Coluna no Correio: Joesley, a donzela arrependida

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A foto de Joesley Batista dentro do carro da Polícia Federal segurando um terço é um deboche diante de um país atônito com tanta corrupção. O ex-açougueiro que saqueou o Brasil e que bradava em alto e bom som que nunca seria preso resolveu, agora, se apegar aos santos e pedir proteção depois de ser enjaulado. É muito fácil posar de arrependido depois de tudo o que ele fez para construir o império J&F, dono da JBS. Joesley só está tendo o que merece.

Felizmente, a Justiça está agindo para mostrar ao empresário que se gaba de ter corrompido todos os poderes — Executivo, Judiciário e Legislativo — que o Brasil ainda tem conserto. A suspensão do acordo de leniência fechado com a J&F, que garantia a Joesley e aos executivos da JBS uma espécie de salvo-conduto, é um passo importante para corrigir erros nos processos de delação. A revisão de benefícios em nada enfraquece esses acordos. Muito pelo contrário.

Joesley e companhia enganaram todo mundo. Acreditaram que, ao confessar alguns de seus pecados, estariam perdoados para continuar corrompendo e tirando sarro da cara de todos. O próximo passo, para dar exemplo, é a Justiça transformar o regime da prisão do empresário e do executivo Ricardo Saud de temporária em preventiva. E, se possível, bloquear os bens da família Batista, pois está provado que muito do que conquistou foi de forma ilícita.

Chama a atenção que, no mesmo dia da prisão de Joesley, a JBS tenha vendido uma de suas empresas, a Moy Park, com sede na Irlanda, um paraíso fiscal, para uma companhia do mesmo grupo, a Pilgrim’s, baseada nos Estados Unidos. Com isso, a JBS transferiu um ativo de US$ 1,3 bilhão controlado do Brasil para o exterior. A impressão que fica é a de que a família Batista está remetendo o que pode para o exterior, a fim de escapar das autoridades brasileiras. Cheira à má-fé.

Tratamentos diferenciado

As punições contra Joesley e o grupo que ele representa devem ser rápidas. O Supremo Tribunal Federal (STF) precisa se posicionar a favor da manutenção das provas apresentadas pelo ex-açougueiro comprovando um sistema impressionante de corrupção. Independentemente de ele ter enganado o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tudo o que foi entregue ao Ministério Público é valioso para chegar a todos que se beneficiaram do esquema.

Não podemos nos deixar contaminar pelo discurso fácil dos acusados por Joesley de que nada do que ele disse tem validade. Tem sim. Por mais que o empresário tenha sido seletivo nas informações e nas provas que entregou durante a delação, têm-se a noção clara da roubalheira que tomou conta do país. Anular as provas só interessa para aqueles que sempre viveram sob o manto da impunidade. São os mesmos que tentam enfraquecer a Lava-Jato, que, se ressalte, ficará mais forte à medida que possíveis erros de rota, como o acordo de leniência fechado com a JBS, sejam corrigidos.

O ex-procurador Marcello Miller também não pode ficar impune. É estranho que, perante tudo o que já foi revelado, ele continue solto. Rodrigo Janot afirma que uma investigação interna encontrou e-mails mostrando que Miller já tratava sobre os benefícios aos delatores do grupo J&F antes de se exonerar do Ministério Público. Miller foi auxiliar direto de Janot, que pediu a prisão dele, pleito negado pelo STF. Neste caso, com provas tão evidentes, não pode haver tratamento diferenciado. É imperativo que todos, corruptores e corrompidos, sejam punidos com rigor. O país já foi enxovalhado demais.

Brasília,

Vicente Nunes