Os investidores reconhecem que as delações premiadas da Odebrecht têm poder de sobra para fazer um grande estrago no governo. Não à toa, é latente a tensão em relação à lista dos políticos que serão denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PRG) ao Supremo Tribunal Federal (STF) e que poderão ser alvos de inquéritos caso o ministro Edson Fachin aceite os argumentos de Rodrigo Janot. A expectativa é de que ao menos 30 políticos dos 170 listados pela Odebrecht como beneficiários de propinas oriundas de contratos com a Petrobras estejam no radar do procurador-geral.
O que conforta os investidores é a lentidão do STF para tomar decisões. A demora, acreditam os donos do dinheiro, dará uma importante margem de manobra ao governo de Michel Temer para levar adiante a promessa de aprovar, ainda no primeiro semestre do ano, as reformas da Previdência e trabalhista. Desde março de 2015, ou seja, há exatos dois anos, dos 47 políticos denunciados pela PGR ao Supremo, apenas quatro viraram réus: a senadora Gleisi Hoffmann, os deputados Aníbal Gomes e Nelson Meurer e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que perdeu o foro privilegiado e está preso em Curitiba.
“Nunca se torceu tanto, no mercado, para que o STF seja moroso em suas decisões. O governo vai balançar com a nova lista de Janot, mas a nossa crença é de que o presidente conseguirá manter sua força no Congresso”, diz um operador de um banco estrangeiro. Para ele, é essencial que Temer entregue as reformas rapidamente, especialmente a da Previdência, para que se tenha a certeza de que o ajuste das contas públicas será para valer. “Até agora, temos um conjunto de boas intenções. O limite de teto para os gastos é importante, mas só terá efeito se houver mudanças na Previdência”, acrescenta.
Blindagem
A despeito das enormes preocupações em relação ao governo, o mercado financeiro decidiu blindar Temer. Os analistas acreditam que somente uma administração transitória, sem votos, será capaz de aprovar no Congresso medidas tão impopulares quanto as reformas trabalhista e previdenciária. “Mesmo tendo pouco apoio da população, Temer tem muita força no Legislativo. E é isso o que importa. Tivemos presidentes superpopulares, mas que não conseguiram avançar com as reformas. Por isso, o mercado está dando um voto de confiança ao atual governo, independentemente dos rumos da Lava-Jato”, ressalta o mesmo operador.
Os investidores têm a exata noção de que Temer terá de entregar alguns de seus mais fiéis aliados, como o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, pego com tudo pela Lava-Jato, mas chegará de pé em 2018, quando, efetivamente, a economia dará sinais mais claros de retomada do crescimento. “Os próximos quatro meses serão decisivos para o governo. Se conseguir aprovar as reformas, terá todo o apoio dos agentes econômicos para levar o país adiante. Contudo, passado esse prazo sem vitórias no Congresso, será difícil acalmar os ânimos. A crise voltará com tudo”, enfatiza um executivo de um grande banco brasileiro. “Não vamos, porém, pensar no pior agora. É preciso manter sangue-frio”, emenda.
O mercado está tão fixado na aprovação das reformas que não consegue enxergar mais adiante do ponto de vista político. Dada à confusão geral que se tem no país, seria normal que já se especulasse sobre as eleições de 2018 e sobre qual política econômica vigorará após a posse do futuro presidente da República. Mas, como afirma a economista-chefe da CM Capital, Camila Abdelmalack, os tempos não são de normalidade. “Vivemos um quadro de muita incerteza, que requer o máximo de cautela, inclusive nas projeções para a economia. A variável política não é mensurável”, destaca.
Nas mãos do Congresso
Para Camila, uma coisa é certa: a economia andará muito devagar. Nem mesmo a aceleração dos cortes da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central será suficiente para reanimar a atividade para o nível desejado. Ela afirma que o mercado de trabalho está muito debilitado, minando uma das principais alavancas do crescimento: o consumo das famílias. As empresas, acrescenta a economista, não estão apenas demitindo. Estão fechando as portas. Isso significa dizer que, mesmo que a atividade reaja, haverá menos empregadores para absorver a massa de 13 milhões de desocupados.
Pelos cálculos da economista da CM Capital, o PIB subirá 0,5% neste ano e 1,5% em 2018. É muito pouco para um país que, apenas nos dois últimos anos, encolheu mais de 7%. A severa recessão fez com que o PIB voltasse aos níveis de 2012. “A queda dos juros é ótima, assim como a inflação convergindo para o centro da meta, de 4,5%. Mas não dá para acreditar que a economia crescerá rapidamente”, diz. Na avaliação dela, os nós só começarão a ser desatados de verdade quando o Congresso, altamente rejeitado pela população, aprovar as reformas. É o Legislativo, e não o governo, que dará o tom da recuperação da atividade daqui por diante.
Brasília, 09h30min