ARTIGO: Rússia e Ucrânia testam novos limites

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Por LUIZ RECENA GRASSI, de Portugal

O guerreiro de Kiev levou muito tiro e não morreu em Bakhmut. Sua alma perdida ficou a vagar no teatro de operações. Assim, os novos amores e os outros demônios. Os cabelos da jovem desenterrada chegaram a 20 metros, a genialidade do escritor colombiano Gabriel García Márquez registrou. As balas nervosas fazem vítimas, como o guerreiro de Kiev. Só não se sabe se, igual ao personagem de García Márquez, cresceram-lhe os cabelos aloirados.

Em Bakmhut, não há, como numa obra do escritor colombiano, outro papel que não seja a morte de pessoas e a destruição de edifícios. Como com a jovem personagem, resta saber o que sobra. E não é livro, mas guerra, só guerra. Volodimyr Zelensky segue a viajar pelo mundo a pedir o que seja, de armas novas alemãs e seus manuais a colaborações da Suécia, da Islândia, da Finlândia. Só da Alemanha seriam pouco mais de 2 bilhões de euros. E outros países também foram convencidos a abrir a sacolinha.

A Rússia abriu os trabalhos de um aprazível fim de semana com mais de 50 drones sobre Kiev, na maior ofensiva contra a capital dos ucranianos. Diz o balanço, divulgado pelo pessoal de Zelensky que 90% das armas de ataque foram destruídas. Morreu uma pessoa e uma teria ficado ferida. Em seguida, foi a vez de a Ucrânia atacar Moscou e outras regiões ocupadas pela Rússia com drones, deixando ao menos dois feridos.

Na Praça Vermelha, o chanceler Sergei Lavrov passa atestado ao medo da contraofensiva. Caça F-16 dos americanos é mais do que ameaça. É provocação. E as promessas de retaliação estão garantidas contra os países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), principalmente, Alemanha, Inglaterra e França, os que até agora mais colaboraram com a Ucrânia e  que tudo fizeram contra a Rússia, para condenar os russos a todos os crimes da humanidade.

Enquanto isso, a menina de García Márquez continua a deixar crescer os cabelos e o guerreiro de Kiev dorme um plácido sono de morte. Com armas novas ou recauchutadas, os ucranianos garantem ter reconstituído musculatura bélica e estariam aptos, prontos para não deixar o verão arrefecer. Querem brigar para valer.

Prigozhin, o general aloprado e mercenário, começou a entregar ao Exército Vermelho o que teria sobrado de destruições em todos os pontos ucranianos de Bakhmut. E, mais uma promessa, o exército de Zelensky estaria pronto para ir à luta pela Central Nuclear de Zaporijia, bem como estaria ainda mais pronta para a defesa e para uma dura, muito dura contraofensiva. Por isso, Sergei Lavrov estaria a por as barbas de molho.

O CORREIO SABE PORQUE VIU

Estava lá. “Vocês e o Gorbatchov conseguiram em menos de uma década o que a CIA e os reacionários do mundo não lograram em 70 anos: acabar com a União Soviética”. Ela passou a ser a “extinta URSS” e isso deixava mal o antigo regime. A antiga professora estava irada. Passava dos 40 e o tempo, cruel, não lhe sorria mais. Dois casamentos mal sucedidos, sem prole, as medidas físicas brigavam no limite com as batas indianas da moda, mas isso não era importante.

O fantasma do desemprego era pior. Feio, ameaçador na prática. A Nomenklatura deu-lhe um pai importante, com carreira diplomática e bons postos nos tempos ideológicos da Guerra Fria. Criada em outros países, como Índia e outros de fala inglesa. Então, educação na escola britânica, inglês impecável. A revolução cubana trouxe um plus em língua hispânica e um marido.

Na volta a Moscou, a escola do partido foi porto natural. Professora de idiomas para diplomatas, funcionários, espiões, jornalistas, todas as funções necessárias ao regime passavam por ela, que sabia comercializar esse intelecto. Só não sabia dominar a ira nem o que sobrou da extinta URSS. E a dosagem de peso igualmente foi esquecida. O sistema manteve-se cruel. E as graminhas não voltaram. Pobre professora…

Vicente Nunes