Os donos do dinheiro se prepararam muito bem para chegar a esse 24 de janeiro. Nas últimas semanas, bancos e corretoras contrataram os principais juristas do país para entender o que será o julgamento de Lula e o que resultará dele. Todos estão cientes de que será um processo longo, de muitos recursos, que mexerá com o humor de muita gente. O mais importante, na visão dos investidores, é que, até outubro, seja construída uma candidatura viável para derrotar o petista ou aquele que vier a substituí-lo na disputa caso os tribunais decidam por tirá-lo do páreo definitivamente.
Lula já teve uma ótima relação com o mercado financeiro. Em 2003, quando assumiu, pela primeira vez, a Presidência da República, seguiu regiamente a cartilha do liberalismo. Naquele ano, fez o maior superavit primário da história do Brasil, de mais de 4% do Produto Interno Bruto (PIB). O compromisso do petista com uma política fiscal rígida foi tão forte que, depois de uma breve recessão, a economia voltou a crescer com força, a inflação caiu e o Banco Central cortou os juros. Com a economia sob controle, Lula pode executar uma política social vitoriosa.
A lua de mel do petista com o mercado financeiro ultrapassou os dois mandatos dele. Os investidores deram crédito total à sucessora que ele escolheu, Dilma Rousseff. Contudo, a opção dela por romper com o consenso da responsabilidade fiscal, adotando a tal matriz econômica, enterrou as boas relações dos investidores com o PT. A partir dali, e com os sucessivos escândalos da Lava-Jato, que resultaram no processo que será julgado hoje pelo TRF-4, Lula retomou o discurso que entoou até 2002, quando divulgou a Carta ao Povo Brasileiro, se comprometendo a seguir as boas regras da gestão pública.
Dúvidas
Para Ivo Chermont, economista-chefe da gestora de recursos Quantitas, mesmo que Lula continue como candidato à Presidência, não haverá retrocessos na retomada do crescimento econômico. Ele acredita que os juros vão cair dos atuais 7% para 6,75% ao ano na reunião de fevereiro do Comitê de Política Monetária (Copom) e permanecerão neste nível ao longo do ano. Prevê que o dólar se manterá relativamente estável, com recuperação da confiança dos consumidores e do empresariado. “Não há dúvidas de que o processo envolvendo o ex-presidente Lula é complexo, mas não vejo muito impacto da decisão judicial sobre ele na economia”, afirma.
Ele ressalta que nem a total indefinição das eleições presidenciais deve interferir, de forma substancial, na disposição do empresariado de investir na ampliação de seus negócios. Chermont conta que fez um amplo levantamento sobre o ritmo dos investimentos produtivos em períodos eleitorais e não encontrou grande retração. “Peguei os dados de um ano antes, do ano das eleições e do ano seguinte e não encontrei grandes variações. O que importa é a confiança no crescimento da economia. E, hoje, o quadro é favorável. Há dinheiro de sobra nos mercados e as empresas estão com resultados melhores”, frisa.
Mas é preciso, no entender do economista, clarear o cenário em relação a 2019. Olhando apenas para o que se tem hoje, sobram incertezas. “Não se sabe se quem estiver sentado na cadeira presidencial a partir do ano que vem estará comprometido com reformas”, diz. Esse comprometimento é vital, porque os investidores estão cada vez mais convencidos de que as mudanças no sistema de aposentadorias, que o presidente Michel Temer promete votar a partir de fevereiro próximo, não sairão. Será o futuro comandante do país que terá a missão de conter o rombo no regime previdenciário e evitar o descontrole fiscal.
Brasília, 06h10min