Correio Econômico: Estrangeiros deixam o Brasil

Publicado em Economia

POR ANTONIO TEMÓTEO

 

O Brasil foi do céu ao inferno em cinco meses. As expectativas de que a economia voltaria a crescer de maneira robusta, acima de 3%, levaram os investidores estrangeiros a aplicar R$ 9,5 bilhões na Bolsa de Valores de São Paulo (B3) em janeiro. A euforia tomava conta do país e o então ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, sonhava em surfar na onda de recuperação e geração de empregos. Entretanto, os resultados da indústria, do comércio, do setor de serviços e do agronegócio decepcionaram o mercado. Ficou claro que esse processo seria ainda lento e demorado.

 

Em fevereiro e abril, os estrangeiros retiraram da B3 os R$ 9,5 bilhões. Após uma normalização em abril, com entrada de R$ 4,4 bilhões, os gringos ficaram apavorados com a situação do país a partir de maio. O primeiro sinal controverso foi emitido pelo Banco Central (BC), que sinalizou que cortaria os juros em 0,25 ponto percentual, para 6,25% ao ano, mas manteve a taxa inalterada em 6,5%. O principal ruído, nesse caso, foi uma entrevista concedida pelo presidente da autoridade monetária, Ilan Goldfajn, de que faria um último corte, mesmo com a volatilidade cambial que ocorria naquele momento.

 

Ao justificar que o ambiente internacional parecia mais desafiador, Ilan deixou o mercado em polvorosa. No dia anterior à decisão, agências que coletaram estimativas no mercado eram quase unânimes em estimar um corte de juros. De 38 instituições consultadas, apenas uma sugeria manutenção. O erro de comunicação levou a uma escalada significativa do dólar, que foi negociado próximo de R$ 4. Para piorar a situação, o governo federal ignorou os sinais de que caminhoneiros fariam paralisação do transporte de cargas, que culminou em uma crise de desabastecimento no país. Somente em maio, os estrangeiros retiraram do país R$ 8,4 bilhões e, no mês seguinte, outros R$ 5,9 bilhões.

 

O nível de volatilidade levou o BC a elevar estoque de swaps cambiais até US$ 67,4 bilhões e fazer leilões de linha. Após o stress, investidores voltaram ao Brasil em julho com R$ 3,7 bilhões e até 15 de agosto, a entrada líquida de recursos era de R$ 527,1 milhões. Apesar disso, os estrangeiros já retiraram do Brasil R$ 5,6 bilhões no acumulado do ano. Ontem, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) registrou a terceira queda consecutiva e passou a acumular um resultado negativo de 0,49% entre janeiro e agosto.

 

Com isso, a participação de estrangeiros na B3 encolheu para 46,7% em agosto, o menor patamar desde dezembro de 2017. Os estrangeiros estão preocupados com o futuro do país. Muitos deles apostam que Jair Bolsonaro (PSL) será eleito presidente da República, mas sem a certeza preferem esperar o cenário ficar mais claro. Apesar da postura radical, muitos avaliam que ele deve adotar uma agenda econômica austera para que o país volte a gerar emprego e renda.

 

Entretanto, não tem a clareza de que o “casamento” com o economista Paulo Guedes será duradouro. “Muita gente saiu do Brasil nos últimos momentos de stress ao longo do ano. Neste momento, é preciso ter sangue frio para continuar. Uma parte significativa dos investidores brasileiros ainda aposta na polarização do PT e do PSDB. Eu acho que o nível de insatisfação é enorme e podemos ter surpresas. Mesmo os especialistas no assunto estão temerosos diante da imprevisibilidade das eleições e das chances de Bolsonaro ser eleito”, disse um investidor gringo.

 

Apostas

 

As apostas sobre quem será o próximo presidente da República têm sido acompanhadas de grandes incertezas. A primeira delas é se a esquerda terá um candidato do segundo turno, com o apoio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Não está claro se ele terá condições de transferir votos como ocorreu em 2010 e 2014, quando elegeu Dilma Rousseff presidente da República, e em 2012, quando fez Fernando Haddad, seu possível substituto, prefeito de São Paulo.

 

Além das dúvidas sobre o capital político de Lula, não está claro como será o desempenho de Marina Silva (Rede), hoje uma candidata de centro, mas com fortes ligações com a esquerda, e de Ciro Gomes (PDT). Os dois já foram testados nas urnas, mas com desempenhos distintos e sem sinalizar se mantêm força perante os eleitores. Do outro lado, Geraldo Alckmin (PSDB) é assombrado pela investigação das obras do Rodoanel, mas é o queridinho do mercado. Boatos de que delações contra ele serão homologadas ou de que denúncias serão apresentadas à Justiça têm afetado os preços dos ativos nas últimas semanas.

 

Outras incógnitas são os papéis de candidatos como João Amoedo (Novo), Henrique Meirelles (MDB), Cabo Daciolo (Patriota) e Álvaro Dias (Podemos), além do papel das redes sociais nas eleições. Há quem diga que os 20% de intenções de votos de Bolsonaro o colocarão no segundo turno, sem saber quem será o adversário.

 

Todas as incertezas estão postas na mesa e ninguém se arrisca a fazer previsões. Os temas em que há alguma unanimidade são a necessidade de reformas e ajustes para reequilibrar as contas públicas, a melhora dos gastos públicos com educação e a necessidade de o país voltar a crescer, receber investimentos para gerar emprego e renda. O Brasil será administrado a partir de janeiro de 2019 por um presidente que já possui o diagnóstico completo sobre todos os problemas do país.

 

Não está claro se ele atacará essas necessidades, reduzirá privilégios, combaterá a corrupção e corporações que se apoderaram do orçamento público ou recorrerá ao velho populismo que levou o país para o buraco.