ANTONIO TEMÓTEO
Apesar do oba-oba que tomou conta do mercado após a Câmara dos Deputados barrar o avanço das investigações contra o presidente Michel Temer, o futuro das reformas é incerto. Embalado pela euforia de quem interpretou a decisão do Legislativo como uma vitória, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, voltou a fazer previsões otimistas. Após encontro com investidores, em um evento realizado ontem em São Paulo, ele afirmou que a reforma da Previdência deve ser votada até outubro.
Além disso, o chefe da equipe econômica disse que o Executivo trabalha em uma proposta de reforma tributária que será encaminhada o quanto antes para apreciação dos parlamentares. Os sinais emitidos por Meirelles precisam ser analisados com cautela. Temer conseguiu 263 votos para se livrar do andamento das investigações no Supremo Tribunal Federal (STF). Em tese, ele precisaria do apoio de mais 45 deputados para conquistar 308 votos para levar para o Senado Federal o texto que altera as regras para concessão de benefícios previdenciários.
Dos parlamentares que compõem a base e estiveram presentes na votação que livrou o chefe do Executivo, 88 votaram pela continuidade das investigações. As traições partiram de diversos partidos, mas os 21 votos contrários do PSDB mostram que a base está rachada. Apesar disso, a tendência é que votem a favor das reformas. Em tese, a quantidade de votos subiria para 284, sem levar em conta os aliados do governo que são contra as reformas, entre eles, parlamentares do PTB, do Solidariedade e até oposicionistas do PDT que votaram a favor de Temer.
O Centrão garantiu a vitória do governo, mas está mais preocupado em ganhar espaço na Esplanada dos Ministérios e ocupar as pastas hoje nas mãos do PSDB. Caberá a Temer reaglutinar a base aliada, mas não está claro se ele conseguirá garantir os 308 votos necessários. A habilidade política do chefe do Executivo é inquestionável. Mesmo quando seus inimigos garantiam o fim da gestão do peemedebista, ele deu demonstrações de que é o político que mais conhece o Congresso. Entretanto, não há figura pública que tenha capital político infinito. Uma hora isso acaba.
Antes da divulgação das conversas de Temer com Joesley Batista, o governo contabilizava 280 votos favoráveis à reforma da Previdência. No plenário, os deputados mais otimistas afirmavam que o chefe do Executivo teria 300 votos para barrar o avanço das investigações. E isso não ocorreu. “Vamos trabalhar para aprovar as reformas necessárias. O governo voltou a ter fôlego e deixou as cordas. Parte considerável de quem votou contar o presidente é favorável às mudanças propostas para o INSS”, destaca um auxiliar do chefe do Executivo.
Eleições
A votação na Câmara que salvou Temer não deixou claro se os 263 parlamentares favoráveis ao presidente são o piso ou o teto do apoio que ele conseguirá para o debate dos temas de interesse do governo, avalia o cientista político Carlos Melo, professor da escola de negócios Insper. Mesmo com o apoio do PSDB, ressalta ele, não há clareza de que o Executivo terá o apoio necessário para aprovar a reforma da Previdência.
Melo ainda relembra que o governo tem baixíssima aprovação popular e já convenceu os parlamentares a votar medidas impopulares, como a aprovação do teto de gastos. “O capital político não é infinito. Você perde e acumula desgastes. Estamos próximos de um ano eleitoral e temos 594 parlamentares preocupados com a reeleição em 2018. Não será uma tarefa fácil aprovar as reformas”, diz.
Os analistas também chamaram a atenção para o mapa regional de votos. O diretor do Paraná Pesquisas, Murilo Hidalgo, destacou que a votação evidencia a falta de sintonia entre o Congresso e a opinião pública. “Os deputados do Nordeste, região na qual o Lula lidera as pesquisas de intenção de voto, salvaram o mandato do presidente Temer, enquanto entre os do Sul, onde o antipetismo é mais forte, a situação foi inversa”, destaca.
Conforme ele, essa dissonância mostra que o Congresso age mais em função do jogo político do que por quem os elege. “Agora, será necessário saber como a opinião pública irá cobrar essa conta nas urnas”, diz. Outro desafio para o governo em meio às incertezas é a mudança da meta fiscal de 2017, que prevê um rombo de R$ 139 bilhões. Os presidentes da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado Federal, Enuncio Oliveira (PMDB-CE),externaram publicamente que são contra o Legislativo autorizar o governo a continuar a gastar desenfreadamente, ao custo da elevação da dívida pública.Temer terá pela frente duras batalhas. A euforia do mercado, neste momento, é descabida.