Coluna no Correio: Devagar com o andor

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A equipe do Ministério da Fazenda acredita que passou no primeiro teste de credibilidade, depois de anunciar rombo de R$ 139 bilhões para o governo federal em 2017. O dólar desabou e a bolsa de valores teve alta superior a 2% ontem. Mas, como bem ressalta o secretário de Acompanhamento Econômico da pasta, Mansueto Almeida, o momento de comemoração está muito longe. O que se tem, agora, é apenas uma meta. E alcançá-la não será tarefa fácil. Para que o rombo nas contas fique dentro do anunciado pelo ministro Henrique Meirelles, R$ 55 bilhões terão que irrigar o caixa do Tesouro Nacional. Por enquanto, essa quantia é pura promessa.

A postura conservadora de Mansueto não deixa dúvidas quanto ao tamanho do desafio assumido. Mas, para o economista-chefe do Banco ABC Brasil, Luís Otávio de Souza Leal, não há outra saída. “O ajuste que o governo está propondo fazer tem que dar certo. É o que temos”, diz. Na cabeça dos especialistas, incluindo Leal, a única forma de o país retomar o crescimento econômico é resolvendo o descalabro das finanças federais. À medida que os resultados forem aparecendo, a confiança se solidificará e os investimentos de que tanto o país precisa tenderão a sair das gavetas.

Na opinião de Carlos Thadeu Filho, sócio da consultoria MacroAgro, a virada no ritmo da atividade, com a saída do país da recessão, começará a ficar evidente já a partir da confirmação, pelo Senado, do impeachment definitivo de Dilma Rousseff. “Será a senha para que os investidores retomem seus negócios. O país estará livre do fantasma da petista, cujo retorno, se ocorresse, seria um buraco negro. Com Dilma, o Brasil iria para o caminho da destruição”, afirma.

Pelos cálculos de Thadeu Filho, é possível que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça mais de 2% em 2017 — o que, se confirmado, facilitará o trabalho de Meirelles, pois impulsionará a arrecadação. No projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) encaminhado ontem ao Congresso, o governo está estimando incremento da economia de 1,2%. Está dentro da média do mercado. Contudo, casas bancárias e consultorias respeitadas, como o Bradesco e a MB Associados, garantem que a força da retomada vai surpreender para o bem, pois há muitos projetos de investimentos e demanda reprimidos.

Juros reais

Outro importante incentivo virá da inflação, avalia o economista da MacroAgro. Ele ressalta que os índices de preços vão baixar para algo entre 5,5% e 6% até o fim do ano que vem, ainda longe dos 4,5% prometidos pelo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, mas num patamar suficiente para permitir uma queda gradual da taxa básica de juros (Selic), que está em 14,25% ao ano. “Ainda que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) não convirja para o centro da meta, o BC terá que cortar os juros, pois a taxa real (que desconta a inflação) vai subir. E, se nada for feito, será um grande inibidor para a atividade”, assinala. Os juros reais estão hoje em torno de 7% ante taxas negativas em todo o mundo desenvolvido.

Thadeu Filho explica que está menos otimista em relação à inflação devido a um realinhamento dos preços dos alimentos. Isso quer dizer que, em vez de ficarem mais baratos, esses produtos continuarão em alta, sem arrancadas, mas em elevação suficiente para segurar a desaceleração do IPCA. Ontem, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou a inflação de junho. Metade do 0,35% veio de dois produtos: feijão e leite. “Os preços da comida continuarão azedando o humor dos consumidores”, frisa.

Independentemente disso, está visível a disposição do BC de baixar juros. Não será a festa que o governo espera. Mas técnicos da instituição admitem que a Selic pode cair até um ponto percentual nas duas últimas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) deste ano, para 13,25%. Esse movimento será facilitado se o Congresso aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento de gastos. A equipe chefiada por Ilan terá a certeza de que o rombo nas contas públicas não passará dos R$ 139 bilhões em 2017. Menos gasto público significa menor pressão sobre a inflação.

Socorro negado

Enquanto tudo são projeções, Mansueto diz que o governo precisa correr para fechar a proposta de Orçamento de 2017, que deve ser encaminhada ao Congresso até 31 de agosto. “O projeto já levará em consideração a aprovação da PEC dos gastos”, afirma. Caso o Legislativo não entregue o que se espera, será uma guerra, devido ao engessamento de receitas e despesas imposto pela projeção de deficit de R$ 139 bilhões do governo central.

Uma coisa já está certa: a proposta de Orçamento não contemplará nenhum centavo para socorro às estatais. Essas empresas vêm apresentando péssimos resultados, acumulando, somente em 2015, prejuízo de mais de R$ 50 bilhões. As maiores preocupações são com a Caixa Econômica Federal, que teria um passivo oculto de quase R$ 30 bilhões, a Petrobras, que foi saqueada pela quadrilha liderada pelo PT e pelo PMDB, e a Eletrobras, também esfacelada pela corrupção.

Segundo Mansueto, as estatais terão que se virar com o que têm para cobrir rombos de caixa. Isso passa pela venda de ativos. Não há como o Tesouro atender a nenhum pleito, a despeito de ter recebido, nos últimos quatro anos, R$ 76,8 bilhões em dividendos repassados pelas empresas. A hora, destaca o secretário, é de eficiência. Não há mais como ser complacente com o descaso e a má gestão.

Brasília, 05h30min

Vicente Nunes