Coluna no Correio: Brasil 2018

Publicado em Economia, Sem categoria

POR PAULO SILVA PINTO

 

Hoje é dia de uma decisão das mais significativas para a política monetária: a definição da meta de inflação que o Banco Central (BC) vai perseguir em 2018. Parece muito tempo olhar 18 meses à frente, mas, em um mundo economicamente civilizado, as coisas devem funcionar assim, com expectativas ancoradas anos antes. Isso é a essência da estabilidade econômica.

 

O Brasil já viveu, em alguns momentos, maior proximidade da civilização. Colheu taxas de inflação mais baixas e, a longo prazo, maior crescimento econômico. O economista Octavio de Barros, diretor de Pesquisas Macroeconômicas do Bradesco, argumenta que o ideal seria estabelecer um objetivo mais ambicioso.

 

O Conselho Monetário Nacional (CMN) reúne-se para confirmar ou não a meta do próximo ano, estabelecida em 4,5%. É a mesma deste ano, só que a margem de tolerância será menor: 1,5 ponto em vez dos dois que vigoram atualmente para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Isso é legado monetarista de Joaquim Levy em sua passagem pelo Ministério da Fazenda no ano passado. Nada deve ser mudado nesse aspecto pelos integrantes do CMN, o atual titular da Fazenda, Henrique Meirelles, e o do Planejamento, Dyogo Oliveira.

 

A decisão mais importante é a de 2018. São grandes as chances de que se reduza a meta, possivelmente para 4%, embora isso não esteja garantido. “Não sei o que vão fazer, mas eu defendo que se reduza”, diz Barros. Ele acha um absurdo o Brasil ter um patamar inflacionário tão alto, quando outros países latino-americanos, caso do Chile e do México, têm objetivos bem mais baixos.

 

Ineficiência

 

Mas não é só isso. Barros acha que seria necessária ousadia também no objetivo temporal. Em vez de um ano, dois anos. “Ou então uma meta atemporal, o que vigora em vários países”, explica. O problema do período de um ano é que ele gera ineficiências. Se falta apenas um mês para fechar o período, e a carestia está fora do intervalo previsto, a autoridade monetária se vê obrigada a um esforço exagerado para levar o índice de preços ao que se propõe. Ou então ignora o número e dá uma desculpa, aliás o que se tem feito no Brasil nos últimos anos — no ano passado, extrapolou-se até mesmo o teto da margem. O Brasil, destaca Barros, é o único dos 44 países que adotam o sistema de metas de inflação a se ater a um ciclo de um ano para o objetivo fixado.

 

O problema de ignorar os objetivos sem cerimônia é que isso corrói a credibilidade do sistema. Durante a gestão da presidente Dilma Rousseff, com Alexandre Tombini no comando da autoridade monetária, o que se comentava é que o teto havia virado o novo centro da meta.

 

Quando vêm choques inesperados, por exemplo a queda no preço de commodities, ou fatores climáticos, a diferença é acomodada na margem. Mas se o país já está operando no limite, não há como absorver. Com isso, no ano passado, a inflação foi a dois dígitos. Atingiu quase o dobro do teto.

 

A vantagem do sistema de metas é que os agentes econômicos ajustam suas expectativas. As profecias do mercado são muitas vezes autorrealizáveis: o que os agentes econômicos acham que vai acontecer acaba acontecendo mesmo. Mas coordenar as expectativas dá um baita trabalho, que o BC e o Ministério da Fazenda devem empreender. No caso do primeiro, isso ocorre por meio de uma política monetária eficiente e uma comunicação clara, e, no do segundo, com uma política fiscal responsável e a garantia de autonomia ao mandato do BC.

 

Abandono

 

No governo de Dilma e na administração de Tombini o sistema foi para o espaço, assim como a inflação. Isso não significou maior liberdade para o país colocar os juros e o crescimento no patamar que quisesse. Ao contrário. O juro do país é um recorde mundial, com a taxa básica em 14,25%. E o crescimento é um recorde negativo. O país vai perder 10% em dois anos, algo que nenhuma outra economia da mesma relevância experimenta.

 

Sergio Werlang, responsável pela implantação do sistema de metas quando era diretor de política econômica do BC, explica que a disciplina torna as políticas menos custosas, não mais. “Quanto mais a expectativa diverge da meta, mais caro fica, em termos de PIB (Produto Interno Bruto), colocar de novo na meta”, diz.

 

Reduzir a meta para 2018 não teria grande efeito na política monetária a curto prazo. Ou seja, não mudaria a decisão de baixar os juros em outubro ou mais para frente. A longo prazo, pode resultar em um custo menor em termos de juros, já que, com uma Selic mais baixa, será possível conseguir o mesmo IPCA. Mas é claro que a política fiscal precisa ajudar também. A expectativa é de IPCA em 4,2% em 2018 com o juro atual.

 

Assim, só será possível ter uma taxa menor se outros fatores ajudarem, com um deficit menor. A expectativa para o próximo ano é de um rombo em torno de R$ 100 bilhões. Menor do que os R$ 170,5 bilhões previstos para este ano, mas, ainda assim, um deficit. É preciso que as coisas melhorem muito em 18 meses, o que depende da aprovação do teto de gastos públicos e da reforma da Previdência.

 

Brasília, 04h05min