ROSANA HESSEL
O Banco Central do Brasil (BC) avalia que o risco de crédito do setor financeiro nacional arrefeceu, “mas o cenário requer cautela diante da incerteza quanto ao prolongamento e aos desdobramentos da pandemia sobre a renda e o emprego”. A autoridade monetária, inclusive, reconhece que a demanda por crédito está menor neste início de 2021 e, por conta disso. não há necessidade de medidas para aumentar a liquidez do mercado.
Na avaliação do diretor de Fiscalização do BC, Paulo Souza, as estimativas do órgão mostram que, neste ano, a demanda por medidas de liquidez do mercado será menor do que as adotadas no ano passado, mas as ferramentas utilizadas estão disponíveis. “A aprovação do Orçamento mostra que deve haver algumas medidas do lado do Ministério da Economia, como o Pronampe (Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno), porém, magnitude menor pelo que temos percebido como demanda real. Mas todas as ferramentas estarão disponíveis”, afirmou o diretor, durante apresentação a jornalistas do relatório de Estabilidade Financeira (REF) referente ao segundo semestre de 2020, divulgado nesta terça-feira (27/04).
O diretor da autoridade monetária reconheceu que o cenário de 2020 foi bastante desafiador e as medidas do ano passado foram tomadas para evitar uma retração do mercado financeiro, diante das incertezas devido à pandemia. Agora, no primeiro trimestre de 2021, os dados de mercado observados pelo BC mostram um quadro mais agudo da pandemia a partir da segunda quinzena de março e que mostra uma aceleração da vacinação em junho que foi diferente do que ocorreu no ano passado. “A gente não tem percebido retração do mercado financeiro”, assegurou Souza. Ele reforçou que os bancos já fizeram as provisões necessárias e, por conta disso, “o BC não vê a necessidade de adotar medidas de aumento da liquidez do mercado”.
O estudo do BC avalia que o Sistema Financeiro Nacional (SFN) está preparado para enfrentar as incertezas relativas aos desdobramentos da pandemia. Para o BC, o SFN “está preparado para enfrentar as incertezas relativas aos desdobramentos da pandemia”.
Na avaliação de Souza, as condições estimulativas de crédito imobiliário “continuam favoráveis”, conforme os dados dos dois primeiros meses de 2021. A inadimplência deverá permanecer comportada neste ano e não há perspectiva de mudança e de aumento dessa taxa média acima de 4%, porque os dados mostram um cenário favorável do mercado externo, que pode ajudar a economia brasileira a crescer, “se houver uma aceleração no processo de vacinação”. Para o diretor, “é pouco provável” que a inadimplência atinja patamares mais elevados do que os de 2020.
O REF é uma publicação semestral destinada a apresentar o panorama da evolução recente e as perspectivas para a estabilidade financeira no Brasil. De acordo com o documento, ao longo de 2020, o SFN alcançou o maior valor histórico de provisões para ativos problemáticos, melhorou a capitalização e manteve liquidez confortável. No segundo semestre de 2020, “os programas emergenciais geraram relevante crescimento do crédito para as micro, pequenas e médias empresas, enquanto o estoque de crédito a grandes empresas ficou estável”, de acordo com o BC. O crédito às pessoas físicas voltou a crescer no ritmo anterior ao da pandemia. A redução nas taxas e os novos indexadores ofertados aos clientes impulsionaram as concessões do crédito imobiliário.
O relatório alerta contudo que, embora não seja o esperado, “esse cenário pode levar a perdas com crédito superiores às estimadas”. “Eventual reversão na atividade econômica, provavelmente, seria seguida por rápida recuperação, especialmente no segundo semestre, na medida em que os efeitos da vacinação sejam sentidos de forma mais abrangente”, informou o texto. “A rentabilidade dos bancos diminuiu com a crise sanitária, mas não representa risco para a estabilidade financeira. A pandemia inverteu a sequência de recuperação da rentabilidade que ocorria desde a recessão de 2015-2016. A expectativa para 2021 é de melhora.” Segundo a autoridade monetária, mantida a perspectiva de recuperação, as despesas com provisões tendem a ser menores, e as receitas de serviço, a se recuperar.
“Ao longo de 2020, o SFN alcançou o maior valor histórico de provisões para cobertura para Ativos Problemáticos (APs), melhorou a capitalização e manteve liquidez confortável. A atividade econômica doméstica recuperava-se de forma consistente até o final de 2020. Os primeiros sinais para 2021 também foram positivos, mas o cenário é de prudência, uma vez que esses dados ainda não contemplaram os efeitos do recente e agudo aumento de casos da covid-19”, destacou o documento do BC.
De acordo com dados da autoridade monetária, o funcionamento do SFN não sofreu interrupções significativas, devido aos bons níveis de capitalização, liquidez e provisões constituídas antes da pandemia. Em linha com a opinião do BCB em REFs anteriores, a gestão, a supervisão do SFN, bem como as medidas promovidas por governo federal, Conselho Monetário Nacional (CMN) e BC permitiram que as instituições financeiras atuassem como amortecedores ao choque pelo que passa a economia real.
“Ainda assim, houve impactos à saúde financeira do sistema, com a materialização de perdas decorrentes da redução da atividade econômica. O mercado continua preocupado com os desdobramentos da pandemia”, alertou o relatório, destacando que as entidades financeiras pesquisadas “mantêm atenção elevada com a inadimplência e com a redução da atividade econômica” e acreditam que atrasos na vacinação e o surgimento de novas cepas do novo coronavírus “podem prolongar a crise sanitária e exigir mais gastos para proteger a população vulnerável e incentivar a economia. Isso aumentaria o já elevado risco fiscal”.
No âmbito global, o sistema financeiro das principais economias segue resiliente, de acordo com dados do BC. “O risco sistêmico aumentou durante a pandemia, mas tem se reduzido nos últimos meses”, informou o relatório.