Caixa em perigo

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Nenhum dos bancos públicos que o vice-presidente da República, Michel Temer, herdará, caso assuma o posto ocupado hoje por Dilma Rousseff, dará mais dor de cabeça do que a Caixa Econômica Federal. Técnicos do Ministério da Fazenda que acompanham os números da instituição dizem que a situação é de “terra arrasada”. Do jeito que está hoje, a Caixa não aguenta mais um ano sem a necessidade de um aporte do Tesouro Nacional.

Rateada entre o PT e o PMDB desde o início do governo Lula, a Caixa foi usada, sem constrangimento, para pôr em prática políticas populistas que só resultaram em prejuízos, como o Minha Casa Melhor, programa pelo qual os mutuários do Minha Casa Minha Vida podiam mobiliar seus imóveis. Ao mesmo tempo, o banco viabilizou negócios para lá de suspeitos com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Sabe-se que o FI-FGTS, que esteve sob o controle de Fábio Cleto, indicado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha, destinou dinheiro dos trabalhadores para financiar projetos de infraestrutura que, em boa parte, se mostraram um fracasso. Parcela expressiva dos recursos teve como destinatária a Odebrecht, a mais enrolada das empreiteiras pegas pela Lava-Jato surrupiando dinheiro da Petrobras. Segundo as investigações, as operações do FI-FGTS foram regadas a propina.

Os números mais recentes do balanço da Caixa explicitam como a saúde da instituição se deteriorou. O banco já tem prejuízo operacional, isto é, com seu próprio negócio. Só fecha as contas e apresenta lucro graças aos rendimentos de títulos públicos que mantém em carteira. No primeiro trimestre de 2014, os ganhos operacionais da Caixa foram de R$ 2 bilhões, saldo que se transformou em perdas de R$ 303 milhões entre outubro e dezembro de 2015.

Funcionários com medo

Na parceria entre o PT e o PMDB para comandar a Caixa, em vez do técnico, prevaleceu o político. Na ânsia de fazer o que o Palácio do Planalto queria, o banco controlado pelo Tesouro impulsionou demais sua carteira de crédito, que dobrou de tamanho em pouco mais de três anos. Esse crescimento criou uma bolha de inadimplência que só não estourou ainda porque muitas das dívidas em atraso estão sendo renegociadas e os prazos de pagamento, alongados.

Quando ainda era possível dar um choque de gestão na Caixa, no início do segundo mandato de Dilma, o governo preferiu seguir com a política de loteamento de cargos. A contragosto, o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, foi obrigado a aceitar a nomeação de Míriam Belchior para a presidência do banco. Sem qualquer conhecimento técnico, mas com fortes ligações com o PT, ela acabou por piorar o que já estava ruim. O Planalto optou por uma administração amadora quando o que a Caixa precisava era de um profissional competente e tecnicamente preparado.

Além de levar a instituição federal ao prejuízo operacional, Míriam destruiu o ambiente de trabalho. Sem qualquer jogo de cintura, pôs em prática um plano de reestruturação de cima para baixo que paralisou o banco. Desde então, praticamente nada de relevante é fechado nas agências. O quadro se agravou desde que a Câmara dos Deputados aprovou a abertura de impeachment de Dilma e encaminhou o processo para o Senado. Os funcionários estão com medo de assinarem qualquer coisa, suspeitando que possam ter problemas com a Justiça mais adiante.

Filme repetido

Técnicos do Tesouro temem que, com Temer no comando do país, os vícios que levaram a Caixa para a beira do precipício se repitam e a instituição afunde de vez, obrigando os contribuintes a socorrê-la. Pelo desenho que se está montando, o comando do banco deve ir para o PP, o partido com mais políticos pegos pela Lava-Jato. O nome mais forte para substituir Miriam Belchior é o de Gilberto Occhi, que foi ministro das Cidades e da Integração Nacional de Dilma.

Caso vingue esse rateio em troca de apoio no Congresso, que ninguém estranhe se a Caixa despontar nas páginas policiais. Por ser pouco transparente, não ter uma governança consolidada nem acionistas minoritários para cobrar resultados, o banco continuará sendo um bom instrumento para o enriquecimento ilícito de políticos. Para eles, pouco importa se, de tempos em tempos, o Tesouro Nacional for chamado para cobrir rombos decorrentes de má gestão e de negócios suspeitos. A viúva que se vire para lidar com malfeitos.

Brasília, 07h21min

Vicente Nunes