Uma sucessão de fatores levou os donos do dinheiro a sair do Brasil nos dois meses. As incertezas eleitorais, que permanecem fortes, apontavam para o crescimento nas pesquisas de candidatos como Ciro Gomes (PDT) e Jair Bolsonaro (PSL). Além disso, o BC sinalizou que cortaria os juros, deixou a taxa inalterada em 6,5% ao ano, a guerra comercial entre China e Estados Unidos começava a ganhar força, houve a greve dos caminhoneiros e as perspectivas de crescimento da economia, que vinham de um processo de revisão, foram ainda mais afetadas negativamente.
Com o ambiente global conturbado e sem previsibilidade em relação à economia brasileira, os investidores adotaram uma perspectiva cautelosa. Nos últimos 12 meses encerrados em junho, a saída líquida de aplicações em fundos de investimento totalizou US$ 505 milhões e a de títulos de renda fixa chegou a US$ 695 bilhões. O saldo só é positivo quando são levados em contas os recursos investidos em ações, que totalizaram US$ 3,5 bilhões. Com isso, os investimentos em portfólio no mercado doméstico acumularam uma entrada líquida de R$ 2,3 bilhões.
Nos seis primeiros meses de 2018, entretanto, o resultado é pior e chega a uma saída total de US$ 1,1 bilhão. O temor dos investidores ainda pode ser traduzido pelo desempenho do investimento direto no país que, no primeiro semestre, chegou a US$ 29,8 bilhões. O montante é 17,5% inferior ao registrado no mesmo período do ano passado. Esse é o pior resultado para o período desde 2010. Essa retração significativa ocorre em meio aos imbróglios judiciais que têm atrasado os leilões de concessões e à falta de operações de compra e venda de ativos superiores a US$ 1 bilhão.
Conforme o chefe do Departamento de Estatísticas da autoridade Monetária, Fernando Rocha, em 2018, somente uma operação superior a US$ 1 bilhão foi registrada. No ano passado, até junho, as operações acima desse patamar totalizam US$ 7,9 bilhões. “Em termos de leilões, tivemos uma desaceleração dessas operações”, afirmou. Rocha explicou que o movimento pode ser reflexo das incertezas eleitorais e da recuperação da economia, que tendem a deixar os investidores em compasso de espera.
Perspectivas futuras
Mesmo com o ambiente incerto, em julho, as parciais do BC até o dia 24 mostram que a sinalização é de melhora. Rocha destacou que somente os ingressos líquidos de ações chegam a US$ 1,8 bilhão e de títulos de renda fixa a US$ 4,6 bilhões. A projeção para o IDP alcança US$ 2,5 bilhões. O diretor operacional da Mirae Asset, Pablo Spyer, explica que esse movimento de entrada de recursos já se refletiu na taxa de câmbio, que estava próxima de R$ 3,90 em junho e agora está mais perto de R$ 3,75.
O fluxo cambial, até 24 de julho, é positivo em US$ 4,6 bilhões, segundo o BC. Spyer ressalta que as incertezas eleitorais no Brasil, somadas à volatilidade global, levaram os investidores estrangeiros a adotar uma postura cautelosa. “Hoje, tanto o cenário externo quanto o interno têm menos neblina. Não significa que o ambiente é de calmaria, mas ainda de volatilidade. Mas a percepção é melhor em relação ao futuro do país”, diz.
Um investidor estrangeiro destaca que os movimentos políticos de curto prazo, com o enfraquecimento da candidatura de Ciro e os acordos políticos fechados por Geraldo Alckmin (PSDB) agradaram ao mercado. “Quem não conhecia o Bolsonaro se assustou em maio, com a divulgação de pesquisas que mostraram o crescimento dele. Mas depois que conheceram o seu time econômico, sobretudo o Paulo Guedes, ficaram mais tranquilos. Muitos apostam na chance real de que ele seja presidente”, comenta.
Mas se engana quem pensa que os estrangeiros estão acomodados. Muitos viram com preocupação o cortejo de Fernando Haddad (PT) a Ciro em entrevista recente. “Existe o risco de o grupo de esquerda se fortalecer se os dois fecharem uma chapa. Ainda há uma série de incertezas sobre os vice-presidentes, mesmo que esse posto seja decorativo. A certeza é de que teremos emoções nos próximos dois meses e que a necessidade de ajustes e reformas é latente para o país voltar a crescer”, alerta.