Correio Econômico: Até que ponto a alta do dólar afeta o Brasil

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O Palácio do Planalto está acompanhando com bastante atenção o movimento de valorização do dólar. A disparada da moeda norte-americana está ocorrendo às vésperas de o governo liberar uma ampla campanha publicitária para ressaltar os feitos econômicos da gestão de Michel Temer. Dólar alto costuma azedar o humor da classe média e ocupar amplo espaço na mídia. Não combina, portanto, com uma mensagem de que tudo vai bem na economia.

Por enquanto, dizem assessores de Temer, a arrancada da moeda norte-americana está dentro do que se pode chamar de ajuste de mercado. Tanto que o presidente dá como certo mais um corte na taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central em 16 de maio. A expectativa é de que a Selic baixe 0,25 ponto percentual, para 6,25% ao ano. Na visão do Planalto, mesmo que a recente alta do dólar provoque impacto negativo na inflação, ainda se prevê um custo de vida inferior a 4% em 2018.

Nos cálculos de técnicos da equipe econômica, o dólar só fará a inflação se mexer para cima com maior vigor se as cotações superarem os R$ 3,70. Por enquanto, não há nada que justifique uma valorização tão forte. Para eles, o temor de uma alta mais expressiva dos juros nos Estados Unidos, o que reduzirá o fluxo de recursos para países emergentes, e as incertezas em relação às eleições presidenciais no país já foram incorporadas, em boa parte, pelos preços da divisa dos EUA.

Arsenal do BC

Temer acredita que o BC tem condições de sobra para manter os preços do dólar sob controle. A autoridade monetária, por sinal, fez a primeira intervenção no câmbio em pelo menos um ano, ao ofertar contratos de swap, nos quais aposta na queda do dólar. Mesmo com toda a volatilidade do mercado, conseguiu frear o processo de valorização da moeda, que encerrou a quinta-feira cotada a R$ 3,53, com baixa de 0,56%. Isso, mesmo num dia de forte nervosismo no exterior.

A determinação dentro do governo é de ressaltar o poderio do BC e, claro, os pontos positivos da alta do dólar, o mais visível deles, o aumento das exportações. Como a atividade interna está perdendo fôlego, o Planalto crê que as vendas maiores para o exterior podem estimular a produção industrial, que teve um primeiro trimestre muito mais fraco do que o projetado. Não à toa, os economistas estão reduzindo, semanalmente, as projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).

“Nem tudo é notícia ruim em relação ao dólar. Se a alta da moeda prejudica a inflação, também impulsiona as exportações. Isso trará mais dólares para o país, o que pode compensar parte da redução dos fluxos de investimentos caso o aumento dos juros nos Estados Unidos seja mais forte”, explica um técnico do governo. “Portanto, não há motivo para nervosismo. Não veremos a inflação ir além de 4% neste ano, e os juros vão cair um pouquinho mais”, acrescenta.

Horizonte turvo

Na opinião dos analistas, é compreensível o discurso mais otimista do governo. Contudo, é preciso manter os pés no chão. A inflação baixa e os juros em queda são reflexos de um crescimento fraco no Brasil e de um quadro positivo no mundo, que vem crescendo mais do que o esperado. Mas há muitas incertezas no horizonte.

No Brasil, as eleições estão totalmente em aberto, com risco de um candidato sem compromisso com reformas sair vencedor das urnas. No exterior, juros maiores nos EUA vão mudar o fluxo de recursos que irrigam os países emergentes e há o fantasma de uma onda protecionista puxada pelo governo norte-americano. Não dá para desprezar esses fatores.

Brasília, 06h32min

Vicente Nunes