Com saída de Waldery, resta metade da equipe econômica de transição

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ROSANA HESSEL

A  saída definitiva do ex-secretário especial da Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, foi oficializada nesta semana, com a publicação da exoneração do economista no Diário Oficial da União (DOU) de ontem, a pedido. A portaria da Casa Civil foi assinada pelo novo chefe da pasta, Ciro Nogueira e marca o enxugamento da equipe econômica de transição pela metade.

Servidor de carreira, Waldery integrou o grupo de transição original do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), criado após o resultado das eleições  de  outubro de 2018. Dos 27 nomes publicados no DOU para preparar a troca de governo, oito integrantes, incluindo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, eram responsáveis pela formação do novo superministério da Economia. Essa equipe logo passou a ter 11 integrantes com a chegada do empresário Salim Mattar, de Pedro Guimarães, presidente da Caixa Econômica Federal, e de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central.

Agora, desses 11, restam no governo cinco integrantes além de Paulo Guedes: Guimarães, Campos Neto, Adolfo Sachsida (secretário de Política Econômica, Carlos Von Doellinger (presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea), Carlos da Costa (secretário especial de Produtividade, Emprego e Competitividade – Sepec). Outros nomes foram adicionados ao grupo, mas, de acordo com o ex-secretário especial de Fazenda, essa foi a composição original que começou a trabalhar na unificação das cinco pastas que integravam o superministério: Fazenda, Planejamento, Trabalho, Previdência e Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic). Contudo, se considerarmos os oito da equipe econômica na lista original de transição, além de Guedes, restaram apenas três: Von Doellinger, Sachsida e Carlos da Costa, ou seja, a metade dos oito pioneiros da equipe econômica de Bolsonaro. Logo o sinal é claro do encolhimento do superministério que perdeu duas pastas estratégicas e com maior orçamento: Trabalho e Previdência, agora ministério recriado sob a batuta de Onyx Lorenzoni, que deverá deixar o governo em abril para concorrer ao governo do Rio Grande do Sul.

Waldery disse que participou de vários governos desde sua entrada no Ipea, em 1996, e integrava o governo Michel Temer, onde trabalhou com o economista Marcos Mendes na construção da emenda do teto de gastos. Depois, foi convidado por Sachsida para integrar a equipe de transição. Ele contou ao Blog que sua saída ocorreu por motivos pessoais, mas  reconheceu que as pressões políticas estavam aumentando desde as negociações do Orçamento de 2021. “A Fazenda sempre foi a área que tinha que falar não para tudo, mas eu sempre procurei me preservar com argumentos técnicos”, justificou.  Agora, o objetivo do economista de 54 anos é cumprir a quarentena de seis meses e analisar algumas propostas para ir para a iniciativa privada a partir de janeiro, por dois anos. “Depois, quero voltar para o governo onde pretendo me aposentar”, disse Waldery, que é servidor concursado do Senado Federal.

Polêmicas e cartão vermelho

A situação de Waldery no governo ficou complicada desde setembro do ano passado, em meio às negociações do Orçamento de 2021 e culminou com a polêmica do custeio do Renda Brasil, programa de assistência social que estava sendo criado pela equipe econômica, a saída do economista era considerada uma questão de tempo entre integrantes da pasta.

A celeuma formou-se em torno das alternativas de fontes de financiamento a desindexação de benefícios sociais e o fim do abono salarial, que, ao serem citadas por Waldery, segundo ele, após uma entrevista que ele deu ao portal G1 e ao jornal Valor Econômico, que havia sido agenda pela assessoria da pasta. Na ocasião, a reação do presidente foi imediata e ele chegou a dar a declaração de que “não iria tirar dos pobres para dar aos paupérrimos” e acabou dando o cartão vermelho ao secretário, de acordo com notícias da época.  “Havia uma lista de 30 medidas e seus impactos e a equipe econômica escolheu sete, que incluía essas duas. Essa lista não é personalista. Ela foi criada pela equipe econômica, em um trabalho conjunto”, disse.

Guedes conseguiu esfriar o clima de tensão com Bolsonaro e manteve o fiel escudeiro na equipe, que, em dezembro de 2020 pediu para sair até junho de 2021. Waldery sugeriu como substituto o nome de Bruno Funchal, que foi convidado por ele para o governo e que estava na secretaria do Tesouro Nacional. “A ideia era fazer um processo de transição tranquilo com o ocorrido com o antecessor de Funchal, Mansueto Almeida” afirmou. Mas, segundo ele, em abril, diante do novo boato de que seria demitido de novo em meio à votação do Orçamento de 2021, ele se reuniu com Guedes e decidiram antecipar o anúncio das mudanças.

Apesar de Waldery dizer que deixou o governo por questões pessoais, ele foi protagonista de um forte processo de desgaste, pois caiu sobre os ombros dele a responsabilidade das medidas impopulares para o Renda Brasil. Ele contou que recebia parlamentares para falar de assuntos técnicos relacionados ao Orçamento ou participava de audiências públicas no Congresso quando o ministro não podia ir. Mesmo assim era criticado pelos parlamentares, algo que ele disse ocorrer porque tem perfil dele muito reservado e não gosta de discutir assuntos políticos. Como sob seu comando estava o Tesouro Nacional, e portanto, quem tinha a chave do cofre da União, era ele quem acabava tendo que dizer não para as investidas de aumento de gastos da ala política do governo.

O economista deixou a secretaria especial de Fazenda, em maio, e aproveitou para tirar dois meses de férias vencidas e, quando voltou, comunicou a Paulo Guedes decisão de sair do governo, pois, segundo ele, o ministro queria mantê-lo como assessor especial, cargo que ocupava até a exoneração. “Foi minha decisão deixar o Poder Executivo após cinco anos e voltar às minhas atribuições no Senado por questões pessoais”, frisou.

Quadro fiscal

Em relação ao quadro fiscal, o ex-secretário reconheceu que ele continua preocupante e que a inflação é o principal fator responsável da melhora das contas públicas neste ano em relação ao ano passado — quando o rombo das contas públicas disparou para 10% do Produto Interno Bruto (PIB) devido ao aumento de gastos emergenciais no combate à pandemia. Ele lembrou que, além de aumentar o deflator do PIB nominal em 15%, ajudando a reduzir drasticamente a dívida pública bruta para algo perto de 82% do PIB pelas projeções atuais do Tesouro, a inflação tem ajudado a aumentar  a receita com tributos do governo federal por meio do aumento dos preços. “Há um componente importante da inflação nesses dados, mas há uma reação de diversos setores da indústria, do comércio e de serviços que também que ajudou na arrecadação. Existe o aspecto de preços, que é muito forte. Mas tem efeito quantidade também”,  disse.

Na avaliação de Waldery essas discussões em torno do Orçamento e da questão fiscal devem continuar acaloradas neste ano e no próximo, e o clima deverá ser mais tenso, porque há mais interferências políticas na segunda metade de qualquer mandato. “Pelo menos, o governo conseguiu aprovar a reforma da Previdência em 2019, que é o maior gasto primário do governo. Foi uma felicidade enorme ter conseguido  aprovar antes da pandemia, caso contrário, a situação fiscal hoje seria muito pior”, afirmou.

Vicente Nunes