A adoração que o mercado financeiro sempre demonstrou em relação ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, começou a se transformar em decepção. Desde que ele perdeu a queda de braço em torno das metas fiscal deste ano e de 2016 e 2017, que foram reduzidas drasticamente, os analistas passaram a mapear os movimentos do chefe da equipe econômica para medir o real poder dele dentro do governo e no Congresso. A conclusão foi a de que Levy é bem menor do que todos imaginavam. Passados quase oito meses do segundo mandato de Dilma, ele fez muito pouco ante o esperado e, para desespero dos investidores, a economia piorou muito desde que ele se sentou na cadeira mais importante da Esplanada dos Ministérios.
Quando foi anunciado ministro, antes mesmo de o primeiro mandato de Dilma acabar, Levy foi alçado ao posto de super-homem, aquele que, em questão de tempo, conseguiria reverter todo o estrago promovido na economia nos anos anteriores. Presente todos os dias na mídia, incensado até por integrantes da oposição, ganhou status de celebridade. A força demonstrada por ele levava todos a concluírem que os tempos de dificuldades seriam curtos. Os ajustes demorariam, no máximo, seis meses. Logo, o Brasil estaria de novo na rota do crescimento. O que se viu, porém, foi um ministro sendo engolido pela realidade de um governo fraco, sem representatividade, e enfraquecido por disputas internas lideradas por líderes do PT, o partido de Dilma.
A força demonstrada por Levy era tamanha que a mesma Standard & Poor’s (S&P), que, agora, ameaça retirar do Brasil o selo de bom pagador, resolveu, no início do ano, dar um voto de confiança ao país. Representantes da agência de classificação de risco disseram, à época, que o esforço demonstrado pelo ministro para fazer o ajuste fiscal e retomar o crescimento econômico era louvável. Mas a demora para apresentar resultados fez a ficha cair. Levy não conseguiu imprimir seu ritmo no governo nem obteve o apoio necessário do Congresso para levar adiante propostas que poderiam dar uma cara menos ruim às contas públicas.
“Foi uma decepção atrás da outra”, admite Renato Nobile, presidente do Bullmark Financial Group. Ele ressalta que hoje, na ótica dos investidores, Levy não é mais visto como um homem de mercado, que daria rumo à economia, nem como um integrante poderoso do governo. Também não é um homem do PMDB nem do PT, os dois principais partidos da base aliada. “Ele não demostra nenhuma força política. E, pior, o que se vê é a presidente Dilma dando cada vez mais as cartas na economia. A redução das metas de superavit primário foi decisão dela, e não contou com o aval do ministro da Fazenda”, acrescenta.
Na avaliação da S&P, se Levy sair hoje da Fazenda não será nenhum trauma. O importante para quem está no cargo é entregar o que prometeu, seja quem for. É isso o que importa para a agência de classificação de risco, que o Brasil faça superavits primários consistentes para evitar que o endividamento do país dispare. A perspectiva é de que, com as metas fiscais definidas pelo governo — 0,15% do PIB neste ano; 0,7% em 2016; 1,3% em 2017; e 2% em 2018 — a dívida bruta saltará de 62% para 70% do PIB, ou seja, em vez de melhorar, os indicadores fiscais do país vão piorar, e muito.
Banco de reserva
Levy não foi a primeira opção de Dilma para a Fazenda. Foi a que sobrou depois de ela sondar nomes do primeiro time do mercado financeiro, como o do presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco. O ministro nem era um nome muito conhecido, apesar da competência reconhecida pelo que fez nos cargos que havia ocupado em vários governos. Mas, como os investidores precisavam se apegar a alguma coisa, ao ser o escolhido pela presidente para suceder Guido Mantega, acabou se tornando o fiador da política econômica do segundo mandato da petista.
Apesar da decepção, não há torcida para a saída de Levy do governo. Ruim com ele, pior sem ele. A sensação, no entanto, é a de que o ministro não conseguirá entregar tudo o que prometeu. E o prêmio que receberá será o rebaixamento do Brasil ao grupo de países especulativos. Certamente, não passava pela cabeça dele dar um passo tão grande para trás.
Não precisa ser nenhum expert em economia para saber o que ocorrerá se o país perder o selo de bom pagador. A recessão, que já está pesada, se aprofundará, o desemprego disparará e a inflação não dará trégua. Que triste legado, Levy!
Bolha do crédito
» Economista-chefe para mercados emergentes da consultoria britânica Capital Economics, Neil Shearing prevê que a economia brasileira poderá enfrentar uma nova crise, desta vez com a “a desaceleração da bolha de crédito, que está apenas começando”. Para ele, haverá estresse no sistema financeiro, com operações de liquidação duvidosa podendo aumentar drasticamente.
Tombo real
» Na avaliação de Shearing, “o ar da bolha de crédito está esvaziando” e ajudando a derrubar o crescimento do Brasil. O ritmo de avanço dos empréstimos e financiamentos caiu de um pico de 26,9% ao ano para apenas 7,6% em maio último. Como a inflação está acima de 9%, em termos reais, o crédito encolheu.
Colapso nos financiamentos
» Shearing ressalta que os financiamentos para a compra de carros entraram em colapso, o que explica o péssimo momento do setor automotivo. A grande surpresa, diz ele, é que, mesmo com o enfraquecimento do crédito imobiliário, o setor ainda não sofreu queda semelhante. “Considerando que os orçamentos familiares estão sobrecarregados, suspeitamos que isso é apenas uma questão de tempo”, avisa.
Brasília, 08h10min