Coluna no Correio: Quando os inimigos pisam em ovos

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LEONARDO CAVALCANTI

Há pelo menos um ponto em comum entre o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), e o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC): a dificuldade com que os adversários de um e de outro têm de criar estratégias de ataque. A ação efetiva dos dois políticos nas redes sociais e na mídia tradicional parece atrapalhar os opositores. Não é lá muito fácil, diga-se. No caso de Bolsonaro, a esquerda — e até mesmo parte dos repórteres — achou, ao longo do tempo, que a melhor estratégia era ignorá-lo. A opção, que até fazia algum sentido, seria evitar repercutir as imbecilidades ditas pelo deputado reacionário. O silêncio parecia ser a estratégia mais sensata. Nada mais falso.

Não foram raras as vezes que debates se instalaram nas redações quando alguém tinha a ideia de entrevistar Bolsonaro. O contraponto à sugestão era este: não se pode bater palma para doido dançar ou, pior, dar espaço a um camarada desse é irresponsabilidade. Na prática, falar sobre Bolsonaro virou tabu, o nome a nunca ser pronunciado. Não funcionou. Bolsonaro se transformou em Bolsonaro independentemente da ação dos adversários. Subiu nas pesquisas ignorando o fato de a esquerda o ignorar. O jogo fácil de radicalismo, militarismo e preconceito parece ter ultrapassado o simples folclore por parte do eleitor. Sem alternativas, os adversários do parlamentar agora perceberam que a única forma de enfraquecê-lo é expondo a estupidez das ideias do deputado.


Percepção

Não é exagero afirmar que o mesmo ocorre com Doria — e aqui não estamos a comparar propostas ou ideias do prefeito com as de Bolsonaro, apenas a dificuldade de percepção dos adversários. Sem saber como atacar, petistas e até mesmo tucanos mais tradicionais não conseguem minar a evolução de Doria nas pesquisas. Vide por exemplo a campanha dele para prefeito de São Paulo há um ano. Por mais que o desgaste do PT fosse evidente, é razoável questionar uma das estratégias eleitorais de Fernando Haddad ao se colocar como o “prefeito tranquilão”. É bom lembrar que a eleição era para a cidade de São Paulo, onde um candidato pode ser tudo, doutor, menos tranquilão.

Ao mesmo tempo, Doria se apresentava como o homem capaz de fazer São Paulo acelerar — e todas as invencionices de um marketing mais eficiente. Nada mais rasteiro do que avaliar erros e acertos depois da eleição terminada, mas há poucas dúvidas sobre a eficiência da campanha de Doria se comparada à de Haddad. O episódio da chuva de ovos — tirando o fato inconteste de que o baiano é um tipo bom de mira — é o mais recente exemplo de que os partidos de esquerda não conseguem lidar com o Doria. Enquanto os adversários abriram uma discussão infindável sobre a eficiência da ovada, Doria gravou vídeos e fez piadas sobre o episódio. E, assim, vai abrindo pontos. Se começar a perder uma hora, é possível apostar que será pelos próprios erros, e não pela estratégia inimiga.

Vicente Nunes