dias, um grupo de industriais percorreu o Palácio do Planalto, a Câmara e o Senado para apresentar 10 pontos que o setor considera primordiais para o país sair do atoleiro. Há, no entender de Campagnolo, apoio dos donos do dinheiro à administração de Michel Temer, mas o governo deve apressar o passo para que os nós que atrapalham a produção sejam desatados num ritmo mais veloz. “Sem isso, não há como se falar em crescimento econômico superior a 1% neste ano”, diz.

O empresário reconhece que há boa vontade do governo e do Congresso para pôr fim à recessão. Mas só isso não é suficiente. Ele conta que ouviu do presidente do Senado, Eunício Oliveira, um relato importante sobre uma conversa que o parlamentar teve com Temer no dia da sabatina de Alexandre Moraes para o Supremo Tribunal Federal (STF). “O senador Eunício disse ao presidente que o futuro do governo passa pela recuperação da economia. Portanto, a hora é de se trabalhar pesado para a retomada do crescimento e a geração de emprego e renda. Temer concordou com tudo”, afirma.

Concordar, no entanto, faz parte do jogo. É preciso agir. O vice-presidente da CNI diz que o Planalto deveria começar seus movimentos por meio do programa de renegociação de débitos tributários, o Refis. “Do jeito que foi enviado ao Legislativo, o programa em nada favorece as empresas, sobretudo as pequenas e as médias, já que, no caso das micros, houve um sistema especial de renegociação de débitos, e, no das grandes, as regras atuais acabam se encaixando”, ressalta. “O governo se esqueceu de que são justamente as pequenas e as médias empresas que mais empregam. Se elas não conseguirem reorganizar suas finanças, em vez de voltarem a contratar, fecharão as portas”, completa.

Refis direcionado

Campagnolo explica que um Refis que não dá desconto em multas e juros não funciona para as empresas. Mesmo o prazo definido para o parcelamento dos débitos tributários não é suficiente. É preciso, segundo ele, ampliar as parcelas de 120 para 180 meses. “Mostramos para os ministérios da Fazenda e do Planejamento que, sem ajustes, o Refis não funcionará. Pior, agravará a situação das empresas que não conseguirem aderir ao programa”, frisa. Na avaliação dele, do jeito que o projeto está, ficou a impressão de que tudo foi feito de forma direcionada, para atender grupos específicos.

O empresário assinala que o não pagamento de tributos foi uma das últimas opções das empresas. Primeiro, reduziu-se custos. Depois, enxugou-se o quadro de pessoal. Como o faturamento só fazia cair por causa da recessão, a saída foi ficar em débito com a Receita Federal. “Diante desse quadro dramático, estamos seguindo a recomendação que nos foi dada por Henrique Meirelles e Dyogo Oliveira. Fomos para o que eles chamam de palco de negociações”, enfatiza. “Por meio da CNI, apresentamos 50 emendas ao projeto do Refis. No total, são 350 emendas. Precisamos que o governo nos dê apoio”, emenda.

Com as mudanças no Refis, a indústria pede que o Congresso sacramente o principal ponto do projeto de reforma trabalhista encaminhado pelo Planalto: as convenções coletivas entre patrões e empregados devem se sobrepôr à legislação. Além disso, é necessário que deputados e senadores aprovem a terceirização. São pontos, segundo Campagnolo, fundamentais para dar novo alento ao setor produtivo. A indústria está encolhendo há quatro anos seguidos. Atualmente, na média, um terço das fábricas está ocioso. Ou seja, levará tempo para que as máquinas sejam religadas e as contratações, retomadas.

Em meio às demandas, ressalta Campagnolo, surgiu no horizonte um grande problema: o derretimento do dólar. A moeda está caminhando rapidamente para os R$ 3, minando o que ainda resta de competitividade dos produtos brasileiros no exterior. Para o empresário, o Banco Central deveria ter reduzido, na quarta-feira, a taxa básica de juros (Selic) em um ponto percentual e não em 0,75 ponto. Com isso, inibiria um pouco a entrada de recursos estrangeiros no país e baratearia um pouco mais o custo do capital. “Já nos frustramos no início do governo Temer, quando se acreditou que, com o impeachment, a economia melhoraria rapidamente. Não podemos nos frustrar de novo”, conclui.

Brasília, 06h10min

Vicente Nunes