Aposentado que continuar trabalhando não precisa recolher INSS, diz Justiça

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ALESSANDRA AZEVEDO

Aposentados que voltarem a trabalhar não são obrigados a contribuir para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Pelo menos esse é o entendimento da Justiça federal de Assis, em São Paulo, que autorizou, pela primeira vez, uma mulher nessa situação a deixar de descontar o valor sobre a folha de salário. O juiz Luciano Tertuliano da Silva decidiu que ela não tem por que contribuir ao INSS, já que, pela lei, não tem direito a outros benefícios previdenciários, como auxílio-doença, por exemplo.

Se não há garantia de contrapartida por parte da Previdência Social, não existe motivo para a cobrança, entendeu o juiz. Além de liberar a trabalhadora de novas contribuições, ele obrigou a União a ressarci-la pelos valores pagos durante os cinco anos de trabalho, desde que ela se aposentou e conseguiu o outro emprego vinculado ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS). A mulher receberá R$ 42.634,48, valor que será corrigido pela inflação.

Tertuliano da Silva definiu a cobrança do INSS nesses casos como um “comportamento malicioso, regado de astúcia”. Para ele, a obrigação afronta os princípios constitucionais da isonomia, da dignidade da pessoa humana e da moralidade pública. Não há justificativa para a exclusão de cobertura previdenciária de quem continua trabalhando e contribuindo para o sistema, ainda que aposentado, entendeu o magistrado. O INSS ainda pode recorrer.

Embora a decisão não vincule outros juízes a decidirem da mesma forma, ela sinaliza uma nova maneira da Justiça olhar para estes casos, acredita o advogado especialista em direito previdenciário João Badari, sócio do Aith, Badari e Luchin Advogados. “A posição do juiz demonstra que o princípio contributivo-retributivo da Previdência Social não está sendo levado em consideração. Atualmente, o aposentado que continua na ativa apenas contribui ao INSS e não consegue nenhum tipo de retribuição, ou seja, não consegue nenhum tipo de revisão do valor atual do benefício mensal”, criticou.

Entenda

Pela lei brasileira, aposentados que resolvem voltar ao mercado de trabalho são obrigados a contribuir para o INSS da mesma forma que os outros trabalhadores em atividade. Mas, ao contrário dos demais contribuintes, os aposentados não têm direito aos benefício previdenciários, como auxílio-doença ou licenças. No máximo, poderão receber salário-família e terão direito à reabilitação profissional, se precisarem.

Na prática, um empregado que já se aposentou e continua trabalhando receberá apenas a aposentadoria caso sofra um acidente de trabalho, por exemplo. Caso fique doente, não importa a gravidade, também não receberá auxílio-doença. Essa diferenciação está explícita na Lei 8.213/91, que diz que “o aposentado pelo RGPS que permanecer em atividade sujeita a este regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado”.

A regra prejudica quase 6 milhões de brasileiros que continuam trabalhando após a aposentadoria, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na prática, um em cada quatro aposentados no país continua ativo no mercado de trabalho. Quase metade dessas pessoas precisam trabalhar por não conseguirem se sustentar apenas com o valor do benefício — dois terços dos aposentados brasileiros recebem apenas um salário mínimo (hoje, R$ 937), e 60% são chefes de família, que precisam arcar com todos os gastos da casa.

Vicente Nunes