CARNAVAL DA CRISE

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O Brasil entra com tudo hoje no clima de carnaval mergulhado em uma crise sem precedentes. Por onde quer que se olhe, só há notícias ruins. Em vez da alegria tradicional da festa de momo, os brasileiros vão chorar as mágoas. Sabem que o futuro que lhes aguarda será tenebroso. O governo está completamente perdido, e o Congresso, longe de resolver os problemas que nos condenam ao atraso.

 

Antes de o país cair na folia, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que a inflação não dá trégua. Quando medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que reflete o custo de vida entre as famílias que ganham até cinco salários mínimos, a carestia passou de 2% em algumas capitais, como a do Rio de Janeiro. Isso confirma que são os mais pobres os que mais têm sofrido com a disseminação dos reajustes.

 

A inflação está subindo mesmo com o Brasil ostentando a maior taxa de juros do mundo, de 14,25% ao ano. Mas o que torna o quadro mais dramático é o fato de o país estar em recessão profunda. O maior banco privado do país, o Itaú Unibanco, já está prevendo queda de 4% para o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano. Isso depois de o país encolher quase 4% em 2015. A instituição acredita que o desemprego, que está em 9%, saltará para 13% até dezembro.

 

Na visão dos especialistas, não há perspectiva de redução do custo de vida tão cedo. Ainda que a inflação perca força nos próximos meses, como prevê o Banco Central, será muito pouco para dar alívio no orçamento das famílias. Nas filas de supermercados, podem-se ouvir relatos de donas de casa que estão sendo obrigadas a dividir em dois ou em até quatro pedaços o bife que a criançada não abre mão. Os tempos de fartura, relatam elas, ficaram para trás.

 

Estado de pânico

 

Não bastassem lidar com a inflação alta, as famílias estão estarrecidas com a rápida propagação do zika vírus, causador da microcefalia. O pânico é tamanho, que muitas mulheres estão suspendendo os planos de gravidez. Para um país que está enfrentando queda contínua da taxa de natalidade, os reflexos mais à frente podem ser dramáticos. Os especialistas falam em “dente demográfico”, isto é, uma falha no ciclo de nascimento de crianças.

 

É impossível dizer, neste momento, o tamanho do impacto que o zika vírus terá na economia brasileira. Mas, certamente, será enorme, sobretudo porque o país está despreparado para lidar com essa mazela. O governo só decidiu agir depois de a porta ser arrombada. E, ainda assim, de forma descoordenada. Não à toa, em vez de se tranquilizar quando uma autoridade fala, a população fica mais apreensiva.

 

O medo em relação ao propagador do zika vírus, o Aedes aegypti, é tamanho, que investidores estrangeiros que vinham prospectando negócios no Brasil resolveram interromper o processo até terem a exata noção de como o Brasil lidará com a doença. Já se fala, inclusive, sobre a possibilidade de o Comitê Olímpico Internacional (COI) suspender a realização dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, o que seria um desastre para a imagem do país.

 

Passividade

 

Diante de tantos problemas enfrentados pelo Brasil, espera-se que a população, que tomará as ruas nos próximos dias para curtir o carnaval, também mostre disposição para cobrar o governo. A passividade com que o povo está lidando com a crise econômica, os desvios éticos, as turbulências políticas e a propagação de doenças que deveriam estar erradicadas é assustadora.

 

Poucos se encorajam a expôr, publicamente, o descontentamento com esse país esfacelado. Para o governo e o Congresso, esse é o melhor dos mundos. Sem cobrança efetiva, continuarão cometendo os mesmos erros, usando os mesmos subterfúgios para desviar dinheiro público, comprometendo o futuro de gerações. Nos últimos anos, o país aumentou a idade média de estudo da população, e o acesso à comunicação ficou muito, mas muito mais fácil. É uma pena, porém, ver que nada disso se reverteu para uma melhor consciência política.

 

Brasília, 08h30min