Artigo: Matriochka pode atrasar o parto

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Por LUIZ RECENA GRASSI, de Portugal

Os dias recentes de Vladimir Putin não são ótimos. É o que pensa a maioria dos analistas de guerra e política internacionais. A maioria dessa maioria é franca, descaradamente a favor da Ucrânia e contra Putin, mistura de sentimentos contra russos e contra soviéticos.

A situação surpreende e choca observador que chega mais tarde ao cenário europeu, pensando que o fim do bolchevismo tivesse mudado esse quadro que mistura saudades atemporais da monarquia russa e de um país pobre, ignorante, de religiosidade fanática. E ódio ao comunismo. Coquetel alimenta a ideia reincidente de que, um dia, acabariam com a Rússia.

O ministro Serguei Lavrov foi à Organização das Nações Unidas (ONU) exigir execução do trato de escoamento de cereais via Mar Negro. Não quer mais sabotagem nem ataques a Sebastopol. Senão desembarca do acordo daqui a 15 dias. Antes, os dois lados devem resolver questões em Kherson, “Mãe” das batalhas e segredo de Volodimyr Zelensky no fim deste ano.

Russos perdem desafio da propaganda e não conseguem ser convincentes nem quando dizem que vão recuar, retirar tropas da região. Evacuar civis é bom, mesmo acusados de constranger gente. Ucranianos querem alvos, humanos ao que parece. Guerra não é bonita; é feia, muito feia, os russos usarão o que têm ou puderem, lembra raro analista militar não domesticado pelos Estados Unidos, ao explicar porque o Exército Vermelho usa mísseis, drones grandes e pequenos para deixar mais da metade da Ucrânia sem luz, além de duplicar defesas e reforçar posições em Kherson.

Verdadeira fortaleza, garantem americanos, europeus e Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Quem estudou a Segunda Guerra é unânime: Putin quer repetir Stalingrado onde russos seguraram e enfraqueceram os nazistas. Agora, repetem com tecnologia, novidades e apoio. A Ucrânia também recebe: brinquedos bélicos modernos, armas velhas, poucas novas. Rússia com drones do Irã, soldados treinados para encarar inverno e ucranianos em maior número, mas já não tanto. Tempos difíceis para exército sem robusta estrutura.

No Kremlin, pressão internacional. Os lados se preparam e, mesmo que a boneca russa demore a sair uma da outra, esperam o pleito americano. O frio assusta Biden. Não quer pagar a conta. Eleição pode alterar desenho do Congresso, pedir papel no teatro da guerra. Daí o frágil, tênue sinal de paz animar forte os atores no fim semana. EUA, UE, Rússia, até a Ucrânia admitem que é possível. Antes de o inverno chegar.

O CORREIO SABE PORQUE VIU

Estava lá. Estados Unidos e Rússia são lados da mesma moeda. Com maior ou menor intensidade, rusgas, brigas fazem parte do folhetim de que foi auge a Guerra Fria. Armavam mútuas situações de perigo e delicados momentos de disputa. Pregavam-se peças, ajudavam-se, iam ao limite da possível bagunça nuclear. Tudo continuava porque ainda havia inimigos comuns, a China por exemplo. Até o pós-Perestroika de Putin, Trump, Biden e por ai vai.

Na Perestroika, os yankes desembarcaram como se fosse a Normandia. Só armas eram outras: caixas de Malboro. As mocinhas moscovitas queriam fumar e festejar. Malboro era o requinte. O cigarro russo, além de ruim, não tinha filtro. A mocinha requintada ia para a festa animada, animada, nunca se cansava. Os Johnies, funcionários gringos e diplomatas, eram Cinderelas, dormiam. Contavam tudo, diziam as moçoilas que tinham um pé no mundo da espionagem.

Fios, escutas, toda a parafernália da KGB teria sido testada e amaciada no grande prédio americano entre a estação de metrô e a embaixada brasileira em Moscou. Soviéticos contavam o conto e inventavam outro ponto. Tudo cresceu e americanos depois de muitas reformas com material e mão-de-obra da URSS, desistiram: foi abaixo o prédio velho e construído um novo com importação total de casa. Dizem que até hoje não vazou um grito.

Vicente Nunes