ROSANA HESSEL
Em meio à recessão sem precedentes provocada pela pandemia de covid-19, o debate sobre reforma tributária ganha corpo de novo no Congresso, apesar da falta de consenso no governo. Contudo, as propostas em circulação não apresentam dados mais atualizados e consolidados sobre os impactos das mudanças, de acordo com especialistas. Eles reclamam que há um “deserto de dados” para fundamentação dos projetos de forma mais clara.
“Estamos discutindo vários projetos de reforma tributária sem ter um diagnóstico atualizado da arrecadação e, sobretudo, sem apresentar simulações dos impactos”, critica o especialista em contas públicas José Roberto Afonso, professor do IDP e um dos autores da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), em entrevista ao Blog.
Afonso, juntamente com os economistas Vagner Ardeo, vice-diretor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV) e Geraldo Biasoto, professor e doutor em economia pela Universidade de Campinas (Unicamp), escreveram um artigo que aponta críticas à nota técnica do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) sobre os impactos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45/2019, reforma tributária da Câmara que prevê a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), proposto pelo CCiF.
“A nota, preparada para o CCiF, não foi assinada pelo Centro, e até tentou calcular os impactos e concluiu que, no caso da PEC 45, haveria um forte aumento do PIB (Produto Interno Bruto) se o IBS for aprovado. Ela tem o mérito de ser um cálculo, no meio de um deserto de dados. Mas, peca por não usar uma modelagem própria para avaliar uma reforma”, destacou Afonso, em entrevista ao Blog.
No paper “Críticas à (única) nota sobre impactos da PEC 45”, ainda não publicado mas ao qual o Blog teve acesso, principal conclusão é que simplificação melhoraria os negócios e aumentaria a produção. “A proposta não entrega e aumenta a complexidade do sistema. O custo de pagar os impostos será duplicado durante a transição, com dois sistemas convivendo em simultâneo, e são feitas novas exigências não aplicadas no resto do mundo, como atestar o pagamento do imposto pelo fornecedor”, alertou Afonso.
Os economistas destacaram no artigo que, neste momento, toda a energia política dos brasileiros poderia estar sendo direcionada a controlar a epidemia e a combater a recessão, ao contrário de ser desperdiçada em discussões de reforma tributária, ainda mais quando alguns projetos só virão a vigorar em anos ou década”. “Vale apontar que os movimentos de melhoria do comportamento do PIB potencial apontados pelo estudo estão fortemente ancorados nestes supostos, como mostra o anexo do documento. Infelizmente, o caráter heroico dos supostos aponta para resultados complemente deslocados da realidade”, afirmou o documento.
De acordo com o artigo, em nenhum outro país, neste momento, está-se discutindo reforma tributária de forma tão intensa como no Brasil, isso em meio à inédita pandemia internacional de saúde no pós-guerra. “Nenhum especialista sugeriria e nenhum governo imaginaria aumentar a tributação sobre as vendas no mercado doméstico, sobretudo sobre os serviços, o epicentro mundial da recessão, com inevitável aumento de sua carga tributária global. Respeitam sempre a lição clássica de que aumento de tributo que reduz a renda disponível e, sobretudo, o consumo interno, o que poderia disparar uma segunda onda recessiva”, acrescentaram os autores.
Eles resumem que nota conclui que a PEC 45/2019 teria um poder de impacto positivo sobre o PIB potencial brasileiro de 20,2% em 15 anos e de 24% no longo prazo. Impacto este decorrente, principalmente, do aumento da produtividade total dos fatores (14,4%, em 15 anos, e 16,4%, no longo prazo) e do aumento dos investimentos em ativos fixos, que gerariam uma elevação do estoque de capital de 12%, em 15 anos, e de 15,6%, no longo prazo.