Ao anunciar as novas metas fiscais para este ano e para 2018, de deficits de até R$ 159 bilhões, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, fez questão de frisar, várias vezes, que os rombos maiores vinham acompanhados de um esforço enorme do governo para manter as contas públicas sob controle. O chefe da equipe econômica tentou mostrar que, apesar de toda a pressão política para manter as torneiras dos gastos abertas, havia prevalecido o bom senso e um compromisso real de enxugar a máquina pública por meio de cortes de salários e de benefícios de servidores.
Não há dúvidas que Meirelles e o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, conseguiram evitar os excessos vindos da base aliada do governo. Mas é preciso registrar: não há ajuste fiscal efetivo. O que a equipe econômica está tentando fazer é estancar a sangria apostando que, mais à frente, o aumento de receitas, mesmo que por meio da elevação de impostos, fará o dever de casa. A situação é tão dramática que o chefe da Fazenda estava contando com receitas da inflação para reduzir o buraco nas contas. Como o custo de vida caiu, o Tesouro deixará de arrecadar R$ 19 bilhões neste ano e R$ 23 bilhões em 2018. Só mesmo o descontrole fiscal explica tal dependência.
Pelos dados apresentados pela equipe econômica, o Brasil registrará pelo menos sete anos seguidos de deficit nas contas públicas, de 2014 a 2020. No total, o rombo acumulado nesse período será de R$ 813,7 bilhões. É uma monstruosidade. Supondo que as frustrações de receitas podem se repetir nos próximos anos, o buraco poderá ser maior e se estender para além de 2021. Não há economia séria que resista por tanto tempo com as finanças em frangalhos. O resultado será a explosão do endividamento público, que, já no fim de 2017, encostará nos 80% do Produto Interno Bruto (PIB). Na média dos países emergentes, a relação entre a dívida e o PIB é de 40%.
Remendos
O mais preocupante é que, mesmo com o sacrifício que está sendo imposto aos servidores, os gastos com a máquina continuarão crescendo. Há um descompasso enorme entre os poderes da República. Enquanto os funcionários do Executivo terão salários congelados e benefícios reduzidos, a farra continuará latente no Judiciário, no Legislativo e no Ministério Público da União. O esforço que Meirelles tentou indicar que está sendo feito será pouco perto do descompromisso fora da Esplanada dos Ministérios. Será como fechar metade do ralo.
O remendo de ajuste fiscal é resultado da fragilidade do governo de Michel Temer, que cedeu a todas as exigências de sua fisiológica base de apoio. Nos últimos dias, os políticos aos quais o presidente submeteu a revisão das metas fiscais vetaram 70% das propostas de aumento de impostos apresentadas pela equipe econômica. Sobraram alternativas periféricas, que pouco vão ajudar no equacionamento das finanças federais. O time comandado por Meirelles sabe que perdeu a batalha, mesmo tendo prevalecido a proposta da Fazenda de fixar deficits máximos de R$ 159 bilhões neste ano e em 2018. Mas o discurso será de que o compromisso com a responsabilidade fiscal está mantido.
Esse discurso, por sinal, será importante, para que todas as medidas anunciadas ontem, sobretudo as que se referem aos servidores, sejam aprovadas no Congresso. O governo tem a exata noção da força das corporações junto a deputados e senadores. A bancada do Distrito Federal já avisou que, no que depender dela, nada que signifique perdas para o funcionalismo público passará no Legislativo. É preciso levar em conta que todo o pacote de ajuste proposto pela equipe econômica enfrentará a concorrência da próxima denúncia contra Temer preparada, a toque de caixa, pela Procuradoria-Geral da República.
Mediocridade
A sorte do governo é que os investidores estão relevando o desastre das contas públicas. A ordem implícita no mercado é fechar os olhos para a realidade e se abraçar com o pouco oferecido pelo grupo liderado por Meirelles. Para os donos do dinheiro, o mais importante é que o atual governo consiga fazer uma transição sem traumas até o fim de 2018 e, melhor, que, no meio do caminho, as receitas puxadas pela retomada da atividade tornem o cumprimento das metas fiscais menos dolorido. Nesse cenário medíocre, não está contemplada a aprovação da reforma da Previdência Social.
Para os que apostaram alto no governo Temer, que chegou ao poder com um discurso fiscalista e reformista, é pouco, mas é o que se tem para o momento. A torcida é para que o Congresso estenda ao menos uma mãozinha à equipe econômica e entregue o pouco que está sendo pedido. Meirelles, que saiu muito desgastado junto a Temer por causa do embate com a ala política do governo, conta com um aliado recente, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Os dois estão muito próximos. Só não se sabe que proveito o país poderá tirar dessa relação.
Brasília, 06h03min