Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados nesta quarta-feira (01/09), o PIB recuou 0,1% entre abril e junho, na comparação com o primeiro trimestre de 2021, puxado pelas quedas de 2,8% na produção agrícola, de 0,2% na produção industrial e de 3,6% nos investimentos na mesma base de comparação. O crescimento de 0,7% no setor de serviços, que é o que mais emprega, não foi suficiente para evitar o primeiro dado negativo após três trimestres positivos consecutivos. O consumo das famílias, principal motor do PIB, no entanto, andou de lado com variação de 0% no mesmo período.
Logo, a frustração tomou conta do mercado em relação ao processo de recuperação da economia brasileira em meio às crises institucionais provocadas pelas declarações irresponsáveis do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e da sua base de apoiadores mais ferrenha. O consenso é que a economia tem muitos desafios e não está “bombando” como o ministro da Economia, Paulo Guedes, vinha afirmando nas videoconferências com o mercado financeiro nos últimos dias.
A sinalização é de nova piora nas projeções macroeconômicas daqui para frente, apesar do avanço da vacinação, tanto deste ano quanto do ano que vem. A inflação cada vez mais alta, especialmente, porque esse novo reajuste da tarifa de energia que passou a vigorar em setembro não deverá ser o último do ano, e, consequentemente, juros também elevados, o que pode frear o processo de retomada em curso, embora gradual.
O banco norte-americano Goldman Sachs, por exemplo, revisou de 5,4% para 4,9% a previsão de expansão do PIB do Brasil neste ano, e alertou para os riscos da crise energética. A instituição destacou que, apesar de esperar um cenário mais positivo em relação à recuperação da atividade por conta dos avanços da vacinação, isso poderá ser mitigado “pelo aumento das taxas de juros, alta inflação, altos níveis de endividamento das famílias, problemas persistentes da cadeia de abastecimento que assolam várias indústrias manufatureiras e aumento do ruído político e da incerteza política”.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, inclusive, admitiu, hoje, que as estimativas para o PIB deste ano devem ser revisadas para baixo novamente. “A projeção do PIB para 2021 estava em 5,22%, com o número de hoje achamos que pode ser revisada um pouquinho para baixo, vamos observar”, afirmou o ministro, hoje, em audiência pública na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados. Ele citou a mediana atual das previsões do mercado no boletim Focus divulgada ontem, de 5,22%. Essa projeção foi reduzida pela terceira semana consecutiva, refletindo uma frustração com o processo de retomada do PIB neste ano.
O pessimismo é maior em relação a 2022, aliás, é crescente, especialmente, por conta das incertezas que já são naturais em um ano eleitoral, por conta da forte polarização e das constantes ameaças às instituições democráticas. Na semana passada, a mediana das previsões do mercado para a expansão do PIB do próximo ano foi reduzida de 2,1% para 2%, mas analistas afirmam que a tendência é que as novas previsões passem a convergir para 1,5%, de acordo com o economista-chefe da XP Investimentos, Caio Megale. “A surpresa do PIB é que ele veio um pouco mais baixo em relação ao trimestre anterior, que tinha uma base alta”, destacou.
Megale contou que as quedas na agricultora, de 2,8%, e na indústria, de 0,2% no segundo trimestre ficaram abaixo da previsão da XP, mas o crescimento do setor de serviços foi menor do que o esperado. Contudo, ele avaliou que o segmento de serviços ainda deve apresentar dados melhores nos próximos trimestres, devido ao processo de reabertura das atividades em curso por conta da vacinação contra a covid-19. Por conta disso, ele manteve as atuais projeções de avanço do PIB neste ano, de 5,5%. “Não tem necessidade de mudança”, disse. Contudo, ele reconheceu que a taxa de alta de 2,3% do PIB em 2022 precisará ser revisada para baixo.
“Nossa preocupação maior é com o crescimento do ano que vem. De fato, nas últimas quatro semanas, houve uma piora importante nas condições de liquidez do mercado e nas expectativas de chuvas e de racionamento. A inflação está pressionada e vai fazer o Banco Central subir a Selic (taxa básica da economia), para acima de 7%, ou de 7,5%, o que vai prejudicar a atividade. Essa combinação de fatores, somada com o cenário de desaceleração global e de incertezas intrínsecas de um ano eleitoral, trás um cenário desafiador para a nossa projeção de 2,3% aos olhos de hoje. Por isso, eu diria que devemos revisar porque, no mínimo, devemos incorporar os efeitos da crise hídrica”, explicou Megale.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, que tem uma das previsões mais conservadoras para o PIB deste ano e do próximo, esperava alta de 0,4% no PIB do segundo trimestre, também sinaliza viés de baixa em suas projeções, mas manteve as estimativas atuais para o PIB, de altas de 4,7%, em 2021, e de 1,4%, em 2022. Contudo está reavaliando cenário e, por enquanto, piorou as projeções para a inflação e para a taxa Selic.
“E lá vamos nós, novamente, com outra revisão de cenário. Para nós economistas, ter que revisar o cenário com frequência para baixo é sinal preocupante. E estamos fazendo isso cada vez mais nos últimos meses e não tem como ser diferente agora com a revisão da tarifa de energia para setembro”, escreveu Vale, em documento da consultoria divulgado aos clientes após os dados do PIB.
Por conta da forte pressão inflacionária, a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) poderá chegar a 10% no mês de setembro, pela novas estimativas de Vale, que prevê crescimento de 0,5% no PIB do terceiro trimestre e queda de 0,5% nos últimos três meses. “Para 2022, ajustamos a expectativa do IPCA para 4,7% e, consequentemente, a Selic também terá que ser maior. Esperamos o ciclo final terminar em 8,5%, ficando ficando nesse patamar ao longo de 2022 inteiro”, alertou.
Fernando Honorato, diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, revisou de 2,2% para 1,8% a previsão de crescimento do PIB de 2022, devido ao aumento das incertezas domésticas, que incluem os riscos de racionamento e as chances desaceleração global. “Não parece difícil restaurar uma perspectiva mais favorável para o próximo ano, afinal o crédito segue em expansão, o emprego está defasado em relação ao ciclo econômico, as empresas estão capitalizadas e houve reformas nos últimos anos. Mas um forte ciclo de expansão do consumo e dos investimentos requer redução da redução das incertezas. Enquanto essas persistirem, a variância das projeções do cenário seguirá maior do que a usual”, destacou o comunicado.