Coluna no Correio: Blindagem de Temer

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O governo está convencido de que conseguirá blindar o presidente interino, Michel Temer, das denúncias feitas por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, de que o peemedebista teria pedido R$ 1,5 milhão de propinas para a campanha de Gabriel Chalita à Prefeitura de São Paulo. Emissários do chefe do Executivo que saíram a campo ouviram de líderes políticos e agentes econômicos que, pelo menos por enquanto, não há qualquer possibilidade de se criar dificuldades para a continuidade do governo.

A justificativa para o apoio de empresários e investidores a Temer é de que a desestabilização, agora, do chefe do Executivo poderá levar o país a mergulhar em uma crise muito mais grave que a observada atualmente. O peemedebista é visto como a única solução, neste momento, para tirar o Brasil do atoleiro sem provocar grandes traumas, ainda que não seja o presidente dos sonhos dos donos do dinheiro. A leitura dos agentes econômicos é de que o país precisa voltar à normalidade, para reverter as mazelas provocadas pela recessão — a pior delas, o desemprego.

Pelos cálculos do mercado, hoje, são de 80% as chances de Temer ser efetivado no governo com a aprovação, pelo Senado, do impeachment de Dilma Rousseff e de completar o mandato até 2018. Nas várias simulações que os investidores fazem, os riscos que podem frustrar os planos do peemedebista não são desprezíveis. Muito pelo contrário. Embutem a Operação Lava-Jato, que provocou os estragos dos últimos dias, o julgamento pelo Superior Tribunal Eleitoral (TSE) da campanha à reeleição da chapa que elegeu Dilma e Temer e uma mudança inesperada na votação do impeachment.

Ansiedade

Desde anteontem, quando a delação de Sérgio Machado foi liberada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Temer recebeu a garantia dos principais líderes que compõem a sua base parlamentar de que nada que possa colocar o governo em risco terá andamento no Congresso. É possível, inclusive, que o Legislativo acelere as discussões de projetos importantes, como o que limita o aumento de gastos, para dar uma demonstração de força do Palácio do Planalto. Com a economia mostrando alguma reação, Temer terá fôlego maior para administrar os tiros disparados contra ele.

Para investidores e empresários, os primeiros sinais de reativação da economia precisam vir logo, ainda na interinidade de Temer. Isso motivará o início dos investimentos produtivos, os únicos que podem tirar o país da recessão. Não serão o consumo das famílias nem os gastos do governo, muito menos as exportações, que mudarão a rota do Produto Interno Bruto (PIB). Mas investimentos requerem confiança. E esse item precioso está distante. No máximo, se veem sinais de melhora de humor, que, num ambiente tão confuso, pouco contribuem para reverter o ritmo da atividade.

Um dos auxiliares mais próximos de Temer reconhece que o governo tremeu nas bases com as revelações de Machado. Mas, no entender dele, o estrago foi administrado e são remotas as chances de algo mais grave aparecer contra o presidente interino. O sinal de alerta só seria ligado de verdade se o deputado Eduardo Cunha, que deve ser cassado nos próximos dias, resolvesse falar. “Essa bomba está no radar de todo mundo. Não dá para prever o que Cunha é capaz se resolver abrir a boca”, afirma.

Peso da caneta

Por precaução, Temer deve acelerar o uso da caneta para saciar a gula de aliados mais suscetíveis às ondas de denúncias. A ideia é dar cargos periféricos, em delegacias regionais dos ministérios do Trabalho, da Agricultura e da Saúde, por exemplo, para manter a base de pelo menos 340 votos na Câmara e de 58 no Senado. Com esse apoio, o peemedebista acredita que liquidará a fatura do impeachment de Dilma até agosto e poderá levar adiante as medidas econômicas que darão respaldo ao governo efetivo nos meses seguintes.

Resta saber se realmente os cálculos políticos de Temer estão corretos. A reação dele ontem, ao fazer um pronunciamento público, foi considerada acertada, assim como a demissão do terceiro ministro — Henrique Eduardo Alves, do Turismo —, mas não suficiente para que ele saia do foco dos ataques. O grande problema é que o peemedebista se cercou de pessoas com históricos muito ruins, ligadas à corrupção. Ele ficou suscetível demais a denúncias.

Essa fragilidade, inclusive, mina parte do esforço da equipe chefiada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, de reconstrução da credibilidade da política econômica. Um empresário menos paciente indica como estão os ânimos. “Vamos trabalhar para blindar Temer. Mas é preciso que ele nos ajude. Se precisar, que demita logo os ministros que estão sob suspeição e, assim, livre o governo de viver de sobressaltos. O tempo para fazer as mudanças que o país precisa está ficando curto demais”, diz. “Temer não pode subestimar os riscos que corre”, conclui.

Brasília, 07h01min

Vicente Nunes