CORDA NO PESCOÇO

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O governo tentou ontem passar tranquilidade em relação ao rebaixamento da Petrobras pela agência de classificação de risco Moody’s, mas um clima de forte preocupação dominou a Esplanada dos Ministérios. Por mais confiante que tenha sido o discurso de autoridades de que não há risco de o Brasil também perder o grau de investimento, a equipe econômica passou a ver como real tal possibilidade, sobretudo se o Congresso não encapar, rapidamente, as propostas de ajuste fiscal apresentadas pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.

Entre auxiliares do ministro, a visão é de que o Brasil gastou todo o capital de que dispunha para manter a chancela de bom pagador, tamanho é o estrago cometido nas contas públicas nos últimos quatro anos. Para eles, a decisão da Moody’s em relação à Petrobras veio em momento oportuno, pois ainda não há um consenso, nem no governo nem entre os parlamentares da base da aliada, de que a arrumação das finanças federais é vital para manter o mercado internacional de crédito aberto ao país.

“Agora, não há escapatória. A faca está no nosso pescoço. Ou o governo banca de verdade o ajuste fiscal, ou a perda do grau de investimento virá ainda neste primeiro semestre do ano”, diz um técnico respeitado da Esplanada. No entender dele, não há mais espaço para tergiversações ou discursos vazios, diante da má fama que o país criou ao recorrer a truques contábeis para fabricar superavits primários.

Apesar da preocupação dos técnicos, a presidente Dilma Rousseff não se furtou em vestir a fantasia eleitoral para falar do rebaixamento da petroleira e jogar a culpa sobre a Moddy’s. “Eu acho que é uma falta de conhecimento do que está acontecendo na Petrobras”, disse. Foi, como se tornou rotina, uma afronta ao distinto público. A realidade da estatal é dramática. Não há marqueteiro que esconda isso.

Levantamento do economista Mansueto Almeida mostra como a maior empresa da América Latina, a mais inovadora das companhias brasileiras, foi destruída pela incompetência e pela corrupção. Em 2006, antes da descoberta do pré-sal, o endividamento da Petrobras era de R$ 46,6 bilhões. No balanço não auditado do terceiro trimestre de 2014, as dívidas somavam R$ 331,7 bilhões. Com isso, o total de débitos saltou, na mesma base de comparação, de 48% para 98% do valor patrimonial.

Nesse período, como constatou a Polícia Federal, a Petrobras foi assaltada, sem constrangimento, pelo PT e pelos partidos da base aliada. A empresa fez negócios desastrosos e superfaturou obras para bancar um esquema de poder que diz proteger os pobres e os oprimidos. O nível de corrupção chegou a um ponto em que a principal companhia de capital aberto do país teve o balanço recusado por uma empresa de auditoria e responde a processos nos Estados Unidos e na Europa.

Não faltam, portanto, justificativas para a Petrobras ter passado da condição de empresa respeitável para a situação de lixo (junk). O que a Moody’s definiu foi o reflexo da destruição de um patrimônio inquestionável do país, que passou a ser usado pelos partidos que dão sustentação ao governo como se fosse propriedade particular. É possível que outras agências de risco, entre elas a Fitch, venham a rebaixar a petroleira e, por tabela, o Brasil.

Se isso acontecer, a tendência é de que Dilma venha com o mesmo discurso: as agências não conhecem o país. Pois não custa explicitar a ela o Brasil que resultou dos últimos quatro anos. A inflação está em 7,3% no acumulado de 12 meses, muito acima da meta de 4,5% que o governo prometeu entregar à população. O Produto Interno Bruto (PIB) pode ter caído em 2014 e deve recuar em 2015. A dívida bruta do setor público está encostando nos 65% do PIB. O rombo nas contas federais chega a 7% do Produto e o buraco nas contas externas, a 4,2%. Com esse histórico, pode ser que nem a boa vontade de Joaquim Levy em arrumar a casa dê resultado. E não foi por falta de aviso.

Inflação resistente

» Economistas de peso fizeram as contas e garantem que, mesmo com a taxa básica de juros (Selic) chegando a 13% ao ano em abril, o Banco Central não conseguirá levar a inflação para o centro da meta, de 4,5%, até o fim de 2016.

Serviços bem caros

» Para os especialistas, a recessão na qual o país mergulhou levará o desemprego a 6,5% neste ano, mas o aumento das demissões não será suficiente para derrubar, com força, os preços dos serviços, que se mantêm persistentemente acima de 8% ao ano.

Luz não dará trégua

» O ceticismo do mercado em relação aos rumos da inflação passa pelos preços administrados. Independentemente dos pesados reajustes neste ano, é possível que a energia elétrica suba até 20% em 2016, mantendo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) bem longe da meta.

Carta de Tombini

» Para gente graúda de bancos nacionais, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, pode começar a rascunhar a carta que será obrigado a divulgar à Nação por não ter mantido o custo de vida no limite de tolerância, de 6,5%, em 2015.

Comoção na Fazenda

» Causou comoção no Ministério da Fazenda o vídeo no qual Guido Mantega é insultado em um hospital de São Paulo. Pessoas que conviveram com ele nos últimos oito anos garantem que o ex-ministro não merecia tamanha falta de respeito. “Ele sempre foi um gentleman”, diz uma secretária.

Brasília, 12h55min

Vicente Nunes