DESASTRE DA CONSTRUÇÃO

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A construção civil terá, em 2016, o terceiro ano seguido de retração. E o resultado será pior do que o observado em 2015, quando a queda ficou próxima de 6%. A perspectiva é de que as demissões se acelerem e não será surpresa se o fechamento de vagas encostar, novamente, em meio milhão. Desde que o ano começou, nenhum empreendimento saiu do papel. O que está sendo tocado vem de períodos anteriores. Não há expectativa de reposição de obras. Em mais de uma década, nunca se viu um quadro de tanto pessimismo no setor.

Boa parte do crescimento da economia até a primeira metade do primeiro mandato de Dilma Rousseff decorreu do boom da construção civil. O setor, ao absorver mão de obra menos qualificada, levou o desemprego aos níveis mais baixos da história. Agora, fará exatamente o papel contrário. Empurrará o Produto Interno Bruto (PIB) para o buraco, ajudando a sacramentar queda de 4%, e levará o número de desocupados para próximo de 12%, na melhor das hipóteses.

Pelos cálculos do presidente da Câmara Brasileira da Construção Civil (CBIC), José Carlos Martins, somente no Rio de Janeiro serão demitidos cerca de 135 mil pessoas que vêm trabalhando em obras ligadas às Olimpíadas. “Isso acontecerá porque não há notícias de projetos que possam ser colocados em prática logo depois dos jogos”, diz. Ele ressalta que, no caso da construção, é preciso tempo para que os empreendimentos se tornem realidade e possam gerar emprego e renda.

“Não se está falando de uma indústria que desligou máquinas e pode religá-la a qualquer momento. Construção exige tempo, planejamento. E não nos preparamos para susbtituir as obras que estão chegando ao fim”, afirma Martins. Na avaliação dele, a gritaria dos demitidos demorará algum tempo para ser ouvida. Os trabalhadores só sentirão o baque real da perda do emprego quando acabar o dinheiro da rescisão de contrato, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e do seguro-desemprego.

Dois pés no freio

Em outros tempos, o governo poderia acelerar o passo e ocupar o vácuo deixado pela iniciativa privada. Mas, devido ao desastre fiscal, no máximo, o Tesouro Nacional só terá condições de pagar os contratos que estão em andamento. O presidente da CBIC ressalta que o Orçamento da União prevê desembolsos entre R$ 8 bilhões e R$ 10 bilhões para obras de infraestrutura em 2016, aí incluído o Minha Casa Minha Vida. “Não há espaço fiscal para o governo fazer mais nada que não seja honrar os compromissos já assumidos”, frisa.

O Minha Casa 3, que a presidente Dilma tanto anseia, só terá condições de ser colocado em prática no fim do ano, para que as obras possam ser contratadas a partir de 2017. Isso, é claro, se houver dinheiro suficiente. A boa notícia, diz Martins, é que o governo conseguiu colocar os pagamentos em dia, dando fôlego para que as construtoras possam ao menos entregar o que prometeram. No caso de obras vinculadas ao Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit), contudo, os atrasos permanecem. As faturas pendentes somam R$ 2,8 bilhões.

Na avaliação de Martins, infelizmente, não há muito o que fazer para reverter o desastre programado para este ano na construção civil. Não há confiança dos empresários em relação ao governo. A ordem é manter os dois pés no freio. Entre os consumidores, nunca foi tão grande o temor em relação ao desemprego. São poucos os que se arriscam a assumir financiamentos de longo prazo para comprar a casa própria. Temem não ter como pagar as prestações.

Chuva de queixas

Não há nenhum exagero na percepção negativa dos trabalhadores. Pelos cálculos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o desemprego cravou, em janeiro, a maior taxa para o mês desde 2009 nas seis principais regiões metropolitanas do país: exatos 7,6%. A renda média desabou 7,4% ante o mesmo período de 2015. Na mesma comparação, a massa salarial recuou 10,4%. São números assustadores, que vão pesar muito no orçamento das famílias.

A recessão que destrói vagas foi provocada pelo governo. Os consecutivos erros na política econômica trouxeram de volta a inflação e a desconfiança. Não por acaso, tornou-se rotina nas mesas de bares, nas filas do supermercado, nos pontos de ônibus ouvir relatos desanimadores de pessoas que engrossaram o exército de desempregados. Muitas não se conformam por terem sido enganadas pela promessa de que, finalmente, o país havia entrado na rota do crescimento sustentado. As queixas, infelizmente, ainda vão aumentar muito.

Brasília, 08h30min

Vicente Nunes