Deficit primário deste ano vai ultrapassar 11% do PIB, diz Mansueto

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ROSANA HESSEL

Diante da piora nas contas públicas e o aumento dos gastos emergenciais com medidas fiscais no combate à pandemia de covid-19, deficit primário do governo central em 2020 poderá girar de R$ 800 bilhões a R$ 850 bilhões, superando 11% do Produto Interno Bruto (PIB) adiantou o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida.

Antes, o governo previa um rombo perto de R$ 700 bilhões, ou algo em torno de 9,5% do PIB nas contas do governo central, mas Mansueto admitiu que ele será maior devido à prorrogação de programas de socorro à economia, como o auxílio emergencial de R$ 600. O impacto adicional será de R$ 100 bilhões, se o benefício for prorrogado por por dois meses ou em três parcelas de R$ 500, R$ 400 e R$ 300.

“O impacto será o mesmo, de R$ 100 bilhões, nos dois casos” afirmou. “E sim, o deficit primário do governo central poderá ultrapassar 11% do PIB”, adiantou Mansueto, nesta segunda-feira (29/06), durante videoconferência para jornalistas ao apresentar o resultado de maio das contas do governo central, que reúne Tesouro, Previdência Social e Banco Central. No mês passado, o rombo fiscal foi de R$ 126,6 bilhões, o maior da história para o período e, no acumulado do ano, o saldo da diferença entre receitas e despesas do governo federal saltou 1.171%, totalizando R$ 222,5 bilhões.  Ele ainda disse que o deficit nominal, que inclui os gastos com juros da dívida, poderá chegar a 15% do PIB.

As novas projeções do tamanho do rombo fiscal deste ano deverão ser apresentados amanhã pelo secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, adiantou Mansueto. Segundo ele, a piora nas contas públicas é decorrente do aumento de quase 70% nas despesas e da queda de mais de 40% na arrecadação. Ele lembrou que nem mesmo o empoçamento recorde previsto para o ano, de R$ 28 bilhões, e a sobra em torno de R$ 17 bilhões dos R$ 40 bilhões previstos para o pacote de financiamento da folha de pequenas e médias empresas, serão suficientes para reverter essa piora no quadro fiscal.

De acordo com Mansueto, apenas em maio, as despesas emergenciais no combate aos efeitos do novo coronavírus somaram R$ 113,8 bilhões, o que elevou o volume substancialmente o volume das despesas obrigatórias para mais de 100% da Receita Corrente Líquida (RCL), que está em queda devido à recessão que deverá fazer o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano encolher mais de 6%.  No acumulado em 12 meses até maio, o volume de despesas obrigatórias correspondeu a 116% da RCL, algo que deverá acender o alerta de investidores que ficam atentos às contas públicas para comprar títulos do Tesouro.

“A receita líquida está caindo e o que podemos ver com esse aumento das despesas é que tudo o governo não está conseguindo arrecadar o suficiente para cobrir os gastos obrigatórios. Cada centavo acima da RCL é deficit primário e ele está ficando pior. O que o governo arrecada não é mais suficiente para pagar as despesas obrigatórias”, destacou Mansueto em sua última entrevista coletiva no cargo. Ele será substituído no mês que vem por Bruno Funchal, diretor de programa da secretaria especial de Fazenda, que participou da entrevista junto com outros técnicos da pasta. Assim como o titular do Tesouro, o futuro secretário reforçou a importância de manutenção do teto de gastos e descartaram qualquer discussão dentro do governo para mudança na emenda constitucional que é um dos pilares da confiança do mercado no governo.

Mansueto garantiu que apesar dessa piora no quadro fiscal, por enquanto, o Tesouro não está tendo problemas para a rolagem de títulos da dívida pública, mas admitiu que o prazo está cada vez mais curto.  “Em maio tivemos o maior volume de leilões dos últimos 11 meses. Está ocorrendo um encurtamento da dívida, porque estamos vendendo títulos muito curtos, com vencimento em até seis meses”, disse. Ele citou que mercado vem demandando mais pelos títulos indexados à Selic (LFT) e pelas operações compromissadas (overnight).

Não à toa, as operações compromissadas realizadas pelo Banco Central com títulos do Tesouro voltaram a ficar acima de R$ 1 trilhão desde fevereiro. Em abril, somaram R$ 1,29 trilhão, o equivalente a 17,7% do PIB, conforme dados do BC.  Em dezembro, esse tipo de operação totalizou R$ 951,5 bilhões, ou 13,1% do PIB.

Mansueto reforçou a necessidade de o governo manter os sinais de que continuará defendendo a austeridade fiscal. “A situação não é tão grave, porque os juros estão baixos e eles devem continuar nesse patamar nos próximos anos. Mas para isso acontecer, o mercado não pode ter dúvidas do compromisso do governo com a continuidade do ajuste fiscal. Caso contrário, esse cenário de juro baixo pode se reverter no custo da dívida”, alertou.

De acordo com o secretário, 60% da dívida pública bruta atual está ligada aos juros e são de curto prazo.  “É muito importante dar sinais corretos de ajuste fiscal”, reforçou. Pelas projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), que revisou de 5,3% para 9,1% a estimativa de queda do PIB brasileiro neste ano, a dívida pública bruta deverá ultrapassar 100% do PIB em 2020.

Para o secretário do Tesouro, qualquer aumento de gastos públicos daqui para frente precisarão ser discutidos pelo Congresso e, caso o Legislativo e a sociedade, defendam um novo programa de renda mínima para o brasileiro, de forma permanente, esse custo deverá ser contabilizado com o aumento da carga tributária. “Hoje, o orçamento está engessado e o Congresso só pode discutir o destino de 6% dos recursos previstos para o ano, um percentual baixo e que não existe em nenhum outro país”, destacou. Ele lembrou que o ajuste fiscal em despesas não obrigatórias já vem sendo feito pelo governo e, portanto, reduzir gasto obrigatório, é um processo mais lento.

Vicente Nunes