Os alertas são claros: sem a aprovação da reforma da Previdência, o Brasil, que retomou, ainda que lentamente, o crescimento, poderá enfrentar uma nova crise econômica. Há, segundo a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, a possibilidade real de o país dar calote na dívida pública. Pelos cálculos do ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, com as mudanças no sistema de aposentadorias, o endividamento do governo se estabilizará em 81,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2021. Não havendo o apoio para os ajustes no regime previdenciário, a relação entre a dívida e o PIB saltará de 74,4%, em 2017, para 101,3% em quatro anos. Na avaliação do economista-chefe do Banco UBS, Tony Volpon, não há país emergente que consiga se manter de pé com endividamento tão elevado.
É impressionante que, mesmo com todos os indicadores apontando para uma situação de caos nas contas públicas sem a reforma da Previdência, o Judiciário se comporte como se o governo estivesse com sobras maciças de dinheiro. A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, de suspender o adiamento dos reajustes dos servidores e de impedir o aumento da alíquota previdenciária, de 11% para 14%, daqueles que ganham mais de R$ 5,5 mil explicita o corporativismo nefasto que reina nos tribunais. Também é inaceitável ver a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, acionar a Justiça para proibir as propagandas oficiais sobre a reforma da Previdência, que atacam, justamente, os privilégios que ela e os demais funcionários públicos desfrutam.
Num momento decisivo para o país, que está saindo de uma das piores recessões da história, com inflação e juros em baixa, seria de bom tom que juízes, desembargadores, ministros de tribunais e procuradores da República dessem forte contribuição para que a economia consolidasse um longo período de crescimento sustentado. Mas para que esse gesto de grandeza quando 71% dos magistrados dos Tribunais de Justiça (TJs) ganham acima do teto constitucional de R$ 33,7 mil? Dados coletados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apontam que, dos mais de 16 mil juízes e desembargadores, 11,6 mil recebem, em média, R$ 42,5 mil por mês. Isso, num país em que o salário mínimo é de R$ 937.
Desigualdades sociais
Ao manter essa postura corporativista, o Judiciário e o Ministério Público só agravam as desigualdades sociais que afligem o país. Quanto menor for o crescimento econômico, menor será a chance de as classes menos privilegiadas ascenderem socialmente. A recente recessão, que destruiu quase 8% das riquezas acumuladas, empurrou pelo menos 4 milhões de brasileiros para a pobreza. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), o Brasil foi determinante para que os níveis de pobreza e de extrema pobreza aumentassem na região em 2016, depois de mais de uma década de redução. Não há mágica. É o crescimento sustentado da economia, com inflação sob controle, o grande motor da distribuição de renda.
Portanto, se inviabilizarem o ajuste fiscal e abrirem nova crise na economia, o Judiciário e o MP terão de assumir a responsabilidade de jogar o país novamente no atoleiro. Para Zeina Latif, o ano de 2018, com avanço de 3%, já está praticamente dado, mas, quando 2019 chegar, uma avalanche de problemas poderá abortar a retomada. Na opinião de Tony Volpon, a urgência para a solução do desequilíbrio das contas públicas vai aumentar à medida que o quadro positivo do mercado externo começar a se reverter. “A janela de oportunidade que o Brasil tem para resolver seus problemas é pequena e, se não for aproveitada, voltaremos a conviver com um clima hostil que dominou 2015”, avisa.
Brasília, 06h12min