Por LUIZ RECENA GRASSI, de Portugal
Yevgueni Prigozhin ganhou um exílio na Bielorrúsia e teria evitado um banho de sangue na rusga contra Vladimir Putin, presidente da Rússia. Melhor assim, analisa a maioria no Ocidente. Dois itens, porém, merecem registro: o fato de ser o grupo Wagner de inspiração da FSB (ex-KGB); e, mais uma vez, a constatação de que os russos não sabem dar golpes.
Um russo com grande vivência sulamericana lembrava isso. O jogo deles é outro. Prigozhin é um aprendiz de feiticeiro que fez gazeta. Não aprendeu. Achava que podia gritar como se estivesse numa cozinha. Teve plateia ocidental até ontem, mas os equilibrados abriram os olhos e viram o engodo. O superdimensionamento do motim. Era briga por mais remuneração, e nem isso os amotinados levaram. O líder ganhou o exílio e a soldadesca, que é respeitada, promessas de incorporação ao Exército Vermelho. Os bombardeios foram mantidos. Putin segue forte, o resto é especulação. O tema era outro, a reconstrução da Ucrânia.
O Japão não está em guerra, mas deve faturar alto com os planos de reconstrução, estimados em 400 bilhões de euros. As reuniões sobre o assunto começaram na Inglaterra, outro país que ajudou pouco os ucranianos, mas que, na hora de receber, a conta virá boa e salgada. Os ingleses de Rishi Sunak, sugeriram que boa parte dessa verba seja paga pelos russos. O dinheiro bloqueado no mercado internacional serviria de apoio e alavancador de outras somas. A primeira reunião acabou com um único aceno favorável: a União Europeia promete 50 bilhões de euros para a Ucrânia reconstruir edifícios familiares, vilas e cidades, tudo o que terá sido danificado pela guerra. Não é pouco. O atual prejuízo seria de oito a dez vezes maior do que os 50 bilhões euros prometidos pela UE.
Outros países estão na linha dos japoneses. Entra dinheiro em caixa. Assim está a ser alinhavada a primeira ideia de reconstrução da Ucrânia. Os japoneses têm experiência: as bombas de Hiroshima e Nagasaki, ao fim da Segunda Guerra Mundial. As bombas foram lançadas pelos EUA. Hoje há medo da Rússia. A memória tem pernas muito curtas. Quem não está na fatura espera um pouco. Nada melhora o humor dos aliados, com dúvidas em relação às capacidades ucranianas de combate. Alguns dizem que a contraofensiva é um fracasso. O russo Putin não comprou a ideia. Disse que a capacidade ofensiva da Ucrânia ainda não acabou. Os ucranianos não se ajudam: dos sete itens obrigatórios para a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), só preencheram dois. Nos cinco restantes, um é a principal fonte de dor de cabeça: a corrupção crônica do governo de Volodimyr Zelensky e seus aliados.
O CORREIO SABE PORQUE VIU
Estava lá. Quando cheguei a Moscou, nos anos finais da Perestroika, ganhei conselhos de sobrevivência. Um detalhe chamou a atenção: uma sacola totalmente dobrável, que cabia num bolso. Servia para carregar tudo. Não era ainda uma crise aguda de abastecimento, mas dava sinais das situações que uns já passavam e que outros viriam a passar.
O apelido da sacolinha era especial: avochka. Sem maiores pesquisas, vem da palavra que, traduzida, indica talvez, pode ser, quem sabe, se calhar, se acaso… era a utilidade da avochka que tinha o tamanho das necessidades de cada um. O jogo do estoque de comida estava a todo vapor. E o da economia de energia também.
Primeira anedota de sucesso no começo de 1992. O cidadão moscovita chega na casa dele já noite, não pode acender a luz, o que lhe garante uma dolorosa joelhada num enorme saco de açúcar estocado. De gatas, consegue chegar até a cozinha e quase vai a nocaute pelas cabeçadas que deu em mortadelas penduradas no teto. Cansado e ferido, consegue abrir a geladeira atrás de água fresca. Acabou com duas mãos num vidro enorme de pepinos em conserva. Explodiu. Aos gritos procura a mulher e desabafa: “ Natasha, até quando vai continuar essa fome da zorra?!
Anedotas ou não, a burocracia bolchevique rolou na sabotagem ao final de Mikhail Gorbatchov e no começo de Boris Yeltsin.