COLAPSO À VISTA

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Integrantes do Palácio do Planalto já começaram a mapear o estrago que a segunda-feira marcada por apagões e aumento de impostos poderá fazer na popularidade da presidente Dilma Rousseff. Apesar de o governo já ter sinalizado que reajustaria tributos como a Cide, que encarece a gasolina, ninguém contava que o anúncio das maldades preparadas pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, coincidiria com a interrupção do fornecimento de energia em 10 estados e no Distrito Federal. “Foi uma coincidência infeliz, que, sabemos, custará caro ao governo”, diz um assessor de Dilma.

Mais do que o aumento de impostos, o que preocupa o Planalto é a possibilidade de o país conviver com apagões quase que diários neste que promete ser o verão mais quente da história. A decisão do Operador Nacional do Sistema (ONS) de ordenar às concessionárias das regiões mais ricas do país para desligar a luz de parte da população reforçou que o Brasil já está convivendo com racionamento de energia. Bastará o consumo encostar no pico, para que os cortes sejam determinados. Não há folga no sistema interligado implantado por Dilma quando ela era ministra de Minas e Energia. Nem mesmo as usinas térmicas, que operam na capacidade máxima, serão capazes de evitar transtornos. O risco de colapso é real.

Para o economista Newton Rosa, da Sul América Investimentos, o esforço do governo de resgatar a confiança de investidores e empresários, ao anunciar medidas para o ajuste fiscal, pode ser minimizado diante do estrago que o racionamento de energia e de água fará na economia. “Ninguém consegue dimensionar, com clareza, o custo do racionamento. Mas, com certeza, o Brasil mergulhará na recessão”, avisa. Ele ressalta que esse temor é o principal motivo de os empresários não estarem comprando, como o mercado financeiro, o otimismo que o governo tenta disseminar com o pacote de maldades de Levy.

Economista-chefe da Corretora Tullett Prebon, Fernando Montero afirma ser compreensível que haja um descompasso entre a visão do empresariado e a do mercado financeiro em relação ao governo. Os investidores antecipam os movimentos, pois, mesmo que façam apostas erradas e percam dinheiro, conseguem se recompor rapidamente, devido ao grande volume de recursos em circulação pelo mundo. Já os empresários não podem se dar ao luxo de errar. Se investirem em uma fábrica que não dará certo, quebrarão. Por isso, vão esperar os resultados dos ajustes anunciados por Levy para retomarem os investimentos produtivos.

Na avaliação de especialistas, o caminho mais rápido para o governo se aproximar do empresariado é fazer, no setor de energia, o mesmo que está fazendo com as contas públicas: dar transparência. Por pior que seja a realidade, é melhor assumir logo que o país terá de racionar energia e água. Assim, os projetos de investimentos poderão ser adequados ao fornecimento de eletricidade, um dos principais itens de custo da indústria. “Chegou a hora da verdade. O governo errou demais. Errou nas gestão das contas públicos, errou no setor elétrico ao acreditar que o país suportaria o populismo tarifário”, admite um técnico do Ministério da Fazenda.

Calafrios

Técnicos do governo têm em mãos cálculos mostrando que um provável racionamento de água e energia poderá tirar entre um e dois pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. Só de ouvir essas projeções, auxiliares da presidente Dilma sentem calafrios.

Selic pode subir 0,75 ponto

» Gente graúda do mercado financeiro não descarta a possibilidade de o Banco Central elevar a taxa básica de juros (Selic) em 0,75 ponto percentual na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que começa hoje e termina amanhã. Há muita preocupação no BC com a inflação rodando os 7%.

Levy decepciona empresários

» O ministro da Fazenda provocou decepção entre os empresários que compareceram ontem na sede da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) para ouvi-lo. Muitos se deslocaram de outros estados, como José Antonio Martins, da fabricante de ônibus Marcopolo, com sede no Rio Grande do Sul. O encontro estava marcado para as 14h. Pouco depois do meio-dia, um assessor de Joaquim Levy ligou para a Fiesp para avisar que o ministro se atrasaria, pois estava em uma reunião com a presidente Dilma.

Cobrança por atenção

» A expectativa era de que Levy decolasse de Brasília às 13h30. Como não conseguiu, diante do pacote de medidas que estava sendo negociado com a presidente, o chefe da equipe econômica teve de cancelar o encontro, assim como a viagem para Davos, na Suíça, para onde embarcará hoje. “Foi o anticlímax total”, disse um dos presentes na Fiesp. “Mas esperamos que o ministro cumpra a sua promessa o mais rapidamente possível. Não dá para ficar distante do empresariado”, ressalta outro executivo.

Do berço ao túmulo

» A Confederação Nacional da Indústria (CNI) lança hoje, em parceria com o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), um manual com instruções para que empresários adotem a chamada Avaliação do Ciclo de Vida (ACV). Comum em países europeus e nos Estados Unidos, a ACV considera as implicações ambientais de toda a cadeia de abastecimento de produtos, bens e serviços, o que abrange o ciclo de vida “do berço ao túmulo”. Por meio desse indicador, as empresas podem identificar oportunidades de melhorias competitivas e de redução de impactos ambientais na produção.

Brasília, 12h10min

Vicente Nunes