Correio Econômico: Coração partido pelo Rio

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Meu amor pelo Rio de Janeiro é incondicional. Escolhi a cidade para viver ainda no final da minha adolescência. Ali, fiz amigos que vou carregar no peito por toda a vida. É triste demais ver a cidade mais linda do mundo mergulhada no caos, dominada pela violência e pela corrupção. É doído dizer que não havia outra saída para o Rio a não ser a intervenção federal decretada pelo presidente Michel Temer. O crime organizado — aí incluídos os políticos — passou de todos os limites.

A degradação do Rio foi ocorrendo sem que ninguém tomasse as medidas necessárias para contê-la. Governo após governo, o estado e, sobretudo, a capital afundavam tanto do ponto de vista econômico quanto do ético e da segurança pública. O crime organizado se infiltrou tão profundamente na máquina governamental, que já não se pode dizer onde começava o governo eleito pelo povo e onde acabava o Estado paralelo. Não por acaso, três ex-governadores foram parar atrás das grades.

É difícil dizer se a intervenção federal dará certo, tamanho o atoleiro no qual o Rio se meteu. Pode-se afirmar, porém, que o governador Luiz Fernando Pezão não tem a menor condição de continuar no cargo. Na verdade, ele nunca deveria ter assumido o comando do estado. Além de incompetente, é suspeito de corrupção. Pezão só conseguiu chegar aonde chegou graças aos bilhões despejados no Rio pelas administrações dos petistas Lula e Dilma Rousseff e à farsa montada por Sérgio Cabral, o ex-governador que está preso por ter comandado uma quadrilha que saqueou os cofres públicos.

Terra de ninguém

A entrega da segurança pública do Rio às Forças Armadas deveria ter ocorrido muito antes. Mas pesaram os interesses políticos. Michel Temer não quis comprar briga com os partidos aliados, em especial, o MDB, do qual faz parte. O partido liderou a roubalheira que transformou o estado em terra de ninguém. A partir do momento em que se constatou a falência econômica do Rio, com atraso generalizado no pagamento de servidores e aposentados, o Palácio do Planalto poderia ter decretado a intervenção. Mas usou como desculpa para fechar os olhos a necessidade de aprovação da reforma da Previdência, que ainda não passou e dificilmente passará pelo crivo do Congresso.

A derrocada financeira do Rio fez a situação degringolar de vez. A violência, que já era absurda, ganhou proporções gigantescas. E não se restringiu à capital do estado, comandada por outro incompetente, o bispo Marcelo Crivella. Infelizmente, o Planalto só resolveu agir agora porque o crime chegou com tudo à Zona Sul. Quem vive nas áreas menos abastadas da cidade que já foi maravilhosa tem sido massacrado pelo crime há muito tempo. Chegou-se ao ponto de os bandidos roubarem bolsas de compras de senhoras nas saídas dos supermercados.

Não é só. A população passou a ver policiais como bandidos. É comum ouvir nas ruas da cidade do Rio muitas pessoas do bem dizerem que têm mais medo daqueles que deveriam protegê-las do que de marginais. A corrupção não se restringe aos policias de baixo clero. Está, principalmente, nos altos escalões das polícias. Essa estrutura corrompida se tornou tão poderosa que nenhum governante ousou enfrentá-la. O resultado disso foi a explosão de violência que ceifa milhares de vidas todos os anos e torna a sociedade refém, o que é inadmissível.

Outubro é ali

É duro dizer, mas o Rio está podre. Ainda que a intervenção federal surta efeito, o estado levará anos para ser reconstruído. Será preciso limpar a corrupção que domina a área de segurança, reordenar as finanças e reconquistar a confiança da população. Os cidadãos do Rio estão céticos, cansados de promessas. Há anos vêm ouvindo que o Rio daria a volta por cima. Isso nunca aconteceu. O curto período em que a sensação de segurança deu as caras foi pura ficção.

Mas que fique claro: a população também terá papel preponderante nesse processo de limpeza e reconstrução do Rio. Terá que votar melhor. Não é possível que os cidadãos fluminenses continuem votando em Sérgio Cabral, em Garotinho, em Rosinha, em Pezão, em Benedita da Silva, em Eduardo Cunha, em Jorge Picciani, em Roberto Jefferson, em Cristiane Brasil, em Marcello Crivella. Diz um ditado que cada povo tem o governo que merece. Já passou da hora de o Rio mostrar que quer o melhor. Pode não parecer, mas outubro está quase ali.

Brasília, 06h54min

Vicente Nunes