Ajuste fiscal de Meirelles está manco

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POR ROSANA HESSEL

Sozinha, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita o aumento dos gastos públicos à inflação do ano anterior não será suficiente para reverter o descalabro das finanças do país. Depois de analisarem, com lupa, o projeto encaminhado pelo governo ao Congresso, especialistas ressaltam que o ajuste fiscal ainda está manco. Para reverter todo o estrago que se viu nos últimos anos, será preciso medidas duras nos próximos meses e ações de mais longo prazo, como a reforma da Previdência, que, neste ano, pode ter deficit superior a R$ 200 bilhões se somados os rombos do Instituto Nacional do Seguro Social INSS) e dos sistemas de aposentadoria e pensões de servidores e militares.

O economista Felipe Salto é taxativo. “O governo está apostando todas as fichas na PEC do teto. Mas umas das primeiras lições da economia é não colocar todos os ovos em uma única cesta, o que é muito arriscado. É preciso ter uma agenda mais estruturada e mandar logo um conjunto de medidas de reformas para o Congresso Nacional trabalhar”, diz ele, que é coautor do livro Finanças públicas: da contabilidade criativa ao resgate da credibilidade. No entender dele, o governo deve agir rápido tão logo o Senado aprove o impeachment definitivo de Dilma Rousseff. “Não há tempo a perder”, frisa.

A ansiedade é grande. E a complacência do mercado com a equipe chefiada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, está prestes a acabar se o governo não avançar os passos. Na verdade, o que mais se está vendo são recuos e sinais contraditórios. No projeto que renegocia as dívidas de estados, resultando um alívio de R$ 50 bilhões a essas unidades da Federação, o presidente interino, Michel Temer, fez uma série de concessões que vão resultar em aumentos das despesas com servidores, o que não é recomendável num momento em que se promete um ajuste fiscal consistente.

Doutora em economia e pesquisadora do Peterson Institute for International Economics (PIIE), em Washington, Monica de Bolle não esconde a apreensão. “Diante de tudo o que estamos vendo, a PEC dos gastos precisará ter muita substância para ser eficaz. De nada vai adiantar se o governo não conseguir encaminhar a reforma da Previdência, mesmo que não seja a ideal. O fato é que, neste ano, ninguém vai querer mexer nesse vespeiro, já que, em outubro, haverá eleições municipais”, avisa. Na avaliação dela, o voto de confiança ao governo estará com os dias contados após a confirmação do impeachment de Dilma. “Até lá, o governo Temer precisa explicar melhor em que consiste o ajuste fiscal”, assinala.

Para os especialistas, a PEC tem problemas, apesar de ser positiva ao, finalmente, propor um limite para o gasto público, algo fundamental para o equilíbrio das contas públicas, que foram desmanteladas nos últimos anos, devido à contabilidade criativa de Dilma. Desde 2014, o setor público está operando no vermelho e o prazo para o conserto dos estragos será longo. Há quem acredite que, mesmo com a PEC, as despesas terão crescimento real até 2020. Por isso, a cobrança por medidas de curto prazo. Nos 12 meses terminados em junho, o governo registrou deficit de R$ 151,2 bilhões, bem próximo do rombo definido como limite para este ano, de R$ 170,5 bilhões.

Brasília, 00h01min

Vicente Nunes