A dimensão tomada pela greve dos caminhoneiros escancara as fragilidades do governo para conter crises. Há pelo menos uma semana, o Palácio do Planalto foi alertado sobre o movimento preparado pela categoria, mas não deu a devida importância. Acreditou que a convocação que circulava pelas redes sociais seria pífia, repetindo o fracasso das manifestações anteriores. O governo esqueceu, porém, de levar em consideração em suas análises a disparada dos preços do diesel desde o início de maio, que começou a inviabilizar o mais importante meio de transporte de mercadorias do país.
Justamente por não dar o peso real ao movimento dos caminhoneiros, o governo se mostrou frágil desde o início das negociações. Em vez de se antecipar aos fatos e chamar os representantes da categoria para uma ampla negociação, preferiu fazer uma proposta pífia, de zerar a Cide que incide sobre o diesel, o que daria uma economia de R$ 0,05 por litro. Percebendo o governo totalmente perdido, os caminhoneiros cresceram e o resultado está aí para desespero do país: desabastecimento de combustíveis, de alimentos e de remédios, estradas bloqueadas e aeroportos e hospitais ameaçados de fecharem.
Diante da decisão da Petrobras de reduzir em 10% o preço do diesel e de congelá-lo por 15 dias, pode ser que o governo consiga a trégua pedida pelo presidente Michel Temer. Mas os estragos estão feitos. A população está em pânico, pois teve a certeza de que está desprotegida. Bastou uma ação coordenada de caminhoneiros para que se deparasse com falta de mercadorias e com especulação de preços. Não é só. A inflação, que vinha se mantendo nos menores níveis em mais de duas décadas, voltará a subir, pois absorverá toda a escassez de mercadorias. Para junho, já se fala em índice superior a 0,7%.
Tombo na credibilidade
O governo também perdeu o discurso de que a política de preços da Petrobras é intocável. Com o caos instalado no país, o presidente da empresa, Pedro Parente, teve que reunir toda a sua diretoria e fechar um acordo para a redução dos 10% no preço do diesel. Ao anunciar a medida, ele tentou reforçar que não se tratava de uma intervenção do Palácio do Planalto na estatal, mas, sim, uma contribuição ao momento turbulento pelo qual passa o país. Não convenceu. Assim que os investidores tomaram conhecimento da decisão, as ações da companhia desabaram 6% na Bolsa de Nova York.
Uma das razões para a quebra da Petrobras durante o governo de Dilma Rousseff foi o congelamento de preços dos combustíveis para tentar conter a escalada na inflação. As perdas acumuladas pela estatal passaram de US$ 40 bilhões. Parente diz que a política de reajustes diários voltará após os 15 dias de congelamento. Mas, dentro do governo, o que se diz é que esse prazo será maior. Os caminhoneiros pedem escalonamento dos ajustes dos preços para cima ou para baixo. Defendem que isso ocorra a cada três meses. Hoje, eles estão em posição muito melhor que a Petrobras para vencer a queda de braço.
Uma coisa é certa: se o governo não debelar rapidamente a crise provocada pelos caminheiros, será enterrado sem dó nem piedade. A popularidade de Temer, que é baixíssima, vai praticamente zerar. Ganhos importantes para a economia, como a inflação sob controle e os menores juros da história, serão perdidos. Se o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) caminhar rapidamente para o centro da meta, de 4,5%, o Banco Central terá que voltar a subir os juros. É o pior quadro para se chegar às eleições previstas para outubro. O Brasil, realmente, não é um país para amadores.
Brasília, 06h55min