A surpresa nos dados do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro, está fazendo analistas voltarem para as planilhas para corrigirem para cima as projeções para a inflação oficial deste ano e do próximo. Eles, inclusive, não descartam novas altas em torno de 1% para os próximos meses e taxa de 10% no IPCA de 2021 fechado, por conta do aumento da disseminação da carestia entre os produtos pesquisados para 67%. O consenso em formação é de que, além de estourar o teto deste ano, de 5,25%, o IPCA ficará acima do teto de 5%, em 2022.
Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados nesta quarta-feira (10/11), o IPCA acelerou em relação a setembro e avançou 1,25% em outubro, a maior variação para o mês desde 2002. A mediana das estimativas do mercado, de acordo com dados do boletim Focus, do Banco Central, era de 1%. No acumulado em 12 meses até o mês passado, o indicador subiu 10,67%, acima dos 10,25% contabilizados nos 12 meses encerrados em setembro. Segundo os analistas, se o Banco Central não acelerar a alta da taxa básica da economia (Selic), atualmente em 7,75% anuais, será difícil fazer com que o IPCA do ano que vem fique abaixo de 5%. E, para isso, de acordo com eles, a Selic poderá subir ao longo do ano acima de 12% e não está descartada a possibilidade de os juros voltarem para 14% diante da piora do cenário fiscal e da inflação mais forte no exterior.
“A inflação chegou a tal nível que a inércia começa a pressionar o IPCA mês a mês, devido aos reajustes de preços. E isso indica que a inflação está muito disseminada e não é apenas por conta dos preços administrados e, portanto, ficará próxima de 1% em novembro e em dezembro, e, por conta disso, o Banco Central precisará dar uma paulada maior nos juros”, destacou Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust. Em princípio, a previsão de Velho para o IPCA de novembro era de 0,67%, mas ele admitiu que vai revisar para cima. Ele estimou alta de 1,13% no IPCA de outubro. “Estou assustado. Fiz uma simulação e deu 0,90% para novembro e 1,25% para dezembro”, destacou.
” A decomposição do IPCA reforça nosso cenário de inflação próxima de 10% e superior ao teto em 2022, pressionando a aceleração da Selic e/ou um nível mais elevado até maio de 2022″, destacou Velho. Ele lembrou que a aceleração do indicador do custo de vida nos Estados Unidos, o CPI, de 6,2% ao ano — o triplo da média da meta, de 2% –, reforçará a alta do dólar no exterior, mudando a tesa da inflação de “transitória para prolongada”, com aumento da probabilidade de alta dos juros até junho 2022 na curva futura.
Fábio Romão, economista sênior da consultoria LCA, contou que, devido ao resultado de outubro, revisou a previsão para o IPCA de novembro de 0,82% para 0,88%, mas não descartou a possibilidade de o indicador ficar perto de 1% nos próximos dois meses. A nova projeção para o IPCA acumulado em 12 meses no fim do ano passou de 9,7% para 10%. “Essa revisão ocorreu por conta do dado do IPCA divulgado hoje. Mas acreditamos em uma desaceleração da inflação no mês de novembro na comparação com outubro, por conta da sazonalidade e das ofertas da Black Friday, no fim do mês”, destacou. As passagens aéreas, segundo Romão, estão apresentando queda de 6% após o salto de 33,8% em outubro. Por enquanto, Romão manteve as projeções para o IPCA de 2022 em 5%.
O especialista em inflação do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), André Braz, também não descarta alta de 1% no IPCA em novembro, por conta, principalmente, dos reajustes dos combustíveis. “A gasolina e o diesel vão continuar contribuindo para a inflação de novembro, que deverá ficar em torno de 1%, exatamente pela força dos combustíveis no IPCA”, afirmou, pois os combustíveis representam 50% da alta da inflação no ano.
O pesquisador do FGV Ibre lembrou que a política fiscal complementa a política monetária, e, como o governo está errando nessa área, a incerteza crescente sobre a garantia de responsabilidade no controle das contas públicas aumenta e faz com que o real permaneça desvalorizado. “Sem a política fiscal, haverá um aumento dos juros em 2022 que vai prejudicar o crescimento da economia”, alertou. Ele passou a prever alta de 10,1% no IPCA deste ano.
Pelas projeções de Arnaldo Lima, diretor de Estratégias Públicas do grupo Mongeral Aegon (MAG), em novembro, o IPCA deverá avançar 0,90% “em virtude da alta substancial de combustíveis”. “Com o resultado de hoje, elevamos nossa projeção de 9,7% para 9,9% para o IPCA em 2021”, disse. Contudo, ele manteve “neste momento”, a previsão de 4,5% para o IPCA em 2022.
Vale lembrar que a mediana das estimativas do mercado para o IPCA deste ano vem sendo revisada para cima há 31 semanas consecutivas. No último boletim Focus, a previsão para a alta do indicador estava em 9,33%, no fim deste ano, e em 4,63%, no fim de 2022. As projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2022 no Focus recuaram de 1,2% para 1%, e analistas reconhecem que, se descontarmos o carregamento estatístico do PIB deste ano, em torno de 1,5%, na verdade, a economia já está em plena desaceleração e caminha para uma recessão.
A última vez em que o IPCA encerrou um ano acima de 10% foi no fim de 2015, quando o indicador da inflação oficial acumulou alta de 10,67%, mesmo patamar atual. Esse descontrole nos preços, devido às incertezas em relação ao controle das contas públicas, ajudou na aprovação da regra do teto de gastos, emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação. Agora, com a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios pela Câmara dos Deputados, ontem, essa última âncora fiscal ruiu, pois o governo está ampliando o limite antecipando a alteração do indexador, além de dar calotes nas dívidas judiciais e, com isso, agravar o endividamento futuro do país.