Correio Econômico: Eleições pegando fogo e inflação em queda

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Em meio à corrida eleitoral, que entrou com tudo no radar dos investidores, o Banco Central terá boas notícias em relação à inflação. A perspectiva é de que, depois do susto com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de junho, que atingiu 1,26%, o custo de vida leve um tombo. São grandes as chances de, em agosto, o IPCA ser negativo. Ou seja, o país voltará a registrar deflação. A aposta de Carlos Thadeu Filho, economista sênior do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), é de que a inflação tenha queda de 0,10%.

Diante de tal perspectiva, o mercado praticamente enterrou as apostas de aumento da taxa básica de juros (Selic) nas reuniões de 31 de julho e 1º de agosto do Comitê de Política Monetária (Copom). Quando o IPCA deu o salto de junho, efeito da greve dos caminhoneiros, os investidores passaram a acreditar que o BC anteciparia o movimento de alta da Selic, sobretudo pelo fato de o dólar apontar para os R$ 4 ante o estresse provocado pelas incertezas eleitorais. Agora, o consenso é de que o aperto monetário só virá no próximo governo. Mesmo assim, depois de a economia mostrar alguma reação.

Segundo Thadeu, a inflação de agosto, normalmente, é baixa. Mas, neste ano, vai devolver a forte alta provocada pela paralisação dos transportadores de cargas. Assim como houve exageros em junho, com remarcações injustificáveis, haverá queda mais forte com a normalização do abastecimento. “Os preços voltarão à normalidade”, diz. Além disso, espera-se recuo nos preços de frutas, verduras e legumes, cujas colheitas são favorecidas pelo clima mais seco e ameno. A inflação também será impactada pela liquidação de artigos de vestuário.

Alckmin e o Centrão

O economista acredita que, de alguma forma, os rumos da eleição poderão ajudar o BC no controle da inflação, reduzindo, inclusive, a pressão sobre os preços em 2019. Isso já pôde ser visto nos dois últimos dias, quando as cotações do dólar desabaram depois da aliança de Geraldo Alckmin (PSDB) com os partidos do Centrão (DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade). O tucano está mal nas pesquisas de intenção de votos, oscilando entre 6% e 8% da preferência do eleitorado. Com a aliança, passará a ter o maior tempo de tevê entre todos os candidatos durante a campanha.

Para os investidores, Alckmin, finalmente, ficou mais competitivo. O tucano veste o figurino ideal do mercado. Prega reformas constitucionais, sobretudo a da Previdência Social, promete ajustar as contas públicas e enxugar o tamanho do Estado por meio da privatização. Resta saber se os eleitores responderão aos anseios dos donos do dinheiro. Uma coisa é o apoio do Centrão, que dá musculatura à campanha do tucano; outra, é o eleitorado fechar questão em torno de um candidato que se uniu aos partidos mais corruptos e que vão continuar loteando o governo para tirar todo proveito possível.

Nesse primeiro momento, dizem os investidores, há motivos para comemorar. O acordo entre Alckmin e o Centrão afastou o fantasma de Ciro Gomes (PDT) ir para o segundo turno. Havia a percepção no mercado de que, com mais tempo de tevê e fortes palanques estaduais, o pedetista deslancharia nas pesquisas, chegando à reta final da campanha com chances de vitória. Agora, Ciro terá um tempo minguado de tevê para apresentar seus projetos de governo e pequenas bases estaduais para atrair os eleitores. Mesmo que feche com o PSB, acreditam os agentes econômicos, Ciro ficou menor.

Incertezas no horizonte

Esse otimismo do mercado não quer dizer que o país terá uma travessia tranquila até o resultado das urnas. Há muitas incertezas no horizonte. Mesmo com Alckmin fortalecido pelo acordo com o Centrão, não é possível cravar quem irá para a disputa final. O deputado Jair Bolsonaro (PSL) não conseguiu fechar alianças, terá tempo mínimo na propaganda de tevê, contudo, é fortíssimo nas redes sociais. As pesquisas mostram o capitão da reserva do Exército consolidado no primeiro lugar. Será que, quando a campanha efetivamente começar, o apoio a ele vai derreter? É difícil prever.

Com Lula preso, o PT deve lançar Fernando Haddad para a disputa pelo Palácio do Planalto. Pesquisas informais mostram que, identificado como o candidato do ex-presidente, ele já larga com pelo menos 11% dos votos. Haddad é um dos quadros menos radicais do PT. Tem grandes chances de ir para o segundo turno. A pergunta que todos se fazem é se Haddad pregará um rompimento com tudo o que está aí ou apresentará um programa que tenha compromisso com a austeridade fiscal. Está claro que os petistas estão com sangue nos olhos e querem voltar ao governo para se vingarem dos “golpistas”. Mas uma coisa é a campanha, outra, tocar um país.

Portanto, o melhor será viver um dia de cada vez. Vamos comemorar as boas notícias, como a queda da inflação, mas manter a lucidez para cobrar os candidatos para que, em vez de acusações baratas, apresentem projetos para o país. Junho mostrou que, depois de um bom período para o emprego formal, o mercado voltou a fechar vagas. É um péssimo sinal para os mais de 13 milhões de desempregados. Essas pessoas querem esperança, não falsas promessas. Nesta altura do campeonato, o Brasil não precisa de um salvador da pátria. Necessita, sim, de um governante ético, compromissado com o povo.

Brasília, 00h01min

Vicente Nunes