ROSANA HESSEL
A notícia da carta do secretário de Estado dos Estados Unidos, Michael Pompeo, para o secretário-geral da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), Ángel Gurría, divulgada pela Bloomberg News, na qual a Casa Branca não endossa a candidatura do Brasil como país membro, indicando apenas Argentina e Romênia, deixou a equipe econômica frustrada, de acordo com fontes próximas ao grupo chefiado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. A palavra de ordem entre os técnicos foi “continuar o processo de convergência, de regulação e governança com padrões globais, para permitir a inserção”.
No Ministério da Economia, a orientação foi não comentar o assunto oficialmente. O Ministério das Relações Exteriores fez o mesmo. “Há um clima de frustração, mas eles disseram que vão continuar trabalhando para que o país continue adotando medidas para se enquadrar nas regras da OCDE e receba o endosso em uma próxima oportunidade”, disse uma fonte próxima do governo.
A economista Monica de Bolle, diretora de estudos latino-americanos e mercados emergentes da Johns Hopkins University, em Washington, lembrou que os EUA já tinham manifestado a preferência por Argentina e Romênia e o Brasil sabia disso, mas estava na expectativa de que “poderia furar a fila”.
Em março, quando o presidente Jair Bolsonaro foi à Washington e assinou a declaração conjunta com o presidente dos EUA, Donald Trump, em parte, em troca do apoio do Brasil à OCDE, o governo brasileiro fez várias concessões. Entre elas, permitiu aos norte-americanos o acesso à base de Alcântara, acabou com a exigência de visto para cidadãos americanos, unilateralmente, para entrada no país e concordou em abrir mão do status preferencial de país em desenvolvimento na Organização Mundial do Comércio (OMC) para receber o endosso de Washington.
Essa exigência, por exemplo, não foi feita para outros países emergentes que entraram na OMC, como México. E, para deixar esse privilégio, basta que o país comunique a entidade. A intenção foi confirmada em março pelo Brasil, mas o governo não deu um prazo para quando isso acontecerá efetivamente.
“Naquela época da visita do Bolsonaro, ninguém entendeu nada (sobre o apoio dos EUA ao Brasil na OCDE), porque a postura do USTR (representante das negociações comerciais dos EUA) de endossar as candidaturas da Argentina e da Romênia na OCDE sempre foi conhecida. E todos sabem que Washington nunca quis abrir muito a possibilidade de muitos entrarem na entidade”, destacou Monica. “Essa promessa de apoio é vazia, não está alinhada com a postura do governo Trump”, emendou.
Para a economista, o apoio à Romênia é natural, porque o país pertence à União Europeia e os europeus não deve rejeitar a sua entrada. E, no caso da Argentina, essa negociação é antiga. “Trump e o presidente da Argentina, Mauricio Macri, são amigos pessoais mesmo antes de serem presidentes”, reforçou. Ela lembrou que o fato de o país ainda não ter nomeado um embaixador na capital norte-americana desde março não tem ajudado nessa negociação.
Na avaliação do especialista em relações internacionais Wagner Parente, CEO da BMJ Consultoria, a carta de Pompeo indica o fato de que a Casa Branca não gostou do fato da imposição de cotas para o etanol dos EUA no Brasil, uma exigência da indústria nacional. “O Brasil impôs uma cota de 750 milhões de litros, mas os EUA esperavam que o imposto de importação fosse zerado. Acredito que isso tenha prejudicado a formalização do apoio ao país pelos norte-americanos”, disse. Segundo ele, será difícil para o governo não impor essa cota junto ao Congresso. “A pressão dos usineiros do Nordeste é grande”, pontuou.
Nota da Embaixada
A Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, em nota divulgada nesta quinta-feira (10/10), informou que os EUA mantém apoio ao Brasil no processo de adesão OCDE, reforçando as declarações dos presidentes dos dois países. “A declaração conjunta de 19 de março do presidente Trump e do presidente Bolsonaro afirmou claramente o apoio ao Brasil para iniciar o processo para se tornar um membro pleno da OCDE e saudou os esforços contínuos do Brasil em relação às reformas econômicas, melhores práticas e conformidade com as normas da OCDE. Continuamos mantendo essa declaração”, informou a Embaixada sem especificar uma data para esse apoio.
“Apoiamos a expansão da OCDE a um ritmo controlado que leve em conta a necessidade de pressionar as reformas de governança e o planejamento de sucessão. Continuaremos a trabalhar com outros membros da OCDE para encontrar um caminho para a expansão da instituição. Todos os 36 países membros da OCDE devem concordar, por consenso, com o calendário e a ordem dos convites para iniciar o processo de adesão à OCDE”, concluiu o comunicado.
O Brasil iniciou o processo de adesão na OCDE em 2017. De acordo com uma fonte do governo, “há uma interpretação totalmente equivocada dessa indicação americana sobre Argentina e Romênia”, contudo, as autoridades já tinham consciência de que a Argentina estava na frente. “Nada mudou no apoio americano ao Brasil. A questão é que ainda não há um segundo candidato europeu com apoio americano que possa começar o processo junto com o Brasil, para manter a paridade entre novos membros europeus e não-europeus (algo de que os europeus fazem questão). A Argentina já tinha o apoio americano antes de nós, não temos problema nenhum com essa posição de que a Argentina comece o processo junto com a Romênia. Continuamos nos preparando para ingressar. Não há um tempo definido para a duração do processo de adesão. O Brasil pode começar o processo um pouco depois e terminar antes, pois temos já um ótimo nível de preparação e incorporação das normas”, disse a fonte ao Blog.