ROSANA HESSEL
Um ano após o início da pandemia da covid-19, com cerca de três milhões de mortos no mundo e um número diário de mortes diárias girando em torno de 500 mil, os estragos na economia e na vidas das pessoas é enorme, apesar de muitos governos terem desembolsado US$ 16 trilhões em pacotes fiscais, de acordo com dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), que aponta no relatório Monitor Fiscal, divulgado nesta quarta-feira (07/04), esses gastos impediram uma contração mais severa nas economias e maiores perdas de emprego, mas elevou o endividamento dos governos para níveis “sem precedentes”.
Pelas estimativas do Fundo, a dívida pública bruta média mundial atingiu 97% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2020, e é projetada pelo Fundo para se estabilizar no patamar de 99% do PIB a partir de 2021 até 2026, pelo menos. A média da dívida pública bruta de países emergentes deverá passar de 54% do PIB , em 2019, para 65% do PIB, em 2021.
No caso do Brasil, a dívida pública bruta deverá recuar de 98,9%, em 2020, para 98,4%, neste ano, e voltará a subir nos anos seguintes. As projeções da instituição indicam que, em 2023, esse indicador do endividamento do governo brasileiro passará para 100,1% do PIB, em 2023, e continuará crescendo gradualmente nos anos seguintes, chegando a 101,7% do PIB, em 2026. Os cálculos do FMI para a dívida pública bruta são diferentes dos utilizados pelo Banco Central (que indicou a dívida bruta em 89,3% do PIB, em 2020), pois inclui os títulos do Tesouro Nacional na carteira do BC.
Pelas estimativas do Fundo, a dívida pública bruta das economias avançadas deve atingir o pico de 122,5% em 2022, com Japão e Itália alçando os picos de 265,5% do PIB e 157,1% do PIB, neste ano. Os Estados Unidos, com taxa de 132,8% do PIB prevista para este ano, ainda terão uma dívida pública crescente, pelo menos, até 2026, quando deverá chegar a 134,5% do PIB.
De acordo com o estudo, os deficits nominais médios como proporção do PIB em 2020 chegaram a 11,7% nas economias avançadas, 9,8% para países emergentes economias de mercado e 5,5% para baixa renda. No caso do Brasil esse indicador que reflete a necessidade de endividamento do país, ficou em 13,4% do PIB, em 2020, pelos cálculos do FMI. O dado ficou levemente abaixo do divulgado pelo Banco Central para o ano passado, de 13,7% do PIB.
Com isso, o Brasil registrou um deficit nominal acima das médias de países desenvolvidos e emergentes. O Fundo citou no estudo que os gastos ampliados do governo brasileiro foram direcionados para programas de ampliação da rede de segurança social e de preservação de empregos. Contudo, destacou que, com o fim do Orçamento de Guerra, “houve um aperto considerável das despesas primárias”.
Riscos abundantes
Diante da piora generalizada no quadro fiscal global, o Fundo informou que os riscos são “abundantes” em ambos os lados. No lado positivo, um ritmo mais acelerado da vacinação nos países desenvolvidos e emergentes será fundamental para acabar com a pandemia e, assim, aumentando a arrecadação dos governos. No lado negativo, os riscos incluem mais retração econômica prolongada, aperto abrupto de condições de financiamento em meio a alto endividamento, ou materialização de passivos contingentes de medidas de suporte de liquidez, oscilações voláteis nos preços de commodities e aumento descontentamento social. “Os riscos estão interligados e reforçam um outro”, frisou.
“Atrasos na implantação da vacina e menor eficácia da vacina contra novas variantes de o vírus pode diminuir as esperanças de uma saída rápida de a pandemia e aumentar a escala de longo prazo cicatrizes”, informou o Fundo.
O FMI destacou que quase 40% apoio fiscal global constitui medidas governamentais de apoio à liquidez por meio de fornecimento de empréstimos ou garantias, injeções de capital, e outras formas de operações parafiscais, incluindo por meio de empresas públicas, que “podem causar passivos contingentes materializar isso poderia enfraquecer os balanços do governo”. O organismo lembrou que a volatilidade nos preços das commodities pode piorar a aparência da receita, “apresentando desafios para orçamentos já esticados em países exportadores de commodities”.
Além disso, o órgão ressaltou que o descontentamento social também não pode ser ignorado, pois as tensões sociais podem explodir com a pandemia ou com uma resposta política inadequada — incluindo acesso desigual a vacinas — o que poderá levar a mais mortes ou dificuldades socioeconômicas (desemprego, pobreza, desnutrição, desigualdade, escassez de alimentos, ou aumentos de preços) e agravar as raízes profundas descontentamento. “Esses fatores podem enfraquecer a confiança na eficácia das políticas dos governos e colocar as finanças públicas em risco”, afirmou.
Em comentário sobre o estudo, Vitor Gaspar, diretor do Departamento de Assuntos Fiscais do FMI, reconheceu que as ações fiscais habilitaram os sistemas de saúde e forneceram linhas de vida de emergência para famílias e empresas e “também mitigou a contração na atividade econômica”. “Na verdade, o crescimento econômico surpreendeu, no lado positivo com o desenrolar de 2020 e as previsões de crescimento para 2021 também foram revisados”, destacou. O técnico identificou “ganhos potenciais superiores a US$ 1 trilhão nas economias avançadas” e que podem ser potencializados com uma vacinação global como um projeto público organizado.
Na avaliação do Fundo, para todos os países, o quadro fiscal de médio prazo é “confiável”, porque a maioria dos países está ancorada em objetivos fiscais e de receita revisados, o que “pode aumentar a confiança e reduzir as vulnerabilidades”. Ontem, por exemplo, o FMI melhorou as projeções de crescimento da economia global de 5,5% para 6%, em parte, impulsionada pelo novo pacote fiscal dos Estados Unidos, de US$ 1,9 trilhão.
Contudo, esse crescimento global maior que poderá ajudar na arrecadação dos governos está totalmente condicionado ao sucesso da vacinação em massa. Segundo o órgão, se houver um aumento mais expressivo de infecções e isso restringir ainda mais a mobilidade e a atividade, poderá haver impacto nas projeções de crescimento de 0,5 a 1,0 ponto percentual menor em 2021 e em 2022.