A DOR DOS JUROS

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O Banco Central não esconde o incômodo com a forte alta da taxa básica de juros (Selic), que, desde seu piso, em abril de 2013, passou de 7,25% para 13,75% ao ano. Não por acaso, mesmo com todo o discurso linha-dura de que fará o que for necessário para levar a inflação ao centro da meta, de 4,5%, até dezembro de 2016, a instituição vem buscando argumentos para justificar o fim do ciclo de arrocho monetário o mais rapidamente possível.

Ontem, técnicos do BC trataram de difundir números para os quais o mercado pouco se atentou. Pela primeira vez, as instituições que mais acertam as projeções de inflação, os Top Five, passaram a prever 4,5% de carestia em 2017. Já vinham estimando esse mesmo índice para 2018 e 2019. Outra boa notícia: reduziram a expectativa para o ano que vem, a 5,21%. Essa previsão ainda está longe do que a autoridade monetária quer. Mas, no conjunto, mostra que os agentes econômicos estão consolidando a visão de que o custo de vida cairá com força nos próximos anos.

Na média geral, também as projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) estão ancoradas em 4,5% tanto em 2018 e 2019. O BC acredita que, nas próximas semanas, o mesmo acontecerá com as expectativas de 2017. Em relação ao próximo ano, os técnicos da instituição admitem a resistência dos analistas, que mantêm as previsões em 5,5%, diante da piora da carestia nas últimas semanas. Mas acabarão cedendo.

Para Ivo Chermont, economista-chefe da Itaim Asset, está ficando mais claro que o Comitê de Política Monetária (Copom) não avançará tanto o sinal como muitos vinham imaginando, ou seja, em levar a Selic para 15% ou 16% ao ano. “Estava mais pessimista em relação aos juros. Mas tudo indica que a Selic deve ir até 14,25% ou 14,50% ao ano”, diz. Em compensação, chegado o fim do arrocho, a taxa ficará inalterada por um período mais longo, até que se tenha a certeza de que a inflação realmente voltou a girar em torno do centro da meta e não no teto, de 6,5%, ou acima dele.

Na avaliação de João Pedro Ribeiro, da Nomura Securities, a tendência dos juros ficará mais clara a partir de amanhã, quando o BC divulgará o Relatório Trimestral de Inflação. Pelas contas dele, diante dos atuais números do IPCA, a autoridade monetária tende a manter a projeção de 4,9% para o custo de vida em 2016. Uma estimativa mais próxima ao centro da meta só deverá ser explicitada no documento a ser liberado em setembro.

Ribeiro ressalta que está mais otimista que a média do mercado em relação aos rumos da Selic. Tanto que, no seu cenário principal, a taxa básica terá apenas mais uma alta, de 0,25 ponto percentual, em julho, para 14% ao ano, com o BC encerrando o ciclo de aperto. Na pior das hipóteses, admite o economista, o Copom pode dar mais 0,25 ponto no mês que vem e 0,25 em setembro, totalizando 14,25%; ou 0,50 ponto em julho e 0,25 na reunião seguinte, chegando a 14,50%. “Estamos esperando o Relatório de Inflação para revisar nossas estimativas”, admite.

Dilemas

Assim como o mercado está dividido, o debate dentro do Banco Central é enorme. Há a consciência de que a economia está afundando rápido demais, com a queda do Produto Interno Bruto (PIB) podendo chegar a 2% neste ano. O problema é que também a carestia não dá trégua. A cada mês, se mostra pior. O dólar, pelo menos, está contribuindo favoravelmente, mantendo-se abaixo dos R$ 3,15 observados em março, quando foi divulgado o primeiro Relatório de Inflação deste ano.

“O que vemos é uma radicalização da inflação e da queda do PIB”, resume Ivo Chermont, ao descrever o dilema do BC. Para ele, o sofrimento da autoridade monetária será intenso, uma vez que a reunião do Copom de julho está longe e a de setembro, muito distante. Nesse meio tempo, vão aparecer números bastante ruins da atividade. Já se terá a clareza de que o segundo trimestre do ano foi perdido, com retração entre 1,5% e 2%, e que o terceiro trimestre também será negativo, sem perspectiva de recuperação à frente.

Esse tombo na atividade, por sinal, levará o BC a rever as projeções para o PIB deste ano. Em março, a instituição apontava queda de 0,5% do PIB neste ano, número que, no entender de João Pedro Ribeiro, tornou-se otimista demais. É possível que, por conservadorismo, a autoridade monetária não jogue a toalha de vez, e acabe indicando contração econômica entre 1% e 1,2%, o que já será um baque e tanto para a imagem do governo.

Técnicos do BC ressaltam, porém, que o menos importante neste momento é a preocupação com o que o Palácio do Planalto vai pensar. Dizem que o que se está colhendo na economia foi o que o governo plantou nos últimos quatro anos. Sendo assim, em vez de se irritar com os números mostrados pela autoridade monetária, o Executivo deve se empenhar para arrumar a casa o mais rapidamente possível. É esse empenho que vai ditar quando a atividade sairá do atoleiro em que se encontra.

O ajuste fiscal tocado pela Fazenda, reconhecem os técnicos do BC, é muito bem-vindo. Mas os resultados desse ajuste sobre a inflação só aparecerão em 2016, pois o estrago nas contas públicas foi enorme. Ninguém no entorno de Alexandre Tombini espera, porém, o cumprimento da meta de 1,1% do PIB de superavit primário prometida pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. O saldo final tende a ficar mais próximo de 0,7%, o que já será um ganho e tanto perto das frustrações que o BC teve de engolir no primeiro mandato de Dilma Rousseff.

Brasília, 11h35min

Vicente Nunes