Ainda é muito cedo para comemorar

Compartilhe

ROSANA HESSEL

A prévia do Produto Interno Bruto (PIB) do Banco Central, o IBC-Br, veio positiva, com alta modesta de de 0,17% em outubro. Mas esse crescimento observado na economia neste fim de ano merece cautela nas análises antes de comemorações precoces. O indicador mensal do BC divulgado nesta sexta-feira (13/12) indica uma desaceleração em relação a setembro, cujo dado foi revisado de 0,44% para 0,48%. Em termos anuais, o PIB real cresceu 2,13% em outubro, um pouco acima dos 2,10% em setembro.

Alberto Ramos, do Goldman Sachs, ressaltou que o PIB real ainda está “6,1% abaixo do pico do ciclo de dezembro de 2013 e apenas 5,6% acima do nível cíclico de dezembro de 2016, tornando a recuperação cíclica mais fraca já registrada”. Ele lembrou que o desemprego ainda está elevado e a economia opera abaixo da sua capacidade. “O progresso em direção à consolidação fiscal nos níveis federal e subnacional continua sendo, em nossa avaliação, essencial para ancorar o sentimento do mercado, apoiar o sentimento do consumidor e do negócio e alavancar o que tem sido até agora uma recuperação superficial”, escreveu Ramos em seu comunicado ao mercado.

Logo, a conclusão que podemos chegar é que o país está crescendo muito, mas muito pouco. E, em grande parte, graças ao estímulo que o governo deu ao consumo neste fim de ano, ampliando a liberação dos saques de contas ativas e inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Se não fosse essa medida expansionista, que foge da cartilha liberal e ortodoxa do ministro da Economia, Paulo Guedes, o resultado da economia seria pior e os indicadores recentes não estariam fazendo os operadores da bolsa comemorarem com altas efusivas do Índice Bovespa.

Fora da realidade

Apesar de os dados não serem muito animadores, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) parece descolada da realidade e bate recordes, consecutivos. Opera acima de 112 mil pontos hoje novamente, apesar de o eventual acordo entre China e Estados Unidos ser prejudicial para as exportações do Brasil. O país deixará de vender seus produtos para os chineses, que darão prioridade para as commodities norte-americanas.

Uma economista atenta ao mercado me explicou o motivo dessa euforia na Bolsa: a carência de notícias boas nos últimos anos. Qualquer um fica entusiasmado em excesso com uma fagulha que seja para realizar ganhos, o máximo possível, no curto prazo, pois o futuro continua incerto.Vale lembrar que, no ano que vem, as chances de aceleração mais robusta via consumo devem ser pequenas, principalmente, se houver acomodação do governo em um ano eleitoral. O desemprego ainda é muito alto. Ele pode ter deixado de cair, mas é bom lembrar que os números de quem desistiu de procurar emprego continua crescendo e bate recordes e isso não pode ser ignorado. O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo e piorou no ranking global. Logo, a recuperação da economia em curso, embora gradual, ainda corre riscos, especialmente, se a agenda torta de costumes do presidente Jair Bolsonaro ocupar mais espaço sobre a econômica, algo que atualmente vem sendo ignorado pelo mercado ávido em realizar lucros.

A Standard & Poor’s, por exemplo, apesar de ter modificado a perspectiva da nota de risco do Brasil de estável para positiva e ter sinalizado uma revisão “dentro de dois anos”, se o crescimento do país superar as expectativas e a trajetória de avanço da dívida pública se estabilizar, não apresenta previsões muito animadoras da economia brasileira. A agência, por exemplo, prevê alta de 2% no PIB brasileiro no ano que vem, abaixo da média do mercado. Além disso, estima que o PIB per capita em dólares deverá permanecer no mesmo patamar de 2019, de US$ 8,7 mil, no ano que vem e, até 2022, continuará crescendo pouco, não conseguindo recuperar os patamares de 2012 e 2013, US$ 12,3 mil. Portanto, muita coisa ainda precisa ser feita para se comemorar de verdade. O caminho pode estar correto, mas é preciso evitar atalhos tortos.

Vicente Nunes