RODOLFO COSTA
Depois de longos 20 anos de negociação, finalmente, foi fechado o acordo de livre comércio entre o Mercosul, bloco que reúne Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, e a União Europeia. Acredita-se que a parceria resultará na ampliação das exportações do Brasil para a Europa entre US$ 100 bilhões, pelos cálculos do Ministério da Economia, e US$ 500 bilhões em 15 anos, segundo a Consultoria BMJ.
O fechamento do acordo teve como protagonistas os presidentes do Brasil, Jair Bolsonaro, e da Argentina, Maurício Macri. Do lado da União Europeia, o grande ator foi a Alemanha. A França resistiu ao máximo em assinar o documento, mas, no final, acabou cedendo.
Segundo Wagner Parente, presidente da Consultoria BMJ, especializada em comércio exterior, “o acordo tem um impacto sistêmico, além dos ganhos de acesso a mercado, destravando a agenda negociadora brasileira e trazendo experiência para o país nesse tipo de negociação” . Além disso, acrescenta ele, “será interessante observar como o Congresso Nacional lidará com a internalização do acordo, inédito em importância e magnitude.”
Parente ressalta que o acordo é o mais ambicioso já assinado pelo Mercosul e representa um sinal concreto da intenção de se abrir ao mercado mundial. “Sua conclusão fortalece institucionalmente o bloco, que vem, há alguns anos, sofrendo duras críticas pela falta de avanço da pauta de integração e pouca participação no comércio global, em meio às crises econômicas enfrentadas pelos Estados Partes”, diz.
Para ele, o acordo fortalece também a agenda de negociações comerciais em curso, podendo levar à conclusão de acordos com o Canadá, EFTA e a Coreia do Sul no curto prazo. Parente ressalta ainda que, similar ao que se observa no Brasil, a conclusão do acordo poderá também dar novo fôlego à agenda liberal nos parceiros do bloco e, em particular, na Argentina, onde o candidato à reeleição presidencial, Maurício Macri, vem perdendo popularidade e espaço nas pesquisas eleitorais para o candidato de esquerda. “Cabe destacar que o resultado das eleições argentinas poderá influir mais adiante no processo de internalização do acordo”, acrescenta.
Na avaliação de Welber Barral, sócio-fundador da BMJ, foi uma longa negociação, para a qual se esforçaram vários governos. “Ainda há um período longo para ratificação e implementação, mas já é um sinal positivo para comercio e investimentos entre Europa e Mercosul.”
O que foi negociado
O acordo eliminará as tarifas de importação para mais de 90% dos produtos comercializados entre os dois blocos.
• A maior parte dos produtos que não terão as tarifas eliminadas, terão cotas de importação sem a incidência ou com redução de tarifas.
• A eliminação das tarifas será diferente para cada produto, variando entre 0 e 15 anos.
• Além da eliminação de tarifas, o acordo terá mais de 20 capítulos, com regras sobre diversos temas como medidas sanitárias e fitossanitárias, compras governamentais, barreiras técnicas ao comércio, e comércio e desenvolvimento sustentável.
• O acordo introduz novas disciplinas as regras de comércio do bloco, com novos temas, para o Mercosul, como desenvolvimento sustentável, empresas estatais e a autocertificação de regras de origem.
Impactos no Brasil
• A aprovação de um acordo tão importante, que se arrasta há 20 anos, passando por quatro diferentes governos, é uma grande vitória política para a administração de Bolsonaro e, em particular, para a agenda liberal do Ministério da Economia.
• O acesso preferencial ao mercado europeu tem um potencial de aumentar as exportações brasileiras em até R$ 500 bilhões, em um período de 15 anos.
• Se por um lado o sucesso na conclusão do Acordo será usado para reforçar e avançar a narrativa de abertura comercial defendida pela equipe econômica; por outro lado, os efeitos práticos do acordo não deverão ser sentidos no curto prazo e diversos setores econômicos saem pessimistas do que foi de fato concedido e alcançado — incluindo segmentos do agronegócio.
• A redução tarifária de setores historicamente protegidos será um teste para a abertura comercial, permitindo uma visão realista de como a economia brasileira se comportará em um cenário de maior abertura.
• A concorrência com empresas estrangeiras no mercado doméstico poderá elevar a competitividade de determinados segmentos no médio e longo prazo, mas ao mesmo tempo elevará a pressão sobre o governo para melhorar o ambiente de negócios no país.
• Além disso, o Acordo dificilmente servirá a propósitos eleitorais ou será traduzido em apoio político em Brasília na discussão de outros temas, visto que a maior parte da população é alheia às questões internacionais.