A Caixa se tornou cabide de emprego para corruptos

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Se não fosse controlada pelo Tesouro Nacional, a Caixa Econômica Federal já estaria, há muito tempo, sob intervenção do Banco Central. Técnicos da autoridade monetária vêm alertando, sem cerimônia, que a situação patrimonial da instituição é preocupante, com um rombo superior a R$ 30 bilhões, buraco escamoteado por operações que não condizem com as melhores práticas do mercado. A Caixa se transformou, nos últimos anos, em um cabide de emprego para corruptos. Dois ex-vice-presidentes do banco — Geddel Vieira Lima e Fábio Cleto — estão presos. Desde 2014, a Caixa foi alvo de quase 10 operações conduzidas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público.

Por lei, para ser dirigente de instituição financeira, é preciso seguir uma série de recomendações. A primeira delas, ter reputação ilibada. Apesar de todas as restrições, as indicações políticas para a Caixa têm passado tranquilamente pelo crivo do Banco Central. Ou a autoridade monetária está sendo obrigada a deixar a legislação de lado, por pressão do Palácio do Planalto, ou está fazendo vista grossa para não comprar brigas políticas. Não é possível que figuras tão notórias, com históricos terríveis de corrupção, reúnam as condições necessárias para ocupar cargos estratégicos dentro de bancos públicos. Algo está muito errado nesse processo de avaliação.

Não é apenas nesse ponto que o BC pode estar sendo omisso. Um graduado técnico do Ministério da Fazenda chama a atenção para uma operação que está sendo negociada para cobrir o rombo na Caixa: um empréstimo perpétuo, sem data de vencimento, de R$ 15 bilhões pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Num país sério, diz o técnico, o BC seria o primeiro a gritar contra essa saída considerada esdrúxula. Mas, até agora, a autoridade monetária não se posicionou. Sem esse empréstimo do FGTS, a Caixa não terá como cumprir a regra de Basileia 3, seguida por todos os bancos do mundo. Na verdade, ressalta um assessor do ministro Henrique Meirelles, nem esses R$ 15 bilhões serão suficientes para cobrir o buraco patrimonial da Caixa.

“Estamos diante de um caso dramático, de anos de acúmulo de corrupção”, diz o técnico. “Ao longo de vários governos, a Caixa foi loteada, entregue a políticos, que transformaram o banco em um grande balcão de negócios”, acrescenta. Ele ressalta que os quatro vice-presidentes afastados da gestão do banco representam bem esse loteamento. Cada um deles foi indicado por um partido: PP, PR, PRB e MDB. “Não é possível esperar que uma instituição financeira, que vive de credibilidade, possa se manter de pé diante de tanta politicagem”, afirma. “Se fosse um banco privado, já teria quebrado.”

Limpeza

A Caixa, porém, é apenas uma das muitas empresas estatais entregues a políticos. O resultado desse loteamento todos sabem: prejuízos que acabam sendo cobertos pelo Tesouro — melhor, pelos contribuintes. Pelos dados do Ministério do Planejamento, são 148 empresas controladas pela União. Desse total, 18 são totalmente dependentes de recursos públicos. Precisam de pelo menos R$ 20 bilhões por ano para fechar as contas. É dinheiro que poderia estar sendo investido em saúde, educação, segurança pública, mas que acaba premiando a má gestão, os desmandos, a corrupção.

Não custa lembrar que, apenas nos governo de Lula e de Dilma Rousseff, foram criadas quase 40 estatais. A maioria, como se sabe, foi usada para premiar aliados políticos. Pouco ou nada produzem para estimular a economia do país. Na verdade, beneficiam grupos específicos, que trocam apoio no Congresso pelos interesses dos governos de plantão. O mais incrível é ver, diante de tantos descalabros, pessoas defendendo a proliferação de estatais, como se fosse algo saudável para o Brasil. Muitas, inclusive, criticam o loteamento político da Caixa Econômica, mas pregam um Estado inchado.

É difícil acreditar em um processo radical de limpeza da Caixa. Nesta sexta-feira, o Conselho de Administração do banco se reunirá e poderá afastar os outros oito vice-presidentes que estão na mira do Ministério Público. Mas deve prevalecer o recado já enviado pelos partidos da base aliada e verbalizado pelo presidente da instituição, Gilberto Occhi: “Não se deve satanizar as indicações políticas”. Ele próprio foi nomeado a pedido do PP, um dos partidos com mais pessoas investigadas pela Operação Lava-Jato. As indicações políticas na Caixa vão muito além do alto comando. Imperam também nos escalões mais baixos. Haja disposição para mudar isso.

Brasília, 06h37min

Vicente Nunes