Dez estados gastaram mais de 60% da receita com pessoal até outubro

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ROSANA HESSEL

O número de estados descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) passou de 11 para 10, entre o 4º bimestre e o 5º bimestre de 2020, conforme dados do Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO) de estados e do Distrito Federal, divulgando pelo Tesouro Nacional nesta segunda-feira (21/12).

No acumulado do ano até outubro, Pernambuco, Sergipe, Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná, Paraíba, Tocantins, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul gastaram mais de 60% da Receita Corrente Líquida (RCL) com pessoal. Dados do órgão ligado ao Ministério da Economia mostra que, no bimestre encerrado em agosto, também integrava essa lista o Acre, que ficou com percentual de 59% no 5º bimestre, ou seja, bem perto do limite de 60% previsto na LRF para os entes federativos.

De acordo com a LRF, se a despesa dos estados com pessoal ultrapassar 95% do teto previsto, ou seja, 57% da RCL, a regra proíbe qualquer movimentação de pessoal que implique aumento de despesa. Logo, Acre ainda continua com gastos acima desse limite prudencial, assim como Mato Grosso e Santa Catarina, com taxas de 57% e 58%, respectivamente. Rio Grande do Sul e Rio Grande do Norte foram os estados que mais gastaram com pessoal em relação à RCL em 2020, com 72% e 77% da RCL, respectivamente. Na esfera federal, o limite máximo para despesas com a folha é de 50% da RCL.

Procurado para comentar essa variação, o Ministério da Economia informou, por meio de nota, que “levando-se em consideração que o cálculo do percentual utiliza duas variáveis, a despesa total com pessoal e a RCL, e que dificilmente a variável da despesa tenha diminuído, a tendência é que o resultado apresentado reflita uma alteração do lado da receita”. “Porém, não conseguimos afirmar que a alteração positiva decorre dos repasses realizados pela União aos estados, embora possam sim ter contribuído”, afirmou o órgão, acrescentando é preciso comparar os indicadores econômicos nos períodos analisados “para sustentar (ou não) a tese de que os repasses (da União) são os responsáveis por tal melhoria”.

Na avaliação do economista e especialista em contas públicas Raul Velloso, essa leve redução no número de estados desenquadrados na LRF não chega a representar uma melhora efetiva nas contas estaduais, porque houve perdas menores na arrecadação, em grande passe, devido ao aumento dos repasses de recursos da União durante a pandemia, devido à Lei Complementar (LC)  173/2020, que também suspendeu o pagamento das parcelas da dívida junto ao governo federal.  “Os estados não perderam receita, no frigir dos ovos e ainda receberam um dinheiro extra dos precatórios do Fundeb ( Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação)”, afirmou.

De acordo com Velloso, apenas o estado do Piauí recebeu R$ 1,7 bilhão referentes aos precatórios do Fundeb. “Esses recursos representam dois ou mais anos de investimentos do estado”, comparou Velloso.  “Tem um conjunto de coisas que explicam, com alguns setores ou estados apresentando desempenho melhor durante a pandemia. Mas é preciso entender que este ano e o próximo são atípicos e tudo o que acontecer não explica uma tendência. Precisam ser vistos à parte, porque são pontos fora da curva”, explicou. “Para os estados que apresentaram melhora na arrecadação, não podemos esquecer que se trata de uma melhora atípica. Passados esses dois anos, não há garantias de que as melhorias continuarão”, acrescentou.

Melhora na arrecadação

De acordo com os dados do RREO, apenas o estado do Rio de Rio de Janeiro, apresentou queda na receita no acumulado do ano até outubro. Espírito Santo, Bahia, Rio Grande do Sul e Rio Grande do Sul tiveram variação zero na comparação com o mesmo período de 2019, segundo o relatório do Tesouro.

Em relação ao resultado orçamentário, apenas Rio Grande do Sul apresentou saldo negativo, de R$ 1,1 bilhão, dado 75% inferior ao rombo de R$ 4,4 bilhões computados entre janeiro e outubro de 2019. Enquanto isso, São Paulo apresentou o melhor resultado orçamentário, com R$ 21,6 bilhões em receitas superiores que as despesas, sado 16% da RCL. Os dados do Tesouro Mostram que o resultado orçamentário do DF ficou positivo em R$ 2,5 bilhões, passando de 11% da RCL, em 2019, para 12%, em 2020.

Conforme dados da secretaria especial de Fazenda, desde agosto, a arrecadação dos estados e do Distrito Federal superou o volume mensal de 2019. Em setembro, essa receita, somando com os repasses previstos na LC 173, o aumento foi de 43,7% sobre os R$ 32,9 bilhões recolhidos em 2019, somando R$ 47,3 bilhões. Em outubro, por sua vez, o volume da receita encolheu 27,9%, para R$ 34,1 bilhões, dado 22,2% acima dos R$ 27,9 bilhões de 2019.

Um estudo elaborado pelo economista Marcos Mendes, do Insper, mostra que o governo federal fez gastos excessivos no combate à pandemia, quando comparado aos demais países da América Latina ou às economias emergentes. “Boa parte desse exagero se deu no auxílio emergencial. A presente nota tem por objetivo mostrar que, no caso dos governos estaduais, a ajuda também superou em muito o impacto sofrido por esses governos, transferindo para a União não apenas o custo do choque por eles sofridos, mas também um custo adicional, que se reflete, hoje, em elevados saldos de caixa em poder dos estados”, escreveu.

De acordo com o levantamento, os estados acumularam volumoso saldo de caixa e, alguns deles tiveram incremento de até 75%, como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. O saldo bruto mostra que, até agosto, os estados tinham em caixa R$ 33 bilhões a mais do que na mesma data do ano passado. “No agregado, isso representa um aumento de 25% do caixa. Olhando estado a estado, o crescimento médio foi de 42%”, destacou Mendes.

Vicente Nunes