POR ANTONIO TEMÓTEO
O mercado resolveu se calar após a histeria de maio, quando o dólar chegou próximo dos R$ 4. Naquele momento, as pressões sobre o Banco Central (BC) chegaram a tal ponto que os investidores clamaram por alta de juros e venda de reservas. Agora, o preço da moeda norte-americana acumula alta de 7,62% somente em agosto, vendida a R$ 4,036, e o mercado acha que a volatilidade é normal. Esse é o maior patamar desde 18 de fevereiro de 2016. Somente ontem, a divisa estrangeira registrou elevação de 1,97%, a quinta consecutiva.
O diretor de operações da corretora Mirae Asset, Pablo Spyer, lembra que a maior cotação nominal do dólar ao longo de um dia foi registrada em 23 de maio de 2015, quando a moeda chegou a R$ 4,26 e fechou vendida a R$ 4,17. Para ele, a variação de R$ 0,09 ao longo de um pregão não é algo surpreendente, já que, hoje, o movimento de encarecimento chegou a R$ 0,08. Ele alerta, entretanto, que o mercado nunca viu a divisa acima desse teto histórico.
O que está claro é que o Brasil pode navegar em águas desconhecidas nos próximos dias, com o aumento da volatilidade cambial. Ontem, a variação de preços estava relacionada ao processo eleitoral, sobretudo ao fato de as intenções de voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) continuarem a crescer enquanto Geraldo Alckmin (PSDB) continua patinando. O tucano aposta na possibilidade de crescimento quando a campanha televisiva começar. Até lá, pelo menos, teremos uma semana tensa.
Entre os emergentes, o real e a lira turca foram as únicas a se desvalorizar em relação ao dólar. Enquanto a moeda norte-americana acumula variação positiva de 21,71% no ano, o BC não emite qualquer sinalização de que fará intervenções cambiais. A última foi realizada em 27 de junho, com leilões de linha que totalizaram US$ 2,4 bilhões. No caso dos swaps, os estoques totalizam US$ 67,4 bilhões e a última oferta se deu em 22 de junho.
Ainda não está claro o que a autoridade monetária fará no curto prazo, mas o economista-chefe do banco UBS no Brasil, Tony Volpon, avalia que será necessária uma alta de juros após o pleito de outubro para acalmar o mercado. Ele explica que a elevação do dólar está ligada ao processo de redução da liquidez global, com subida de juros nos Estados Unidos, e às incertezas domésticas. Com isso, os investidores cobram prêmio de risco maior para manter as aplicações no país, diante da falta de clareza sobre a continuidade dos ajustes e reformas para reequilibrar as contas públicas.
A alta de juros, explica Volpon, teria três objetivos. O primeiro, para equilibrar a Selic em relação à taxa norte-americana, aos juros futuros e aos praticados pelos demais emergentes. Além disso, a medida seria tomada para combater os efeitos secundários da desvalorização do câmbio sobre a inflação e para manter a estabilidade financeira da economia. Isso pode não ocorrer, caso Alckmin decole nas pesquisas.
No mercado, as apostas são de que o BC iniciará o processo de intervenção cambial quando identificar uma “desfuncionalidade”. Entretanto, não há um manual que detalhe quando isso será feito e em que condições. O que está claro é que o preço da moeda estrangeira rompeu a barreira psicológica dos R$ 4, mas não quais serão os movimentos futuros, já que as últimas oscilações estão fortemente ligadas à divulgação de pesquisas de intenção de voto.
Vale lembrar que a frequência de publicação desses levantamentos tende a crescer significativamente nas próximas semanas, e o país sofrerá em caso de crescimento de candidatos considerados menos comprometidos com o ajuste fiscal.
Decisões
Apesar de alguns especialistas tentarem minimizar o nível de volatilidade no mercado, ao afirmar que o início da campanha eleitoral na televisão mudará o entendimento dos eleitores, as vítimas das oscilações de preços começam a aparecer. Ontem, quem mais sofreu com o movimento cambial foi a companhia aérea Gol. As ações da empresa desabaram 9,8%, porque possui dívidas atreladas ao dólar. Com as incertezas políticas, as ações das estatais também sofreram, sobretudo de Petrobras, Eletrobras e Banco do Brasil.
Outro dado que deixou o mercado em alerta foi um relatório da consultoria norte-americana Eurasia, que apontou probabilidade de 60% de Jair Bolsonaro (PSL) estar no segundo turno. O levantamento leva em conta as últimas pesquisas divulgadas pela CNT/MDA e pelo Ibope.
“No caso do PT, Lula não estará na cédula. E, com certeza, seu substituto, Haddad, continua a mostrar um desempenho tímido em pesquisas”, diz a Eurasia, citando que, na semana passada, na pesquisa semanal XP/Ipespe, Haddad tinha 7% das intenções de voto e, na do Ibope, 4%, “dentro da margem de erro da pesquisa do Ipespe”.
A Eurasia avalia ainda o baixo crescimento de Geraldo Alckmin (PSDB) e destaca que o tucano minimizou os números, que desapontaram aqueles que esperavam um impulso dele a partir das alianças partidárias firmadas em julho. “Alckmin está pronto para crescer, mas apenas quando a vantagem do tempo de TV entrar em ação na próxima semana”, afirma a consultoria.
Para os analistas da Eurasia, contudo, Marina Silva (Rede) ainda tem chances de atrair os votos estratégicos de centro. “Um rápido olhar para as rejeições dos candidatos mostra que tanto Bolsonaro quanto Lula são aqueles com os maiores passivos em um possível escoamento. Se os centristas se preocupam cada vez mais com um segundo turno polarizado entre Bolsonaro e o PT, Marina Silva, com fortes credenciais anticorrupção, é uma potencial candidata a se beneficiar”, resumem.