Mesmo as instituições financeiras que mantinham otimismo com o processo de recuperação econômica tiveram de se adequar à realidade, diante do aumento do ruído político. Nas contas do chefe de Economia e Estratégia do Bank of America Merrill Lynch no Brasil, David Beker, o país registrará um rombo fiscal R$ 165 bilhões em 2017, equivalente a 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Caso a estimativa se confirme, será o pior resultado da história. Antes, ele estimava que o deficit chegaria a R$ 139 bilhões. A redução na expectativa para o crescimento deste ano, que passou de 1% para 0,25%, é a principal justificativa para a piora das projeções.
A dinâmica fiscal, explica Beker, continua a ser desafiadora a curto prazo, e as perspectivas de crescimento mais fracas para os próximos dois anos reduzirão ainda mais as receitas. Ele ressalta que o governo tem trabalhado para conter o crescimento dos gastos, mas, como as despesas obrigatórias representam aproximadamente 80% das totais, há pouco espaço para cortes. “Se a atividade for mais fraca do que o esperado, os deficits primários provavelmente aumentarão”, resume.
Para 2018, a previsão também é dramática quando se olha o tamanho do deficit em relação ao PIB. Nas contas do economista do Bank of America Merrill Lynch, o rombo equivalerá a 2% de todas as riquezas produzidas pelo país. Já a estimativa de expansão da atividade encolheu de 3% para 1,5%. Com isso, a necessidade de financiamento do setor público passará de R$ 95 bilhões para R$ 135 bilhões. Beker avalia que a única maneira de garantir o cumprimento das metas fiscais seria confiar na arrecadação de receitas não-recorrentes. As revisões levaram a instituição financeira a estimar que dívida bruta corresponderá a 82% do PIB em 2018.
A piora das projeções, detalha o economista, leva em conta o fato de a recente turbulência política ter aumentado o atraso na aprovação da reforma da Previdência, considerada por ele um dos principais pilares que sustentariam a retomada da atividade. “Qualquer atraso, provavelmente, afetará indicadores de confiança e enfraquecerá a já frágil recuperação econômica”, ressalta.
Juros menores
Diante do processo ainda mais lento de recuperação da economia — no mercado alguns analistas já apostam em recessão pelo terceiro ano seguido — Beker avalia que o Banco Central terá ainda mais espaço para reduzir a taxa básica de juros (Selic). Isso porque o cenário de inflação a curto prazo continua a ser benigno e as expectativas continuam ancoradas, mesmo com o risco de deterioração fiscal. Nas contas dele, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrará alta de 3,5% em 2017 e de 3,9% em 2018. Antes, ele estimava elevação de 4,4% no próximo ano.
Com isso, a autoridade monetária terá condições de antecipar o ciclo de flexibilização dos juros para 8,25% ainda em 2017. No cenário anterior isso só ocorreria no próximo ano. Os atrasos na aprovação da reforma limitam o declínio nas taxas neutras e o ciclo de flexibilização. No entanto, a curto prazo, a inflação continua a surpreender, as expectativas permanecem ancoradas apesar do risco de deterioração fiscal e as menores expectativas de crescimento do PIB implicam um hiato negativo do produto que leva mais tempo para fechar”, completa.
Brasília, 06h14min