A conclusão do processo de impeachment de Dilma Rousseff, que coincidirá com a divulgação do Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, levará os agentes de mercado a reverem, para cima, as projeções de crescimento da economia em 2017. Na avaliação de auxiliares do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, a tendência é de que as projeções médias feitas por analistas, de 1,2%, convirjam rapidamente para a estimativa do governo, de1,6%.
O PIB mais robusto pós-impeachment, no entender da equipe econômica, estará limpo de boa parte do risco político que prevaleceu nos últimos meses e refletirá a evidente melhora dos níveis de confiança de empresários e consumidores. Os técnicos não descartam a possibilidade de o resultado final do indicador ser melhor do que o esperado no ano que vem. Há casas bancárias que já trabalham com expansão da atividade de até 2,5%.
Para que esse quadro mais otimista se confirme, será preciso, porém, que o governo faça o ajuste fiscal avançar mais rápido. A meta de Meirelles é aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento de gastos à inflação do ano anterior na Câmara dos Deputados até outubro e liquidar a fatura no Senado ainda na primeira quinzena de dezembro. A partir daí, os esforços se concentrarão na reforma da Previdência, cuja negociação tende a se arrastar por quase todo 2017.
A estratégia do governo é usar a aprovação da PEC para arrancar apoio às mudanças no sistema previdenciário. Segundo os técnicos, os parlamentares perceberão que, com o limite para a correção das despesas, se nada for feito para conter os desembolsos com aposentadorias e pensões, não sobrará dinheiro no Orçamento da União para o incremento das demais rubricas, nem mesmo para a educação e a saúde. “Será uma questão matemática”, frisa um auxiliar do ministro da Fazenda.
Antes e depois de Temer
Se o roteiro que o governo traçou for seguido à risca e os analistas privados realmente elevarem as projeções para o PIB de 2017, Meirelles acredita que seu discurso a favor do ajuste fiscal ficará mais forte. Neste momento, o processo de convencimento consiste em traçar um quadro alarmante da economia, como comparar o Brasil à Grécia. Mais à frente, o discurso será pela prosperidade. Serão dois países, um antes de Temer, outro depois do peemedebista.
O Planalto gostaria, por sinal, que o discurso mais positivo fosse entoado com ênfase desde já. Contudo, reconhece que um sentimento de euforia daria a impressão de que todos os problemas do país foram resolvidos. O Congresso só funciona sobre pressão. Portanto, é preciso pintar o fim do mundo para que deputados e senadores se convençam de que o ajuste fiscal é a ponte de salvação do país. E a PEC dos gastos é seu principal alicerce.
“Vamos continuar ressaltando que, sem as medidas do ajuste, teremos um país rumo ao precipício. Queremos, com isso, deixar bem claro que corremos o risco de viver tempos muito parecidos com os de quando Dilma estava no poder. Creio que ninguém vai querer esse retrocesso”, afirma um assessor de Temer. De qualquer forma, reconhece ele, será preciso acompanhar esses alertas de um pouco de esperança. “As pessoas têm que nos ver de forma diferente. Têm que acreditar que somos capazes de resgatar a autoestima. Uma recessão tão profunda quanto a que estamos vivendo derruba todo mundo”, frisa.
Esse contraponto mais favorável ganha força diante dos números do mercado de trabalho. Nos quase três meses em que Temer está no poder, o desemprego continuou batendo recorde. Somente em julho, quase 95 mil pessoas perderam o emprego com carteira assinada. “É a herança maldita de Dilma. Mas não podemos ficar presos a esse tipo de justificativa. Os trabalhadores querem saber o que estamos fazendo para que as demissões sejam estancadas” ressalta o assessor palaciano.
Pedra no caminho
A equipe econômica sabe, porém, que, em meio às boas notícias sobre o ritmo da atividade, terá que lidar com uma pedra enorme no meio do caminho: o aumento dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que elevará o teto do funcionalismo e provocará um efeito cascata em estados e municípios.
O Planalto já indicou que não vai se meter nesse assunto, para não alimentar ruídos entre os agentes econômicos. Mas um ministro muito próximo do presidente interino diz que, se o reajuste passar pelo crivo do Congresso, Temer não vetará. Não vai comprar briga com dois poderes, o Legislativo e o Judiciário, mesmo estando efetivado no cargo.
Para o grupo liderado por Meirelles, o ideal seria que a decisão sobre os reajustes de servidores que estão sob análise de deputados e senadores ficasse para depois da aprovação da PEC dos gastos. Certamente, isso melindraria menos os mercados. “O momento é de passar sinais de austeridade, não de mais gastos. Estamos, porém, diante de uma decisão política. As corporações falam muito alto no Congresso. Há todo tipo de interesse por trás das decisões”, diz um dos técnicos.
Portanto, destaca o mesmo subordinado a Meirelles, a Fazenda terá que ser a porta-voz do equilíbrio fiscal. “Não se trata de dar mais poder para esse ou para aquele ministério. O jogo aqui é convencer que, dentro do que estamos propondo, não haverá recuos”, afirma. “Agora, se não atrapalharem, certamente, tudo ficará mais fácil”, emenda. Infelizmente, esse Brasil do bom senso está longe da realidade. A gula por privilégios não tem limites.
Brasília, 00h01min